Sem consenso

Indicação de Bolsonaro para Comissão de Direitos Humanos leva PT a impasse

Com direito a presidir três colegiados na Câmara, partido se divide entre CDH e Seguridade Social, importante para a área de saúde. 'Ainda precisamos afinar a viola', admite líder petista Vicentinho

Vicentinho, entre Alessandro Molon e Benedita da Silva: afinando a viola para evitar constrangimento

Brasília – Apesar dos embates e polêmicas provocados pela perda do comando da Comissão de Direitos Humanos da Câmara em 2013, o PT parece não ter certeza sobre a necessidade de voltar a presidir o colegiado, comandado no último período pelo deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP). Enquanto alguns petistas consideram fundamental não deixar que os trabalhos continuem nas mãos de parlamentares conservadores, outros entendem que há áreas mais importantes.

Pelo tamanho da bancada, o PT tem direito à presidência de três comissões. Uma dada como certa é a Comissão de Constituição e Justiça, passagem obrigatória de todos os projetos que chegam à Casa e uma instância importante para o debate político de propostas centrais para o governo. Outro alvo de cobiça é a Comissão Mista de Orçamento. Depois disso, porém, começam as dúvidas, que acabam por travar o processo de distribuição dos comandos de colegiados, que deveria ter sido concluído hoje e agora ficou para a próxima semana.

No final do ano, PT apregoava como trágica a passagem de Feliciano pelo comando da CDH, e dizia que a retomada da presidência do colegiado contava com 60 de 84 deputados. Mas, entre o discurso e a prática, surgem setores que preferem o comando da Comissão de Seguridade Social e Família.

Até ontem, era tido como certo que os petistas reivindicariam Direitos Humanos e que os principais cargos seriam ocupados pela deputada Érika Kokay (DF) e pelo deputado Nilmário Miranda (MG), quando seria definido quem ficaria com a presidência e a quem competiria a vice. Até mesmo o PSDB, legenda de oposição ao governo, divulgou uma nota na última sexta-feira apoiando a iniciativa e defendendo a condução de Érika Kokay a um dos dois cargos.

Agora, o impasse dá sinais de que não se resolverá facilmente. Uma das alternativas que está sendo estudada entre os lideres partidários é a possibilidade de a legenda ficar com a comissão de Seguridade e a presidência da CDH ser entregue a um partido ou parlamentar que tenha sintonia com a causa de direitos humanos, caso de Luiza Erundina (PSB-SP). Mas, para a negociação ser concluída, ainda são necessários alguns acertos.

Esta é a garantia para evitar que um parlamentar conservador não ocupe a presidência da comissão, provocando embaraços ao governo e a deputados alinhados à causa. A bancada evangélica não esconde que lutará para se manter no local a que chegou, e a ponta de lança da estratégia pode ser Jair Bolsonaro (PP-RJ), famoso pela defesa da ditadura, pela apologia ao militarismo, por agressões verbais e empurrões em deputados contrários a sua visão de mundo e por declarações homofóbicas.

Escudo de Feliciano na CDH, Bolsonaro chegou a gritar no dia da posse do deputado-pastor à frente da comissão que “agora as aulas e estímulos à boiolagem (sic) vão acabar dentro desta comissão”, numa crítica às matérias que destacam direitos para os homossexuais – como os projetos de união estável e autorização para identidade de gênero.

O antídoto a ele pode ser o deputado Domingos Dutra (SDD-MA), que já presidiu o colegiado. Recém-transferido do PT para o Solidariedade, Dutra defende que sua nova sigla trabalhe pelo comando da comissão. Para isso, o deputado conta com o apoio de parlamentares do Psol e do PSB em sua sugestão.

Conforme informações de bastidores, outro empecilho para o PT chegar logo a uma posição sobre o assunto estaria partindo de pedidos feitos pelo próprio Palácio do Planalto. As ministras de Direitos Humanos e de Políticas para Mulheres, Maria do Rosário e Eleonora Menicucci, têm acompanhado as discussões e pedido aos parlamentares para não deixarem de lado a comissão de DH. Porém, o recém-empossado ministro da Saúde, Arthur Chioro, estaria torcendo para que os petistas mantivessem o controle da Comissão de Seguridade Social.

Se Feliciano (e) já parecia um problema, a indicação de Bolsonaro (d) parece capaz de intensificar os danos de 2013

“Ainda precisamos afinar a viola”, afirmou o novo líder do PT na Câmara, Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho (SP). Ele confirma que a negociação passa pela garantia de que a presidência da CDH fique com alguém alinhado à questão de direitos humanos, o que garantiria espaço para debates barrados ao longo de 2013, quando quadros históricos da área, como Nilmário Miranda, tiveram de se retirar do colegiado devido à impossibilidade de diálogo com Feliciano.

“No que depender de nós, o que posso afirmar é que nunca mais a CDH vai passar pelo constrangimento que passou no ano passado”, diz o deputado. Na prática, os petistas que trabalham pelo retorno à comissão de DH para as mãos do partido ficaram numa saia justa, diante dos argumentos apresentados no início da manhã. Numa espécie de salada de frutas, houve até quem tenha sugerido mais espaço nas comissões de Agricultura, de Educação e de Desenvolvimento Rural, e não na de Direitos Humanos. “Não dá para servir a todos ao mesmo tempo,  alguma comissão o PT vai ter que sacrificar e entregar”, afirmou um integrante da sigla, ao final da reunião, diante de interesses tão diversos demonstrados pelos vários deputados.

A definição é importante para a escolha das composições das demais comissões, sobretudo para o PMDB. Partido que possui a segunda maior bancada da Casa, com 71 deputados,  os peemedebistas já deixaram claro que querem ficar com a presidência da Comissão de Finanças e Tributação, outra também importante dentro do Legislativo. Na última semana, eles reconduziram o deputado Eduardo Cunha (RJ) à liderança da legenda. Em seguida, é a vez, respectivamente, da discussão sobre quais comissões ficará com o PSDB, terceira maior bancada, com 49 deputados; e com o PSD, quarta maior, com 48.