Imposto sindical

Enquanto sindicatos tentam acabar com taxa, projeto eleva em até 1.140% cobrança patronal

Deputado Laércio Oliveira (PR-SE), dirigente do setor de comércio, justifica que o valor está congelado há anos. Trabalhadores defendem fim da cobrança e afirmam que imposto cria acomodação

O deputado Laércio Oliveira, quando acompanhou comitiva de empresários brasileiros pela Italia, no ano passado

São Paulo – Quando o tema é imposto (ou contribuição) sindical, o noticiário usualmente menciona aquele desconto anual sofrido por todo trabalhador com carteira assinada, seja sindicalizado ou não, equivalente a um dia de trabalho no holerite de março. E pouco ou nada se noticia sobre o fato de a taxa não ser cobrada somente dos empregados. Mas o imposto sindical abastece também entidades patronais – nesse caso, é calculado com base no capital social das empresas.

Enquanto alguns sindicatos e centrais que representam os trabalhadores pregam o fim da taxação, pois justificam que o imposto causa acomodação e baixa representatividade sindical, está em tramitação na Câmara um projeto de lei que visa a elevar a contribuição sindical patronal em até 1.140%.

O PL 1.491, de 2011, é de autoria do deputado Laércio Oliveira (PR-SE), vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), que representa o setor empresarial. Ele, que não atendeu a reportagem da RBA, se justifica sustentando que o valor cobrado do setor patronal está congelado há muitos anos. O PL prevê alterações na CLT a fim de estabelecer um indexador inflacionário para obter reajustes anuais.

“É um fato que os valores de contribuição das empresas estão congelados desde que se extinguiu a Ufir, em 1994, e por isso há uma defasagem. Do ponto de vista do Ministério do Trabalho há uma compreensão de que deveria ter um mecanismo para atualização desse valor”, afirma o secretário de Relações de Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Manoel Messias Melo.

A contribuição paga pelo setor patronal tem uma alíquota que varia de 0,02% a 0,8%. Pela lei atual, o valor pago deve ser no mínimo R$ 11,40 e no máximo R$ 5.367,94. Com a aprovação do projeto, o piso aumentaria para R$ 141,53, e o teto, para R$ 66.615,34, além de estender o pagamento do imposto sindical às micro e pequenas empresas, que hoje ficam isentas ao aderir ao Simples, programa que reduz tributos para os pequenos empreendedores.

De acordo com o relatório de prestação de contas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), os valores arrecadados com o imposto, de trabalhadores e empresários, totalizou R$ 2,83 bilhões em 2012, o que representa aumento de 14,7% em relação ao exercício anterior.

Somente a arrecadação patronal somou R$ 908 milhões – 11% a mais do que o valor pago em 2011 –, sendo R$ 710 milhões da área urbana. Desse montante, 60% foi destinado para os sindicatos que representam os empresários, 15% para as federações, 5% para as confederações patronais e 20% para o Ministério do Trabalho e Emprego.

No setor rural, a arrecadação para a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) foi de R$ 198 milhões, enquanto a contribuição dos trabalhadores no setor somou R$ 61,5 milhões.

O investimento e a aplicação dos recursos repassados às entidades não tem destino conhecido. Atualmente, segundo informações do ministério, os números das organizações sindicais de empregadores, urbanas e rurais, com registro ativo são: 4.864 sindicatos, 154 federações e dez confederações. Somente as três maiores confederações empresariais, da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), da Indústria (CNI) e do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), somam 4.543 sindicatos patronais, que recebem o tributo para defender os interesses dos empresários.

Em meio a tantas cifras a representatividade que essas entidades têm junto à sua categoria, seja ela de trabalhador ou empresário, é colocada em dúvida.

Segundo o MTE, a concessão de registros depende de procedimentos como a divulgação com 20 dias de antecedência, no Diário Oficial da União e em algum jornal de grande circulação, a comprovação de que não existe nenhum sindicato igual no mesmo município e que os solicitantes pertençam à mesma categoria que desejam representar. “O ministério não decide mais, desde 1988, se pode ou não criar algum sindicato, apenas concede o registro, se o solicitante atender às exigências formais legais”, afirma o secretário Manoel Messias Melo.

Todos os sindicatos registrados no ministério recebem uma fatia do bolo. O MTE destina o valor para a Conta Especial Emprego Salário, gerenciada pela Secretaria de Política Pública de Emprego, que coordena o Conselho Deliberativo do FAT (Codefat). Os recursos do FAT são aplicados no seguro-desemprego, abono social, qualificação profissional, programas de incentivo, entre outros.

Messias Melo afirma que levará o assunto para discussão na reunião do Conselho de Relações de Trabalho. “O reajuste é uma discussão que se iniciou há alguns anos no ministério e que retomamos esse ano para verificar se haverá ou não atualização. Vou pautar esse tema para saber se há interesse em fazer esse debate de forma tripartite, com o governo, empresas e sindicatos.”

