PL da vergonha

Oposição consegue adiar aprovação de PL de Tarcísio que anistia multas de Bolsonaro de mais de R$ 1 milhão

Governistas tentaram aprovar, mas faltaram argumentos em defesa de PL que beneficia Bolsonaro, o filho Eduardo e outros bolsonaristas da Casa. Para associação de vítimas da covid e familiares dos 700 mil mortos, R$ 73 milhões das multas têm de ser destinados à saúde e à ciência

Allan Santos/PR
Allan Santos/PR
A oposição criticou o fato de Tarcísio querer derrubar multas do ex-chefe e impor penalidades a sindicatos que lutam pelos direitos da população

São Paulo – A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) adiou a análise do projeto de Tarcísio de Freitas (Republicanos) que pode anistiar multas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). As infrações, que ultrapassam o valor de R$ 1 milhão, referem-se ao descumprimento de lei sanitária durante a pandemia. No caso, não usar máscara em visitas o estado. Além do aliado de Tarcísio, deputados estaduais da base governista e até federais, como Eduardo Bolsonaro (PL-SP), também constam da lista de devedores. O filho 02 do ex-presidente tem débito de mais de R$ 135 mil na dívida ativa do estado. Ainda não há data para a retomada das discussões em plenário.

Nas duas sessões extraordinárias desta quarta-feira (4), com mais de cinco horas de duração, encerradas por volta das 22h, deputados da oposição expuseram as contradições da proposta do governador, que abre mão de mais de R$ 72 milhões ao perdoar essas dívidas de aliados. Montante que poderia ser aplicado em programas negligenciadas pelo governo bolsonarista em São Paulo. Exemplo é o programa de saúde da mulher, subfinanciado, conforme lembrou o deputado Guilherme Cortez (Psol).

Ecoando argumentos oposicionistas, o parlamentar lembrou que o governo pediu elevação das multas aos sindicatos que promoveram greve contra as privatizações nesta terça (3). “O governador multa os sindicatos que lutam pelo patrimônio público e melhora dos serviços à população, mas quer perdoar dívidas daqueles que atuaram contra a saúde e contribuíram para as mais de 700 mil mortes por covid”, disse.

Anistia a multas de Bolsonaro, autuações pesadas aos sindicatos

Já os deputados da base usaram o tempo para atacar a oposição e defender a aprovação do PL 1.245/2023. Sob pretexto de aprimorar as cobranças de créditos tributários inscritos na dívida ativa estadual, Tarcísio enviou a proposta em agosto ao Legislativo. E aproveitou para inserir o “jaboti” da anistia aos multados, uma vez que outros projetos nesse sentido empacaram na Casa.

O deputado Gil Diniz (PL) mostrou fotos antigas e descontextualizadas de diversos oposicionistas, como Mônica Seixas (Psol) e Paulo Fiorilo (PT), entre outros, que teriam causado “aglomerações”. No entanto, eram fotos de antes da chegada da pandemia, em 2019. Diniz reagiu a Fiorilo, que apresentou nomes de deputados da Casa inscritos na dívida ativa estadual por não ter pago suas multas, inclusive o bolsonarista.

No caso de Diniz, o débito referente à multa está no valor de R$ 807,17. No entanto, ele negou que seja devedor. E chegou a dizer que os dados da dívida ativa estão desatualizados, esquecendo que fazia críticas ao governo que apoia. Além disso, afirmou que foi multado não por desobedecer às leis vigentes, mas por “perseguição política” do então governador, João Doria, a quem fazia oposição na Assembleia.

O deputado bolsonarista Danilo Balas admitiu também ter sido multado. E a exemplo do colega, afirmou ter sido perseguido, assim como Jair Bolsonaro. E que em nome dos “comerciantes que tiveram seus estabelecimentos fechados na pandemia, com prejuízos”, votaria a favor do PL de Tarcísio.

Multas não teriam objetivo arrecadatório, diz governo Tarcísio

Conforme o artigo 36 do projeto, ficam canceladas as multas aplicadas por agentes públicos estaduais em razão do descumprimento de obrigaçõesimpostas para a prevenção e o enfrentamento da pandemia de covid. Segundo o Centro de Vigilância Sanitária, ao todo foram 10.790 autuações com base no código sanitário, das quais 2.600 na Capital, totalizando R$ 63.324.436,70. No interior foram 8.190 autuações, totalizando R$ 8.818.352, 70. O total aproximado é de R$ 72.142.789,40 em multas, montante ao qual se referiu Guilherme Cortez.

Para justificar o desprezo a esse montante, a gestão bolsonarista no Palácio dos Bandeirantes, a anistia às multas se baseia no fato de que a legislação sanitária, que previa as autuações em caso de descumprimento, foi tomada durante a gestão anterior em “caráter educativo e não arrecadatório”.

Em meio ao andamento do projeto, processos que cobram o ex-presidente voltaram a tramitar na Justiça paulista. O Tribunal cobrou do Palácio dos Bandeirantes manifestação sobre a oferta de penhora de um apartamento de Bolsonaro no Setor Sudoeste em Brasília. O imóvel comprado pelo ex-presidente no valor de R$ 75 mil, em maio de 2000, valeria no momento, segundo os advogados, R$ 1,2 milhão a R$ 2 milhões. O imóvel oferecido à Justiça, porém, tem sala com varanda, cozinha, área de serviço, quarto e banheiro de empregada e uma vaga de garagem.

Bolsonaro depositou pagamento em juízo e pode reaver recursos

A defesa de Jair Bolsonaro (PL) informou que o ex-presidente depositou em juízo nesta quarta-feira (16) R$ 913 mil para o pagamento de multas que recebeu por não usar máscaras no estado de São Paulo durante os períodos mais rígidos da pandemia de Covid-19

Em junho, a Justiça de SP autorizou bloqueio de mais de R$ 500 mil em razão dos débitos. São sete ocorrências da Secretaria da Saúde, registradas entre agosto de 2021 e junho de 2022. O maior valor é de R$ 425,8 mil e a menor é de R$ 774,62. Em meados de agosto, a defesa de Bolsonaro depositou em juízo R$ 913 mil para o pagamento dessas multas. Para a oposição, isso justifica a pressa de Tarcísio em aprovar seu projeto. Se for aprovado, as multas serão anistiadas e seu ex-chefe poderá resgatar o dinheiro.

Recursos das multas para assistência e pesquisa, pede associação

Na avaliação da Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas de Covid-19 (Avico), o projeto do governo Tarcísio é “algo revoltante”. À RBA, a representante da entidade em São Paulo, Rosângela Silva, disse que o total que o estado pode perder caso o PL seja aprovado pode ser até irrisório frente ao tamanho do problema deixado pela pandemia. Mas tem de ser mantido e destinado a programas às vitimas.

“Temos vitimas com sequelas físicas, neurológicas, que precisam de atendimento. (As multas) deveriam ser cobradas com a correção necessária e o dinheiro deveria ser revertido para o tratamento e atendimento”, defende. “A família de uma pessoa que tem sequelas também sofre. Os danos emocionais são irreparáveis, mas poderiam ser amenizados se tivéssemos o retorno financeiro, até mesmo para o SUS, para as universidades, para amplicar estudos de vacinas. Estamos falando de danos de pessoas que sobreviveram à doença mas que não vão conseguiur voltar para o mundo do trabalho”.

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