Desmonte do estado

Manobra de Alckmin libera tramitação de PL que autoriza venda de fazendas experimentais

Desembargador, que voltou atrás de decisão anterior, passou a entender que audiências públicas podem ser feitas após – e não antes – de o projeto ser apreciado e votado pelos parlamentares

Divulgação/Secretaria da Agricultura SP

Alckmin, em evento agropecuário, recebe balanço social de agência estadual do setor, que deve ficar sem laboratórios de pesquisa

São Paulo – O desembargador Carlos Bueno, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), acatou recurso do governo paulista, e liberou a tramitação do Projeto de Lei 328/2016, que autoriza a venda de 79 imóveis do estado. São, em grande parte, fazendas vinculadas à Secretaria da Agricultura espalhadas pelo estado, onde funcionam laboratórios de pesquisa de tecnologia agropecuária destinada à agricultura familiar e pequenos produtores rurais, com foco na produção orgânica.

De autoria do governador Geraldo Alckmin (PSDB), o projeto tramita em regime de urgência, sem que tenha de ser apreciado pelas comissões. Até agora, não foi convocada nenhuma audiência pública para discutir com pesquisadores, trabalhadores, sindicatos e movimentos ligados à pequena produção agropecuária.

A justificativa do governador com o PL é enfrentar a crise financeira e fazer caixa para o orçamento do estado. O governo espera arrecadar R$ 1,4 bilhão – enquanto perdoa dívida de R$ 116 milhões da Alstom no contrato para instalação de sistema de controle de trens. O acordo deverá ser investigado pelo Ministério Público Estadual paulista. A Alstom é uma das empresas do cartel do metrô.

Cedendo a pressões do Executivo e da presidência da Assembleia Legislativa, o magistrado voltou atrás de sua própria determinação, de junho passado, quando sustou, de maneira liminar, o andamento do PL em atendimento ao mandado impetrado pelo deputado Carlos Neder (PT).

O parlamentar, que coordena a Frente Parlamentar em Defesa dos Institutos de Pesquisa e Fundações ligados ao Estado de São Paulo – entre os quais estão essas fazendas experimentais –, argumenta que a inclusão do projeto na ordem do dia, sem realização de audiência pública com a comunidade científica, fere os requisitos previstos no artigo 272 da Constituição Estadual de 1989.

A legislação determina queo patrimônio físico, cultural e científico dos museus, institutos e centros de pesquisa da administração direta, indireta e fundacional são inalienáveis e intransferíveis sem audiência da comunidade científica e aprovação prévia do Poder Legislativo.

Porém, o desembargador passou a entender que a Constituição do Estado “exige audiência pública com a comunidade científica para que se possa efetivar a alienação de institutos e centro de pesquisas”.  No entanto, segundo ele, “o momento em que se deve realizar a audiência não integra o andamento do projeto de lei que veicula autorização para a alienação. A atividade legislativa não estaria condicionada à realização da audiência, por ausência de previsão expressa no Capítulo II da CE/89, que trata do Poder Legislativo”.

A Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC), que conta com apoio da Frente Parlamentar, universidades e de sindicatos e associações de pequenos agricultores de diversas regiões, vai intensificar a mobilização e as pressões sobre os parlamentares. O PL está na ordem do dia e pode ser votado a qualquer momento.

“Diversos parceiros já se manifestaram contra o projeto e em defesa da manutenção das fazendas experimentais. A resistência é forte em vários municípios, como Ribeirão Preto e Itapeva, porque os produtores rurais se beneficiam diretamente da tecnologia que produzimos”, afirma o presidente da APqC, Joaquim Adelino de Azevedo Filho.

O setor jurídico da entidade está estudando medidas possíveis no âmbito da Justiça para obtenção de mais tempo para conscientizar a sociedade para os riscos do projeto, e suas consequências.

No próximo dia 16, às 11h, a APqC e a Frente Parlamentar em Defesa dos Institutos de Pesquisa e Fundações farão ato pela preservação do patrimônio público na Assembleia Legislativa.