Defesa pelo fim da cobrança

Entre os trabalhadores, o imposto corresponde a um dia de trabalho, descontado anualmente em março. As centrais CUT, CSP Conlutas e Intersindical defendem o fim da cobrança, pois justificam que da forma como é feito no Brasil, o imposto é responsável por uma baixa associação de trabalhadores, já que cria uma receita que permite a sobrevivência de um sindicato sem associados e nenhuma representatividade.

Do valor total arrecadado com o imposto sindical dos trabalhadores 60% é destinado aos sindicatos, 15% às federações e 5% às confederações. Os demais 20% iam para o Ministério do Trabalho – mas a lei que reconheceu as centrais, em 2008, passou a destinar metade desse percentual a essas entidades.

Em 1989, o Sindicato dos Eletricitários de Campinas (Stieec/Sinergia) passou a devolvera parte que recebia da arrecadação aos seus associados. Foi o pioneiro a se manifestar contra a contribuição compulsória. Durante 16 anos, de 1992 a 2007, os eletricitários ficaram livres da cobrança garantidos por liminares conquistada na justiça, mas em 2008, com a liminar negada, o sindicato voltou a receber a arrecadação e devolver aos sindicalizados. No ano passado, a situação foi revertida na Justiça novamente, e atualmente os eletricitários não sofrem o desconto.

A situação é semelhante para bancários de São Paulo, Osasco e região e para metalúrgicos do ABC. De 1997 a 2001, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC tinha a seu favor uma liminar que impedia o desconto da taxa. Com a decisão revista pela Justiça, as empresas passaram a descontar a contribuição sindical, e o sindicato então devolve aos trabalhadores o valor cobrado.

No casos dos bancários, o recolhimento da cobrança foi impedido durante dez anos graças a um decisão judicial obtido pelo sindicato. A medida foi cassada pela Justiça em 2005, e desde então a entidade também devolve aos trabalhadores a parte que lhe cabe. No caso dos bancários, a receita vem, basicamente, das mensalidades voluntárias e da gráfica.

“Entendemos que sindicato deve ser um instrumento de mudança na sociedade, de organização dos trabalhadores, e isso só é possível se o trabalhador se associar e construir a luta conjunta. Defendemos número grande de associados com poder para representação, poder de negociação, não defendemos sindicatos financiados pelo Estado”, afirma o presidente da CUT, Vagner Freitas.

  • Bola dividida – CUT retoma debate sobre o fim do imposto sindical e é questionada pelas outras centrais

A reforma sindical e a substituição gradual do imposto sindical pela chamada taxa negocial foi discutida no Fórum Nacional do Trabalho (FNT), criado no início do governo Lula, coordenado pela Secretaria de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, com a participação de trabalhadores, empresários e representantes do governo.

No fórum, o tema resultou em uma proposta de Emenda à Constituição, a PEC 369, de 2005, que tratava de temas como o fim da unicidade sindical e a substituição do imposto sindical pela contribuição negocial. A tramitação parou em 2008, foi retomada em 2011 – atualmente, a PEC está na Coordenação de Comissões Permanentes (CCP). “Lamentavelmente a proposta nunca andou, exatamente pela oposição, tanto das confederações patronais como das confederações não democráticas de trabalhadores”, afirma o deputado federal Ricardo Berzoini (PT-SP), ministro do Trabalho entre 2004 e 2005.

Segundo Berzoini, o imposto pode ser substituído por uma contribuição voluntária, com um valor limitado, que não onere trabalhadores e empregadores (no caso doa imposto patronal), aprovado em assembleia de ampla divulgação, a fim de garantir um quórum mínimo para um debate democrático da proposta. “Entendemos que esse é o caminho, mas no momento caminhamos para um período pré-eleitoral e dificilmente haverá um debate mais profundo sobre isso. Você tem estruturas poderosas que vivem do imposto sindical, não existe correlação de forças para aprovar o fim da cobrança no Congresso Nacional e a dificuldade para colocar um fim na cobrança é porque tem muita gente que vive disso.”

Segundo Freitas, a CUT propõe a retomada do Fórum Nacional do Trabalho, para discutir regras que mudem a estrutura sindical. “Mas achamos que tem de ser por consenso, não adianta impor a nossa vontade aos demais sindicatos. Defendemos a ratificação da Convenção 87 da OIT, que fala da liberdade e autonomia sindical. Defendemos que trabalhadores criem seus sindicatos e construam sua representação.”

As confederações nacionais da Industria e do Comércio e as federações da Indústria de São Paulo e Rio de Janeiro foram procuradas pela reportagem, mas não responderam. O PL 1491/2011 está em tramitação na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara.

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