Editorial

Um bom conselho

Leon Rodrigues / secom Bikers tomam conta da Avenida Paulista: revolução contra a cultura insustentável do carro Durante o seminário Cidades Rebeldes, no mês passado, o geógrafo britânico David Harvey […]

Leon Rodrigues / secom

Bikers tomam conta da Avenida Paulista: revolução contra a cultura insustentável do carro

Durante o seminário Cidades Rebeldes, no mês passado, o geógrafo britânico David Harvey sugeriu ao prefeito de São Paulo, Fernando Haddad: “Abra o maior número possível de espaços onde movimentos revolucionários possam acontecer”. É uma forma de permitir que espaços públicos sejam desprivatizados e destinados ao exercício da cidadania. Ao enfrentar a ditadura do automóvel, a política de expansão dos corredores exclusivos a quem quer usar a bicicleta como meio de transporte pode não ser exatamente uma revolução. Mas vinda da administração de uma das maiores e mais congestionadas cidades do mundo, a opção não é pouca coisa e cria uma referência de grandes proporções para a democratização do espaço público.

Não se trata de inventar a roda, já que várias cidades mundo afora pensam em mobilidade. Mais que a cultura egoísta, violenta e insustentável do carro, o objetivo de chegar ao fim do ano com 400 quilômetros de ciclovias enfrenta o mau humor de uma parcela pequena da cidade. Setores acostumados a se opor a um projeto não pelo seu mérito, mas pela cor da bandeira de quem toca a ideia. Foi vergonhosa a cobertura de alguns jornais tentando encontrar pelos em ovos enquanto uma multidão celebrava uma conquista que vai além de qualquer coloração partidária.

Essa conduta da picuinha associada a interesses mesquinhos é exemplo de deseducação política. E dificulta ao cidadão comum entender, por exemplo, o que move o político que quer abrir a exploração do pré-sal às companhias estrangeiras num momento em que se decide que parte significativa dos recursos de controle nacional se destinarão à saúde e à educação. Ou o deputado que se diz preocupado com os trabalhadores ao votar mudanças na Previdência – só para derrotar o governo –, mesmo tendo votado a favor da terceirização que assombra o futuro dos empregos. Ou os que desprezam escolas públicas e seus professores num dia, e no outro querem condenar ao castigo de um adulto uma criança que não teve nem sequer oportunidade de sonhar.

São as contradições de um sistema caduco, em que parte dos políticos e dos “formadores de opinião” atua para que a sociedade se desencante, em vez de se interessar pela política. Caberia, então, aos governos progressistas subordinar-se menos as essas coalizões repletas de forças ocultas, e abrir-se mais ao conselho de David Harvey.