1º de maio

Força omite terceirização e Cunha diz que retirada de direitos não passará pelo Congresso

Nenhuma referência ao PL 4.330 foi feita em discursos no ato da central. Na presença de políticos e outras lideranças, líder metalúrgico preferiu homenagear Ayrton Senna

Marcia Minillo/RBA

Cunha foi aclamado por Paulinho da Força, mas ambos evitaram fazer qualquer referência ao PL 4.330

São Paulo – Em ato da Força Sindical, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), garantiu hoje (1º) a trabalhadores a defesa de seus direitos no Congresso. Sem fazer nenhuma menção ao projeto da terceirização (PL 4.330), que conseguiu aprovar a toque de caixa, garantiu: “Nada que for caracterizado como retirar direitos vai passar pelo Congresso Nacional”. A resistência à terceirização da atividade-fim, conforme previsto no projeto, é a bandeira de luta de todas as outras centrais e diversos movimentos sociais.

O silêncio sobre o projeto que tramita no Senado, e pode resultar na precarização da mão de obra no país, foi seguido por todos os outros políticos que subiram ao palanque da Força. Porém, o ataque às medidas provisórias 664 e 665, de ajuste fiscal, foram mencionadas em quase todos os discursos, entre eles o candidato derrotado do PSDB à presidência da República, Aécio Neves.

O presidente da Câmara anunciou que vai apresentar, em parceria com o deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (SD-SP), presidente licenciado da Força, projeto prevendo correção do saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) com o mesmo índice da poupança (Taxa de Referência, TR), e não mais pelo índice fixo de 3% mais TR. “É um absurdo que o FGTS, a poupança do trabalhador, seja corrigido somente em 3%”, afirmou Cunha.

O deputado federal Arthur Maia (SD-BA), relator do PL 4.330 e que manteve no texto apresentado em 2004 pelo então deputado Sandro Mabel a prática em todas as atividades da empresa, também passou por cima desse tema e afirmou que vai se empenhar em impedir a aprovação do ajuste fiscal. “Para mim, é uma alegria estar aqui para dizer que semana que vem vamos defender o trabalhador e votar contra o ajuste fiscal”, afirmou.

Marcia Minillo/RBAAlexsandra, Lecivaldo e Samara
Alexsandra, com o marido e a filha: “Condição de terceirizados é injusta, Somos todos trabalhadores”

Trabalhadora no setor alimentício, Alexsandra Sales Silva, de 37 anos, desconhecia a aprovação do projeto. E também que a Força havia apoiado sua aprovação. “A gente vê o pessoal que trabalha na limpeza lá da empresa. A condição deles é muito pior. Temos mais benefícios e o plano de saúde deles é muito ruim. É uma injustiça porque somos todos trabalhadores”, afirmou ela, na companhia do marido e da filha, todos empolgados com os shows.

O bombeiro da Polícia Militar paulista Edinaldo dos Santos, 32 anos, e a metalúrgica Rose Mota, 31 anos, casados, avaliam que a terceirização só interessa aos empresários. “Isso é uma forma de burlar a lei. Não cumprem jornada, não pagam direito, tem mais acidente. E fica tudo por isso mesmo”, defendeu Santos.

Marcia Minillo/RBA Edinaldo e Rose
O bombeiro Edinaldo e a mulher, Rose Mota, metalúrgica: terceirização só interessa aos empresários

“Os prestadores de serviço não têm as mesmas condições. É pior em tudo. Cada três trabalhadores que eles tiram da empresa contratam seis terceirizados. Quem é que ganha com isso?”, questionou Rose. Conscientes de que a Força Sindical aprovou o projeto, eles acreditam que o objetivo da entidade é encampar as dezenas de sindicatos menores que devem surgir como efeito da medida.

Alheio à avaliação de sua própria base, Paulinho – que chegou a se reunir com lideranças sindicais ligadas à central para defender o PL 4.330 na semana anterior à aprovação – disse aos trabalhadores que o governo Dilma perdeu sua identidade. “Nós não vamos deixar mexer com os nossos direitos.”

