Após derrota judicial, Monsanto abre mão de direitos sobre soja transgênica mais usada no Brasil

Decisão da empresa é temporária e vem no momento em que crescem as contestações aos efeitos do herbicida Roundup e dos prometidos ganhos de produtividade da soja geneticamente modificada

A tecnologia Roundup Ready promete produtividade maior, mas agricultores duvidam de sua eficácia (Foto:Greenpeace)

São Paulo – A multinacional Monsanto oficializou hoje (17), após nova derrota judicial, a decisão de suspender temporariamente a cobrança de direitos de propriedade intelectual sobre a semente transgênica mais utilizada no Brasil. Por ora, a soja Roundup Ready ficará livre de royalties em todo o país.

O anúncio foi feito após decisão da Justiça de Mato Grosso que, a pedido dos produtores daquele estado, suspendeu a obrigatoriedade de repasse de direitos de patente à empresa sediada em Saint Louis, nos Estados Unidos, em um momento em que crescem as contestações, dentro e fora do Brasil, à tecnologia Roundup Ready. “Em respeito aos sojicultores de todo o Brasil e embora a liminar do TJ-MT se aplique somente ao Estado de Mato Grosso, a Monsanto voluntariamente suspendeu a cobrança pelo uso da primeira geração da soja RR em todo o país”, afirmou a empresa, em nota. “A Monsanto espera que o TJ-MT reverta a liminar nas próximas semanas, e então o processo retornará para a primeira instância.”

Na visão da Monsanto, os direitos de exclusividade sobre a semente de soja Roundup Ready vencem em 2014, mas os produtores conseguiram convencer o Judiciário de que esta propriedade caducou em 2010, o que forçará ainda a multinacional a repor as perdas sofridas pelos agricultores. 

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Em nota, a Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato), responsável pela ação, afirma que a decisão, tomada no último dia 8 e reiterada ontem pelo Tribunal de Justiça estadual, garante o direito de o produtor não pagar aquilo que não deve. “Reconhecemos que os investimentos em pesquisa, especialmente em biotecnologia, são fundamentais para a manutenção da competitividade da agricultura brasileira, em especial para a agricultura mato-grossense”, diz o comunicado, emitido hoje. “E exatamente por reconhecer e valorizar estes esforços das empresas públicas e privadas de pesquisa é que esclarecemos que somos favoráveis ao pagamento dos direitos de propriedade intelectual (royalties), dentro da legalidade. Defendemos a cobrança justa e o que estiver amparado na legislação brasileira de patentes.”

Contestações

Na teoria, a tecnologia Roundup Ready garante ao agricultor uma produtividade maior graças a uma perda menor provocada por ervas daninhas. A promessa da Monsanto é de que tudo aquilo que não seja alterado geneticamente para resistir ao Roundup, herbicida produzido por ela, morre, mas nos últimos anos vem aumentando o número de plantas que conseguem sobreviver ao produto. 

Em paralelo, agricultores duvidam do ganho de produtividade, indicando que algumas variedades tradicionais têm rendimento similar ou superior com um custo bastante inferior. O aumento nos royalties que têm de ser pagos à empresa e os altos preços dos agrotóxicos são ponto de contestação de especialistas e de agricultores, que apontam ainda que o uso massivo do Roundup tem criado riscos aos produtores e aos consumidores de organismos geneticamente modificados.

A Monsanto prepara-se também para o fim dos direitos de propriedade intelectual sobre o Roundup. Além disso, nos últimos anos outras empresas desenvolveram herbicidas à base de glifosato que passaram a servir como alternativa ao produto da corporação de Saint Louis. 

Sabe-se que as principais representantes da área de biotecnologia estão desenvolvendo agora produtos à base de 2,4-D, um composto químico mais forte que o glifosato e que era uma das substâncias que formavam o “agente laranja”, usado pelos Estados Unidos na Guerra do Vietnã.