Cúpula dos Povos vaza documento da ONU e inaugura o “Rio+Leaks”

Rio de Janeiro – Chegou a hora do Wikileaks ambiental? Em reação à decisão da ONU de não divulgar publicamente a mais recente versão do documento-guia para a Rio+20, também […]

Rio de Janeiro – Chegou a hora do Wikileaks ambiental? Em reação à decisão da ONU de não divulgar publicamente a mais recente versão do documento-guia para a Rio+20, também conhecido como “Rascunho Zero”, a coordenação da Cúpula dos Povos decidiu revelar todo o seu conteúdo no site do evento (www.cupuladospovos.org.br).

A iniciativa de vazar o documento, segundo as organizações que coordenam o encontro da sociedade civil que deverá reunir 30 mil pessoas no Rio de Janeiro entre 15 e 23 de junho, “é de interesse público e ajuda a entender os jogos de poder e os interesses que circulam nos debates a portas fechada na sede da ONU”.

Com 80 páginas, a terceira versão do Rascunho Zero, que agora ganhou o título “O Futuro que Queremos”, foi elaborada no início de maio, durante a última rodada de negociações realizada em Nova York. Por decisão da ONU, o documento foi distribuído apenas aos negociadores oficiais do processo Rio+20 (Estados-Membros, Majors Groups e organizações intergovernamentais).

Desde sexta-feira (25), no entanto, a mais recente versão do documento-guia da Rio+20 se tornou pública, por iniciativa da Cúpula dos Povos. Segundo nota publicada no site da Cúpula, “esta divulgação de um documento mantido fora do alcance do público pela ONU é apenas a primeira da série que chamamos de Rio+Leaks”.

Dirigente do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e representante da Cúpula dos Povos nas negociações da ONU, a antropóloga Iara Pietricovsky reconhece que, desta vez, os negociadores chegaram “a uma linguagem mais amena do que nas outras versões do Rascunho Zero”, mas não poupa críticas ao documento.

Entre os pontos criticados pelos ambientalistas estão a excessiva concentração de propostas sobre o pilar ambiental (deixando de lado os pilares econômico e social), a falta de compromissos obrigatórios nas chamadas Metas de Desenvolvimento Sustentável e a adoção de consensos vagos.

As Metas de Desenvolvimento Sustentável (SDGs, na sigla em inglês) são a grande novidade do Rascunho Zero e surgem para serem agregadas às Metas do Milênio já estabelecidas pela ONU. Segundo Iara, no entanto, “nenhum SDG é mandatório, há apenas propostas, sugestões e ideias que ficarão a cargo dos países implementar ou não”.

Outra novidade na nova versão do Rascunho Zero é o surgimento de referências a direitos humanos, tema cuja ausência nas primeiras versões foi muito criticada pelos ambientalistas: “A forte menção às mulheres e ao direito à água são vitórias desses grupos sociais nas negociações dentro da ONU. Ainda assim, no caso da água, o texto abre espaço para o setor privado”, diz a ambientalista.

Pilar único

A Cúpula dos Povos também critica o fato de a ONU ter negligenciado até o momento dois dos três pilares que ela mesmo havia definido para as discussões na Rio+20: “A ausência de capítulos referentes aos pilares social e econômico no Rascunho Zero acentua o meio ambiente e ameniza a importância das outras dimensões. Assim, o escopo da Rio+20 fica reduzido, e também a necessária ligação entre os três pilares”, avalia Iara Pietricovsky.

Os consensos até aqui obtidos nas negociações e expressos no documento-guia, segundo Iara, são vagos e trazem desânimo aos que esperam que resoluções concretas e obrigatórias surjam na Rio+20: “Os pontos de consenso sempre são expressos por palavras como ‘reafirmamos’, ‘reconhecemos’, ‘convidamos’, ‘sublinhamos’, ‘enfatizamos’, etc. Qualquer ator das negociações que ler esses pontos vai concordar com eles, pois ninguém se sente ameaçado”, diz.

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