O ato foi fortemente marcado pelas críticas ao governo de Dilma Rousseff. Segundo Paulinho, o desemprego no Brasil hoje “é um dos maiores da história”. Ele disse que a Força vai pressionar o Congresso contra as MPs do ajuste fiscal – que pretendem cortar os gastos do governo federal em até R$ 21 bilhões e modificar a concessão de seguro desemprego, pensão por morte e seguro-defeso dos pescadores. “A inflação voltou, a Petrobras está sendo dilapidada e o governo da risada da cara dos trabalhadores. Essas MPs cassam os direitos dos trabalhadores”, completou.

Paulinho não poupou o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT). Uma pequena confusão se formou no público, porque o local estava muito cheio e apertado. “Pedimos ao diabo do prefeito para fechar essa área cedo, mas o desgraçado só fechou meia-noite”, disse, enquanto pedia calma às pessoas.

Mantendo a tônica do discurso, destacou que a presidenta “não teve coragem de falar ao povo”, referindo-se à mensagem do 1º de Maio feita pelas redes sociais e não por cadeia de rádio e televisão. E pediu um ‘Fora, Dilma’ ao público, ao mesmo tempo que anunciava a passagem da palavra ao “nosso presidente Aécio Neves”.

Para o senador tucano, este é o “1º de maio da vergonha”. “A Dilma não teve coragem de olhar nos olhos dos trabalhadores e assumir que mentiu e que vai atacar os direitos trabalhistas”, disse, ressaltando que o PSDB vai votar contra o ajuste fiscal.

O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos, José Pereira, que anteriormente se posicionou contra o PL 4.330, fez um discurso curto, apenas pedindo reflexão aos trabalhadores. “E uma salva de palmas ao grande estadista que foi… Ayrton Senna”, ironizou.

Também sucinto, o ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, lembrou que o Dia do Trabalho é um dia de luta e que “o grande capital deve ser enfrentado nas ruas, no chão de fábrica, nos sindicatos e nas manifestações”.

Outras bandeiras defendidas pela Força este ano são a correção da tabela do Imposto de Renda proporcional à inflação – em fevereiro, Dilma corrigiu a tabela em 4,5% –, redução da jornada de trabalho para 40 horas, a manutenção da política de valorização do salário mínimo e o fim do fator previdenciário. Esses itens também são defendidos pelas outras centrais, que têm uma pauta unificada sob o nome de agenda da classe trabalhadora.

O povo não sabe

Marcia Minillo/RBAClaudionor
Metalúrgico aposentado, Claudionor sabia que a Força Sindical apoia a aprovação do PL da terceirização

O metalúrgico aposentado Claudionor Félix dos Santos, de 59 anos, se orgulha de ter sempre trabalhado com carteira assinada. Hoje, segue trabalhando como eletricista, também com carteira assinada. Ele disse que não sabia que a Força havia apoiado a aprovação do PL da terceirização. “Bom, vamos torcer para que melhore as condições dos terceirizados. A gente sabe que as condições não são iguais”, afirmou.

Somente o metalúrgico Valdeli Bahia dos Santos, de 25 anos, defendeu o projeto, entre os entrevistados. “Eu acredito que vai melhorar, né!? Disseram na TV que agora todo mundo vai ter os mesmos direitos, que todo trabalhador vai ser igual, então eu acho que é bom”, disse.

O tecelão Carlos Alberto Paiva, de 34 anos, estranhou que não tenha sido feita nenhuma referência ao Projeto 4.330 “se ele é tão bom”. “Todo terceirizado ganha menos. Eu não sabia que eles apoiaram. Podiam pelo menos ter a dignidade de assumir”, criticou.

Marcia Minillo/RBAagitadores de bandeiras
Alguns trabalhadores fizeram bico durante a atividade: agitar bandeiras das 6h30 às 14h por R$ 50

 

E não foi só a precarização dos trabalhadores da base que a Força Sindical ignorou. Dezenas de bandeiras estavam sendo agitadas desde cedo no local. Sobretudo durante os discursos das lideranças e autoridades.

A reportagem da RBA conversou com alguns dos trabalhadores responsáveis pelas bandeiras. “A gente tá aí desde as 6h30. Estamos indo receber agora (14h) e ver se podemos ir embora. Vamos ganhar R$ 50”, disse um trabalhador que pediu para não ser identificado. Ele veio de Sapopemba para realizar o serviço e não é ligado a nenhum sindicato.