CPI da covid

Natalia Pasternak: três de cada quatro mortes por covid-19 no Brasil poderiam ter sido evitadas

Para Claudio Maierovitch, nada indica mudanças no curto prazo, nem no cenário politico-institucional, nem na conduta do governo ante a pandemia

Jefferson Rudy/Agência Senado
Jefferson Rudy/Agência Senado
"Discurso de Bolsonaro é muito deletério, porque incita o ódio, a violência e é baseado em negacionismo"

São Paulo – Três de cada quatro mortes por covid-19 no Brasil poderiam não ter ocorrido, considerada a média mundial, se o Brasil tivesse cumprido os protocolos científicos no combate à pandemia e não fosse governado por um negacionista. “Ou seja, quando atingirmos 500 mil mortes, isso quer dizer que 375 mil poderiam ter sido evitadas”, disse a microbiologista Natalia Pasternak, no depoimento que prestou à CPI da Covid nesta sexta-feira (11) junto ao ex-presidente da Anvisa Claudio Maierovitch. A informação consta de estudo, citado por ela, coordenado pelo epidemiologista Pedro Hallal, publicado na revista científica britânica The Lancet. O país chegou hoje a 484.235 óbitos.


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Segundo Natalia, o comportamento do presidente Jair Bolsonaro teve impacto “gigantesco” para o agravamento da pandemia, “pelo cargo que ocupa”. “O descaso com que ele trata as mortes, as famílias que perderam seus entes queridos, mostra uma total falta de empatia. O discurso é muito deletério, porque incita o ódio, a violência e é baseado em negacionismo. Cria confusão, discórdia, falsas controvérsias na ciência.” Para ela, só é possível “mudar o comportamento das pessoas com informação adequada transmitida de forma honesta”. “O processo de desinformação orquestrado pelo governo federal e pelo Ministério da Saúde levou com certeza muito mais vidas do que se houvesse um processo honesto, transparente, comunicativo e baseado em ciência”, acrescentou.

Maierovitch lembrou que a doença começou a se espalhar no país a partir das capitais num movimento  para o interior. Até meados de 2020, alguns governadores e prefeitos implementaram medidas de restrições que funcionaram pelo menos em parte. Mas no final do ano, com a pandemia “semeada em toda a parte”, já disseminada em todo no território nacional, as flexibilizações mais permissivas agravaram o quadro dramaticamente.

Copa América é “insanidade”

“Além disso, as medidas adotadas, mesmo precariamente no ano passado, não o foram neste ano. E ficamos quatro meses sem auxílio emergencial nenhum. Não acredito que seja apenas coincidência que tenha sido nesse período que houve o maior crescimento da incidência e número de mortes”, analisou o sanitarista. Maierovitch resumiu sua opinião sobre a realização da Copa América no país – a partir do próximo domingo – no atual cenário: “Insanidade. Me parece uma atitude insana”.

Perguntada sobre se estaria otimista, Natalia Pasternak afirmou à CPI que vencer a pandemia depende do comportamento das pessoas e também de vacinas. “Dado o comportamento que estamos vendo no Brasil e a falta de adesão de medidas preventivas, junto à vacinação lenta, temo que essa pandemia vai ficar entre nós ainda bastante tempo.” Maierovitch também falou sobre otimismo. “Não consigo no momento ser esperançoso. Não há nada colocado no curto prazo no cenário politico-institucional que leve a crer que haverá mudança na condução da resposta à brasileira à pandemia”.


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A senadora Kátia Abreu (PP-TO) quis saber quais os motivos que levaram o país ao trágico aumento de casos e mortes por covid no país este ano, em relação a 2020. Já em 25 de abril de 2021, o número de óbitos por conta do coronavírus chegou a 195.848, mais do que as 194.949 vítimas fatais em todo o ano passado. Até este mês de junho, morreram cerca de 289 mil pessoas em 2021, totalizando 484 mil óbitos desde março de 2020.

Segundo Natalia, a explicação se dá por fatores conjugados: as mudanças de comportamento das pessoas e do vírus; a consolidação da pandemia de forma homogênea no mundo; o surgimento novas variantes, o que torna o vírus eficiente. “Se é mais eficiente, é mais contagioso e se espalha mais rapidamente. Outra coisa que mudou foi o comportamento de pessoas”, disse. “Em 2021 houve uma adesão às medidas restritivas muito menor do que alguns momentos em 2020. Com a maior circulação do vírus, motivada pelo comportamento das pessoas, a gente tem um cenário onde o que era ruim ficou pior.”

Estratégia bolsonarista: informações falsas

A estratégia do bolsonarismo na CPI continua sendo plantar a desinformação para servir de argumento a Bolsonaro, não só agora como futuramente. O senador Marcos Rogério (DEM-TO) é eficaz neste aspecto. Em sua fala, ele culpou o Supremo Tribunal Federal de tirar da União a coordenação do combate à pandemia. O STF determinou, em abril de 2020, que os governos estaduais e municipais têm poder para determinar regras de isolamento, quarentena e outras medidas no combate à pandemia. Maierovitch rebateu. O que o STF fez foi apenas restabelecer o que diz a Constituição, segundo a qual há competência concorrente da União, estados e municípios para adotar politicas públicas, informou o cientista.

Já o senador Luis Carlos Heinze, fanático defensor da cloroquina, conhecido por citar a cidade de Rancho Queimado (SC) como local onde o tratamento com cloroquina deu “ótimos” resultados, foi confrontado por Natalia. O parlamentar mostrou uma placa com o número (15,6 milhões) de pessoas curadas da covid com cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina e até o vermífugo Anita, segundo ele.

“Temos que cumprimentar os médicos brasileiros, mas devo salientar que, desses 15 milhões de pessoas, quantas passaram por sofrimentos evitáveis, quantas ficaram com sequelas que a gente não sabe nem por quanto tempo vão ficar? Esses 15 milhões representam muito mais do que número de curados. Representam dor, sofrimento e sequelas”, afirmou a bióloga. Como Heinze insistisse, Natalia Pasternak perdeu a paciência na CPI. “Essas 15 milhões de pessoas também tomaram chazinho da vó, deram três pulinhos e uma volta no quarteirão, senador”, arrematou. Segundo o site de checagens Aos Fatos, Heinze age na CPI por meio de um “discurso pontuado por alegações falsas”.


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