Fora de campo

Caso do zagueiro Breno, preso na Alemanha, mostra que nem sempre a mudança de ares é positiva para o atleta

Breno chega ao tribunal, em Munique

Breno Vinícius Rodrigues Borges completou 23 anos, em 13 de outubro, em uma cela na prisão Stadelheim, em Munique, na Alemanha. Eleito melhor zagueiro do campeonato brasileiro de 2007 e apontado como grande promessa, o jovem Breno foi vendido pelo São Paulo ao Bayer de Munique por € 12 milhões no final daquela temporada. O atleta, porém, nunca se firmou no principal clube alemão, sofreu contusões e, em um episódio nebuloso, em 19 de setembro de 2011, acabou preso após um incêndio em sua casa. Considerado culpado pelo acidente e condenado pela Justiça alemã a três anos e nove meses de prisão, cumpre a pena desde julho. Poderá sair dentro de dois anos a dois anos e meio, contados a partir de julho, por bom comportamento.

Capa rdb 19O dinheiro corre solto no mundo do futebol. Segundo o informe anual Global Transfer Market (Mercado Global de Transferências), da Federação Internacional das Associações de Futebol (Fifa), apenas em 2011 as transferências de profissionais movimentaram cerca de US$ 3 bilhões. Foram 11.500 transações, das quais 13% envolvendo brasileiros. Mas muito dinheiro não garante felicidade, como o próprio Breno constatou tempos atrás: “No Brasil, eu tinha menos dinheiro e menos luxo, mas era feliz. Aqui eu tenho dinheiro, mas me falta todo o resto”, declarou ao semanário alemão Bild am Sonntag. O jovem beque foi emprestado em 2010 ao Nuremberg, time de menor expressão na liga local.

Ele foi capa da edição 19 da Revista do Brasil, de dezembro de 2007, em uma reportagem sobre a saída precoce de boleiros brasileiros para o exterior

O coordenador técnico do São Paulo, Milton Cruz, que promoveu a ida de Breno para os profissionais, na época treinados por Muricy Ramalho, mostra surpresa com a situação do jogador. “Sempre foi um cara muito comportado, nunca deu problema. Uma pessoa bacana, tranquila”, diz.

Ele lembra que, no ano passado, foram feitos contatos para tentar trazê-lo de volta para o Brasil. Segundo o coordenador, Breno deixou o país com certa estrutura e estaria adaptado à vida no exterior. Mas os problemas profissionais podem ter minado seu comportamento. “Todo mundo pensa em sair, mas não é fácil. Jogadores experientes também enfrentam dificuldades.”

Atualmente no Santos, Muricy se mostra igualmente surpreso e diz que é preciso ter cautela com quem cuida da carreira dos atletas. “Às vezes eles saem sem uma base emocional e sem o lado intelectual formado, e sofrem no exterior”, disse à agência Gazeta Press. E ressalta que o tratamento na Europa é diferente, o que também pode ter influenciado Breno. “Lá, acabou o treino, o cara vai para casa. Não é como aqui, onde o jogador é tratado praticamente como um filho, com toda a atenção do mundo. Lá, eles pagam e querem que você jogue. É complicado.”

Cabeça ruim

O também treinador e ex-jogador José Sérgio Presti, o Zé Sérgio, trabalhou com Breno na categoria sub-17 do São Paulo. E compara: “Quando o atleta se machuca, já é difícil. Mas no Brasil continua a receber o salário integral. Lá, cortam o salário, ele não tem aquele apoio das pessoas, dos amigos, a cabeça começa a ficar ruim. Se não tiver uma estrutura, pira mesmo”.

Zé Sérgio, que atualmente comanda o sub-20 da Ponte Preta, de Campinas (SP), conta que não se surpreendeu totalmente com o episódio. “A gente percebia que Breno não era um menino alegre, brincalhão. Era muito fechado, até sério, pela idade dele. E foi muito novo para ter uma vida independente na Europa, ainda mais na Alemanha, onde não existe calor humano como no Brasil. Comigo nunca teve problema, era um menino bom, respeitava demais. É uma pena, eu gostava muito desse menino.”

Peritos examinam a casa alugada por Breno, incendiada em setembro de 2011 (Foto:Michaela Rehl/Reuters)

A mulher de Breno, Renata Borges, contou em setembro ao portal Globoesporte.com que no dia seguinte ao incidente o jogador faria mais uma – a quarta – cirurgia no joelho, e estava triste com isso. O fato de não jogar nem receber salário, apenas um seguro (o que acontece quando um atleta fica mais de 45 dias sem atuar na Alemanha), pode ter colaborado para que ele entrasse em depressão, como pessoas próximas afirmam. Segundo Renata, na véspera da operação Breno bebeu cerveja, vinho do Porto e uísque – uma mistura que o deixou “completamente alucinado”.

No processo da defesa, o advogado chegou a afirmar que Renata tinha um caso com um ex-empresário do jogador, informação que ela desmentiu. “Isso tudo é uma grande mentira. O Breno é uma pessoa maravilhosa. Nós sempre vivemos muito bem. O advogado inventou essa história porque achou que seria uma boa defesa. Para pôr a culpa em mim.” Ela disse contar com uma reavaliação do processo. “Que vejam o ser humano Breno. Queria que a Justiça percebesse que nós somos uma família linda e meu marido não é um criminoso.”

Na primeira visita na prisão, o filho do casal (ela tem dois de outro relacionamento), Pietro, de 3 anos, pedia para Breno ir embora junto com eles, porque ele já tinha trabalhado muito – os pais contaram que o jogador estava trabalhando ali. O menino que saiu de Cruzeiro, cidade do Vale do Paraíba, no interior paulista, deve demorar a voltar para casa.