"governo" bolsonaro

Milton Ribeiro é a cara do governo de terraplanistas, negacionistas e não tão ‘malucos’ assim

Ministro diz que dinheiro da Educação foi para pastores amigos de Bolsonaro. “Mandante do crime precisa ser punido”, diz deputada

Reprodução/ Twitter
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No Twitter, ministro da Educação tenta agradar o chefe, Na gestão do ministério, também

São Paulo – Nos últimos dias tornou-se público que o ministro da Educação de Jair Bolsonaro, Milton Ribeiro, não ocupa o cargo apenas pelo perfil ideológico. Além das falas absurdas com que “analisa” questões importantes ligadas às obrigações da pasta, ele passou a ocupar as manchetes pelos interesses que revelou representar. O áudio obtido pelo jornal Folha de S.Paulo e publicado nesta segunda-feira (21) ratificou denúncia surgida ainda na sexta (18), via Estadão.

O chefe do MEC explica claramente que suas prioridades atendem ao interesse do presidente da República. “Minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam. E, depois, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, disse Ribeiro no áudio. E por que Gilmar? O próprio ministro responde:  “Porque foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim”. Terceiro ministro da Educação, Ribeiro veio depois de Ricardo Vélez e Abraham Weintraub, que não deixaram boas lembranças.

A agenda pública do ministro registra 20 reuniões com a participação dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, ambos ligados à Assembleia de Deus. Os pastores não são estranhos a Bolsonaro que, em 2019, saiu em foto ao lado de Gilmar e participou de evento com a presença de Arilton.

Depois de um dia tumultuado, Milton Ribeiro admitiu a conversa com os pastores, mas tentou deixar Bolsonaro fora do rolo. Disse que o presidente não pediu atendimento preferencial a ninguém, “solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem, inclusive as pessoas citadas na reportagem”.

Grupo de pastores controla agenda do MEC e destino de verbas públicas

A situação repercutiu fortemente nas redes sociais e já foi parar na Justiça. Ainda pela manhã, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) anunciou que pedirá ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de inquérito para apurar as denúncias de que as verbas do MEC são liberadas a partir de um “gabinete paralelo” formado por pastores, sob as vistas de Bolsonaro. Segundo o senador, “Milton Ribeiro converteu o MEC num balcão de negócios p/ suas traficâncias rasteiras, negociando favores públicos à luz do dia”. À tarde, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse que já protocolou notícia-crime contra o ministro por tráfico de influência e corrupção passiva.

“Para quem não entendeu este crime, vou explicar: dinheiro PÚBLICO da pasta da Educação foi para pastores amigos do Bolsonaro para construir igrejas e manter apoio a ele. Foi, segundo Milton Ribeiro, Bolsonaro que pediu isso”, resume a professora de Física Elika Takimoto no Twiter. Para o historiador e ex-deputado federal Chico Alencar, “Num país sério, Milton Ribeiro seria demitido e Bolsonaro, cassado”.

“Não demitiu nem desmentiu”

A deputada federal Natália Bonavides (PT-RN) argumenta que apenas a saída do ministro do comando da pasta não é suficiente. “O mandante do crime, o presidente Jair Bolsonaro, também precisa ser punido!”, diz a parlamentar. Para Ivan Valente (Psol-SP), “a cada minuto que Milton Ribeiro permanece no cargo Bolsonaro se complica. Não demitiu nem desmentiu o ministro que favorece pastores amigos ao seu pedido”, postou na mesma rede. Do partido presidido por Gilberto Kassab, o deputado Fábio Trad (PSD-MS) defendeu a “urgente” convocação de Ribeiro pela Câmara e escreveu que “favorecimento a interesses privados constitui crime de advocacia administrativa”.

Também no Twitter, Milton Ribeiro publicou uma “nota de esclarecimento” para justificar o injustificável. “Independente (sic) de minha formação religiosa, que é de conhecimento de todos, reafirmo meu compromisso com a laicidade do Estado, compromisso esse firmado por ocasião do meu discurso de posse à frente do Ministério da Educação”, afirmou. Segundo ele, “não há qualquer hipótese e nenhuma previsão orçamentária que possibilite a alocação de recursos para qualquer denominação religiosa”.

Terraplanistas, negacionistas, religiosos, “malucos”

Milton Ribeiro é mais um ministro de um governo formado por terraplanistas, negacionistas e religiosos fundamentalistas, muitas vezes considerados “malucos”, mas que sabem o que fazem e para quem governam. É o caso dos ex-ministros olavistas (seguidores do “filósofo” Olavo de Carvalho) Abraham Weintraub (Educação) e Ernesto Araújo (Itamaraty), autores de “teses” bizarras. Daqueles que, do tipo do pastor e “teólogo” Ribeiro, representam a ala religiosa, como Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos). Ou de outros como o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, para quem o governo deveria deixar a boiada da destruição passar enquanto o país conta os mortos da pandemia. Ou, ainda, como o presidente da Fundação Zumbi dos Palmares, Sergio Camargo, para quem o movimento contra o racismo e a desigualdade racial é uma “escória maldita“.

Pode-se mencionar até mesmo o “técnico” Marcelo Queiroga, ou Eduardo “um-manda-outro-obedece” Pazuello (ambos da Saúde), donos de frases e pensamentos lapidares sobre a pandemia e a covid-19, que já matou mais de 650 mil brasileiros.

“Malucos” ou não, todos participam do governo para agradar e ajudar a manter a base “núcleo duro” bolsonarista, de cerca de 20% do eleitorado – o que não é pouca coisa –, mas também para defender interesses de grupos, como mostra o áudio de Milton Ribeiro.

Como colaborador da coleção de absurdos ditos por colegas e ex-colegas do ministério bolsonarista, Ribeiro já afirmou que crianças com deficiência na escola “atrapalham”, pois são “de impossível convivência”, e acrescentou: “Não queremos inclusivismo”. O chefe do MEC também já afirmou que os gays vêm de “famílias desajustadas”, entre outros pensamentos.

Ouça a fala de Milton Ribeiro obtida pela Folha de S. Paulo: