Mouzar Benedito – A alegria de herdeiros

O legal do dinheiro é usá-lo para coisas que gostamos, mas tem gente obcecada apenas em acumular

Tenho visto gente que faz de tudo, passa vontade, para não gastar dinheiro. Jamais pratica este ditado nova-resendense: “Mais vale um gosto do que um caminhão de abóboras”. O sujeito desse tipo diz que é econômico, parcimonioso ou poupador. Mas o que dizem dele é que “não abre a mão nem pra dar bom-dia”, “parece que tem escorpião no bolso”, e outras coisas.

O cara até gostava de ler jornal, mas só lia o do dia anterior, dado por um vizinho, pra não precisar gastar

As palavras e expressões que associam a ele não são nada graciosas. A mais maneira é “seguro”. Quer dizer, o cara segura o dinheiro. O mais comum é se referirem a ele como munheca, pão-duro, ridico (derivado de ridículo), mão de vaca, miserável, sovina, avarento, avaro, ávido, cajueiro, cauira, chifre de cabra, resmelengo, mão-fechada, mão de leitão, sovelão, unhaca, tacanho, munheca de samambaia, mão de finado, canhengue, mesquinho, mãos-atadas, unha de fome, muquirana, gaveteiro, fominha, pica-fumo, mofino, morrinha, socancra, pelintra, casca, cascoso, cobiçoso, cobicento, onzeneiro, guardoso, come em vão, cúpido, agiota, usurário, agarrado, manicurto, tamanduá, tranca, forra-gaita, vinagre, zuraco e outras expressões regionais bem sonoras.

Conheci um cara rico que morava numa casa grande, com um quintal cheio de laranjeiras. Quando alguma criança pedia licença para apanhar algumas laranjas, ele respondia seco: “Dois cruzeiros a dúzia”. 

Um outro era pão-duro para algumas coisas e extremamente mão-aberta em outras. Brigava por “tostões” (os centavos de antigamente) e gastava à larga nos prostíbulos, era um mão-aberta com as mulheres. E lá ele pagava cerveja pra todo mundo. 

Quando vim para São Paulo, morei numa pensão barata e me espantei que lá havia um hóspede cheio da grana. Ele não tomava ônibus, só bonde, porque, numa época em que a passagem de ônibus era bem barata, a do bonde era mais barata ainda. A economia era mínima. E ele só atravessava a roleta – e pagava – na hora de descer. Tinha esperança de ter algum carro quebrado ou acidentado nos trilhos, porque quando isso acontecia abriam as portas do bonde e ele podia descer sem pagar.

Outro caso é de um homem que tinha uma fazenda numa cidade pequena que virou polo industrial, cresceu muito, e a fazenda se valorizou. Loteou e ganhou milhões, já velho e ainda solteiro. E só almoçava num restaurante popular da prefeitura, pagando R$ 1 por refeição. Gostava de ler jornal, mas só lia o do dia anterior, dado por um vizinho. Os sobrinhos devem estar se esbaldando com a grana que ele não gastou.

Uma mulher rica, do interior, conseguiu com um sobrinho médico uma cirurgia de graça para o marido num hospital de Campinas, com internação e tudo. Um dia chamaram o sobrinho e disseram que a tia devia ter algum problema: todos os dias o açucareiro que recebia cheio no café da manhã e da tarde voltava vazio. Consumindo açúcar daquele tanto… O sobrinho foi ver, e ela usava só um pouquinho do açúcar. O resto guardava num saco plástico para levar pra casa quando o marido tivesse alta. 

Mais precavido que ela só mesmo um sujeito que conheci numa pequena cidade do litoral paulista: até os mendigos o davam como pão-duro. Havia a tradição de semanalmente eles irem de casa em casa pedindo esmola, e os moradores já reservavam moedas para dar a eles, mas todos pulavam a casa do munheca. Um dia apareceu na cidade um pedinte, que sem saber da fama dele bateu em sua porta. Ele gritou lá de dentro:

– Quem é?

– É esmola.

Ele respondeu:

– Pode pôr debaixo da porta.