Memória

Após 30 anos do caso Rhodia, áreas seguem contaminadas na Baixada Santista

Fechada há 30 anos, a fábrica de agrotóxicos da Rhodia espalhou resíduos tóxicos em extensas áreas da Baixada. Como solução, propôs medidas inadequadas, como a incineração das toneladas de contaminantes, inclusive em outros estados, como a Bahia

Reprodução/ACPO
Reprodução/ACPO
Trabalhadores da antiga Rhodia: Enfrentamento levou ao fechamento da fábrica que poluiu e matou

São Paulo – Em junho de 1993, a interdição de uma fábrica obsoleta de agrotóxicos da Rhodia em Cubatão, na Baixada Santista, simbolizava a vitória de trabalhadores, ativistas e instituições contra o desrespeito ao meio ambiente, ao trabalhador e à vida humana. Passados 30 anos do chamado caso Rhodia, porém, áreas em diversos pontos de municípios da região continuam contaminadas. E nesses anos todos, como alternativa, foram apresentadas apenas medidas inadequadas, como a incineração das toneladas e toneladas de contaminantes. Inclusive em outros estados, como na Bahia.

Para chamar a atenção da sociedade e de autoridades para este que é um dos maiores desastres ambientais da história do país, pesquisadores, ativistas, sindicalistas e parlamentares se reuniram nesta semana na Assembleia Legislativa de São Paulo. Participaram também o promotor de justiça Geraldo Rangel de França Neto, do Ministério Público paulista, autor da ação civil pública que resultou no fechamento da fábrica de Cubatão. E ainda as médicas Lia Giraldo da Silva Augusto, pesquisadora aposentada pela Fiocruz; e Agnes Soares de Mesquita, autora de uma longa pesquisa sobre resíduos tóxicos industriais organoclorados em Samaritá.

Segundo o dossiê Caso Rhodia, na época a empresa de origem francesa não contestou a liminar, transparecendo assim que já tinha intenções de desativar a unidade. Mas ao contrário do que pretendia a companhia, foi impedida de demitir os trabalhadores até o fim das investigações. Em mais de 70 páginas, o documento conta a história da empresa no Brasil, da produção altamente poluente, do adoecimento e morte dos trabalhadores contaminados e de estudos realizados sobre as dimensões da contaminação. O autor é o pesquisador Jeffer Castelo Branco, do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Estensão em Saúde da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e presidente da Associação de Combate aos Poluentes (ACPO) – ele próprio um ex-trabalhador da Rhodia, que também esteve na audiência no legislativo paulista.

“Nenhum humano deve ter contato com essa coisa”

Segundo Jeffer, em um dos primeiros relatórios periciais elaborados pelo então funcionário da Agência Ambiental Paulista (Cetesb) sobre as áreas contaminadas, o geólogo José Antonio D’ Ambrósio constatou a extrema gravidade da situação: “De acordo com os procedimentos de como foram expostos os resíduos, o lugar não pode ser aproveitado para a agricultura, para a construção de moradias, indústrias, qualquer atividade”.

No dossiê, Jeffer destaca uma declaração do então gerente geral da Rhodia na Baixada Santista, Octacílio Miguel Teixeira Tavares, em entrevista à revista alemã Geo Magazine, em abril de 1992: “Nenhum ser humano deve ter contato com essa coisa, o lugar onde foi depositado é irrecuperável, lá ninguém deve cultivar nada, lá ninguém deve beber água”, admitiu, em época em que já havia estudos aprofundados sobre a contaminação provocada pela sua empresa na região.

Segundo Jeffer, de 1965 a 1995 os grupos franceses Progil e Rhône-Poulenc, aos quais a Rhodia era vinculada, promoveram a poluição química de organoclorados em toda a Baixada Santista, com a sequela brutal de doenças e mortes. Resíduos altamente tóxicos derivados da produção foram despejados em extensas áreas no município de Cubatão, São Vicente e Itanhaém.

Contaminação do solo, da água e do ar na Baixada Santista

Os resultados foram observados em pesquisa científica de Agnes de Mesquita. Ela constatou a contaminação do solo, da água e também do ar, potencializando os riscos de câncer devido à inalação de substâncias organocloradas presentes na atmosfera daquela região.

Em 1995, dois anos após a interdição da fábrica e do incinerador de resíduos do solo contaminado, foi celebrado um termo de ajustamento de conduta. A Rhodia ficou obrigada a implementar processo de remediação nas áreas contaminadas. Em 2000, porém, passou por processos de fusões e desmembramentos, até ser integrada ao grupo Solvay. Mais recentemente foi vendida a um grande grupo dos Estados Unidos, sem, no entanto, assumir integralmente seu passivo ambiental em Cubatão.


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