MÚSICA

Sain, um jovem ‘OG’ do rap do Rio de Janeiro. E suas histórias vivas

Filho de Marcelo D2, Stephan Peixoto se tornou um dos artistas mais influentes da nova geração do hip-hop carioca

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A primeira aparição de Stephan, para o público do rap, foi em 2003, durante a gravação do álbum acústico de seu pai

São Paulo – O garoto Stephan Peixoto, que “se desenvolvia e evoluía com seu pai” – como cantou em 2003 em Loadeando –, transformou-se no rapper Sain, um dos mais influentes artistas do Rio de Janeiro. Filho de Marcelo D2, o artista já impusionou carreiras de amigos e usa rimas para contar as histórias vivas nas ruas do Catete, bairro da zona sul da capital fluminense.

A primeira aparição de Stephan para o público do rap foi em 2003, durante a gravação do álbum acústico de seu pai. Ali, ainda criança, Sain fazia suas primeiras rimas, cobrando uma viagem para Disney e falando sobre videogame.

Formação

Desde cedo, a música, principalmente o rap, dominou sua rotina e foi pilar importante na sua formação pessoal. Em 2009, criou seu primeiro grupo, o Start, um marco na cena carioca ao apresentar uma sonoridade mais comercial. Apenas oito anos depois, Sain iniciou carreira solo e lançou seu primeiro álbum, Dose de Adrenalina, com estética mais introspectiva e densa.

A versatilidade do rapper de 31 anos é visível por ser talentoso em duas vertentes: nas rimas e também nas produções. O contato com a arte desde cedo tornou seus ouvidos mais apurados. Assim, o acesso a um rico acervo musical dentro de casa influenciou Sain a também produzir instrumentais. Hoje, inclusive, ele se considera melhor beatmaker do que rimador.

Em 2021, Sain lançou um disco de remixes do último EP publicado, Slow Flow (2019). O projeto traz o rapper expondo suas visões do cotidiano entre os bairros do Catete, a Glória e a Lapa e as mais diversas nuances, passando pelas experiências de vida e as raízes que lhe formaram como rapper.

Confira a entrevista.

Você “surge” na cena ainda criança, quando cantou em Loadeando com seu pai. Desde lá, como foi seu desenvolvimento artístico, somado ao amadurecimento da idade, ao decorrer dos anos, até você se lançar como MC?

Nunca parei para pensar nisso. Eu fiz a música com meu pai e fui apresentado para esse universo. Antes mesmo de querer ser MC, eu fui absorvendo naturalmente a cultura. Então, ao mesmo tempo que cresci como ser humano, também fui amadurecendo o lado artístico. Desde pequeno eu peguei as visões sobre a cultura hip-hop e os ensinamentos.

Eu já ouvi de muita gente do Rio que você foi um pilar importante na cena, durante a década passada, e que influenciou gerações distintas. Qual a sua relevância e papel para o que é a cena carioca hoje?

Sou o jovem OG (abreviação do termo inglês “Original Gangsta”, atribuído à velha guarda). Além de ter essa criatividade artística, tenho muita graditão pela cultura, porque através dela conquistei tudo, viajei o mundo e consigo dar tudo para minha filha. É uma retribuição. Então, eu puxo meus amigos e as pessoas ao meu redor. Na época, quando a internet não era o que é hoje, sempre fui muito nerd de rap e pesquisava muita coisa. A partir disso, vejo que consegui passar muitas ideias pra minha rapaziada.

Cultura local

Sua arte traz uma forte influência do Catete e da cultura local do bairro. Como começou a sentir a necessidade de falar sobre seu bairro e o enxergou como inspiração?

A gente cresceu em um lugar não tão favorecido, e levar a arte para o bairro é importante. É devolver os ensinamentos que teve ali. É uma troca entre o artista e a área. Se o seu bairro faz por você, é preciso retribuir.

A alcunha de “filho do D2”, que acompanhava as apresentações sobre seu nome, já te incomodou? E qual é o sentimento de dividir a arte ao lado do seu pai?

Eu nunca achei ruim ser chamado de “filho do D2”, porque sempre me orgulhei disso. De alguma forma, foi uma pressão pra minha carreira, mas a gente cresce e aprende a lidar com isso.

Eu e meu pai temos uma relação de amigos, mas quando a gente vai para o estúdio juntos me pega muito. Querendo ou não, é o Marcelo D2 que está lá. Ele é um dos maiores da história, não posso estar num nível abaixo na hora de rimar.

Acervo rico

Você traz produções baseadas nos anos 1990, com influência dos samples. Como esse contato cedo com a música e ter acesso a um acervo rico em casa ajudou a ter um ouvido mais apurado na produção?

Sem essa bagagem musical, eu não teria o que conquistei. Eu tive muito acesso à cultura, seja música, fotografia e outras formas de arte. Isso tudo desde muito cedo. E como a gente faz produções com uma estética dos anos 90, com samples, nós abrimos a cabeça para ouvir e explorar outras sonoridades, o que possibilita que nossa música vá muito além.

Hoje sou melhor produtor (do que rimador). Como rapper, não alcancei 100% da minha capacidade, mas como produtor estou mais perto do meu auge. Pode ser uma viagem minha também. Mas fazer beat é algo mais carinhoso e leve, mais acolhedor. Enquanto rimar é um processo mais agressivo pra mim.

Você apresenta um contraste sonoro na carreira. Quando surgiu com a Start, sua música trazia uma estética mais comercial, mais leve. Depois, na carreira solo, apresentou uma música mais densa, mais introspectiva. Essa mudança faz parte daquela maturação artística que falamos no começo?

Na época da Start, a gente estava descobrindo muita coisa. Mas eu gostava muito do rap de Nova York, dos anos 90. Quando entendi que poderia fazer aquilo com propriedade, fui para esse caminho. Slow Flow é um passo mais adiante, quando começo já a experimentar dentro do boombap. É um processo de lapidação contínuo.