Financiamento de campanha dá poder exagerado a construtoras

No meu último texto, discuti alguns aspectos do adensamento e da verticalização das metrópoles. Nele, afirmei que os prédios levantados hoje em São Paulo não são saudáveis para os destinos […]

No meu último texto, discuti alguns aspectos do adensamento e da verticalização das metrópoles. Nele, afirmei que os prédios levantados hoje em São Paulo não são saudáveis para os destinos da metrópole. Essa opinião é compartilhada por muita gente, mas mesmo assim não há debate nem oposição às vontades das construtoras no meio político. Por que isso acontece?

Em primeiro lugar, porque existem políticos na nossa cidade que vieram do meio das construtoras. O próprio prefeito Gilberto Kassab é um deles. Ele fez parte do Sindicato da Habitação (Secovi) e do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci). Parece evidente que um político oriundo do mundo da construção seja, digamos assim, mais sensível às demandas desse setor.

Outra questão é a dependência do orçamento municipal das receitas do IPTU. Essa é a maior fonte de dinheiro para o município, ou seja, quanto mais imóveis, de preferência com IPTU alto, forem construídos, mais dinheiro entra nos cofres públicos. Essa não é uma questão de corrupção ou má-fé nem depende da vontade dos partidos. Qualquer projeto na cidade precisa de dinheiro. Fundos estaduais e federais demandam trabalho e tempo para serem acessados, enquanto o IPTU pinga diretamente na conta da Prefeitura todos os anos. E as necessidades urgem.

Mas a razão mais nefasta para o aparente salvo-conduto que as construtoras têm em São Paulo é o financiamento de campanha. Poucos vereadores e nenhum prefeito conseguem se eleger na cidade – provavelmente em nenhuma grande cidade – sem o apoio financeiro dessas empresas. Os valores doados são brutais. Kassab recebeu de empreiteiras mais de R$7 milhões para sua campanha à prefeitura de 2008. Vereadores de todos os matizes ideológicos também foram agraciados com polpudas contribuições às suas campanhas (o apoio é mais generoso aos partidos ditos de direita, mas nenhum fica imune). Tudo isso acaba sendo noticiado vez ou outra, mas é difícil dar um sentido geral a esse fenômeno. Fica a sensação de que todos os políticos são iguais, já que todos se venderiam aos interesses imobiliários. 

A questão aqui é que, como não dá para escapar do fato de que é preciso dinheiro para realizar uma campanha e que os maiores doadores são as construtoras, tudo fica mesmo nivelado por baixo. É preciso dar um passo para trás e deixar o discurso moralista de lado. É claro que há alguns vereadores que conseguem ser eleitos sem esse dinheiro, mas são casos isolados. O formato de financiamento de campanha no Brasil é praticamente um pedido para haver corrupção. As empresas doam em troca de benesses por parte dos eleitos. Não é doação, é investimento. E é um investimento que usa dinheiro público como contrapartida, já que as construtoras são “pagas” com obras financiadas com nossos impostos.

Estou entrando aqui numa seara que não tem diretamente a ver com planejamento urbano, mas talvez molde mais as nossas cidades do que qualquer Plano Diretor. Não há maneira de pensar que o modelo de cidade excludente que temos hoje vá ser mudado sem que o financiamento de campanhas políticas seja discutido. Tendo a achar que o financiamento público é a única saída, embora haja muita resistência popular à ideia. O debate é necessário, no entanto. Algo tem que mudar nas eleições brasileiras.

Abaixo, alguns links sobre o assunto

Para urbanista, doação de empreiteiras em campanhas eleitorais comprometem o planejamento da cidade

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Os sofismas do jornalismo brasileiro contra o financiamento público de campanha

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