Som do flamenco

Silencia o violão universal de Paco de Lucía

Músico espanhol, de múltiplas linguagens, morreu aos 66 anos

CC / Alberto Cabello

Músico é expoente da música flamenca, que exige técnica e emoção extremas, mas também de outros gêneros

São Paulo – Paco de Lucía esteve em 11 de novembro em São Paulo, naquele que seria o seu último show no Brasil. A chuva o reteve com seu grupo em Porto Alegre, e foi preciso fretar um avião para buscá-lo, causando atraso de quase duas horas na apresentação, que começou às 23h. Quando finalmente conseguiu subir ao palco, depois de passar por turbulência no voo, o música humildemente pediu desculpas, agradeceu pela paciência e comentou: “Foi um dia difícil”. Em seguida, inundou o teatro com seu som, fechando com um clássico de seu repertório, Entre dos Aguas, canção gravada em 1973, que fez parte da trilha sonora de Vicky, Cristina, Barcelona, de Woody Allen, em 2008.

Nascido Francisco Sánchez Gómez, em 1947, Paco morreu hoje (26) em uma praia de Tulum, vizinha a Cancún, no México, onde tinha uma casa. Ele estava brincando com netos quando se sentiu mal. A causa provável da morte, a caminho do hospital, foi enfarte.

“Payo de nacimiento, pero gitano de alma”, definiu o jornal El País. A frase refere-se a uma expressão (“payo”) usadas pelos ciganos, os “gitanos”, para designar quem não é cigano. Ele nasceu em Algeciras, cidade de porte médio na região de Cádiz, que informou estar “chorando em silêncio pelo mais internacional de seus filhos”. Começou tocando ainda pequeno, por necessidade, conforme contou. “Os flamencos, como todos os músicos de músicas de raiz, sempre tivemos a geladeira vazia.” Aprendeu a tocar ouvindo Ramón, irmão mais velho.

Paco encarregou-se de espalhar o flamenco pelo mundo, preservando a tradição ao mesmo tempo em que agregava jazz, blues e outros gêneros. Para muitos, também ajudou a diminuir as fronteiras entre a música dita culta e a popular.

Em meados dos anos 1960, Paco se juntou à companhia do bailarino e coreógrafo Antonio Gades para uma turnê pelas Américas, onde descobriria o Brasil e a Bossa Nova. Gades e Paco podem ser vistos juntos no filme Carmen, de Carlos Saura, de 1983. No final da década de 1960, conheceu Camarón de la Isla, ou simplesmente Camarón, um dos grandes nomes do flamenco, com quem gravou nove álbuns.

Até voltar em 2013, para apresentações em Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo, Paco ficou 16 anos sem tocar no Brasil. “Quem sou eu? Um guitarrista flamenco. Quero ver se tenho algo novo a dizer com algo tão minimalista como a guitarra”, afirmou em entrevista de 2004. “Isso é que o realmente esperam os fãs e os profissionais, que são a razão final dos meus esforços. Y los gitanos, os melhores juízes do que eu faço.”