Proteção e acolhimento

‘Não é Não’: PL de Maria do Rosário define protocolo para atender vítimas de violência sexual em casas noturnas

Projeto de autoria de Maria do Rosário (PT) ganha relevância pela proximidade do carnaval. Inspiração vem do modelo de atuação que levou à prisão de Daniel Alves, que está prestes a ser condenado por estupro

Divulgação/NãoÉNão
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A expressão "Não é Não" é utilizada por mulheres em diferentes países para alertar que homens não possuem direito de qualquer contato não consentido com seus corpos

São Paulo – O já chamado “Protocolo Não é Não”, apresentado nesta semana pela deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), será a primeira matéria a tramitar na Câmara dos Deputados no ano legislativo de 2023. A proposta obriga estabelecimentos de lazer – sobretudo bares e casas noturnas – a adotarem uma conjunto de medidas para o rápido atendimento e acolhimento de mulheres vítimas de assédio e violência sexual. Ele foi intitulado e tem como inspiração o protocolo No Callen, adotado em Barcelona.

De forma geral, os abusos contra as mulheres são cometidos de várias formas e a todo tempo, mas a violência sexual voltou ao centro da atenção após o caso do jogador Daniel Alves. Ele está preso em Barcelona e prestes a ser condenado por uma acusação de estupro em uma casa noturna naquela cidade, onde os estabelecimentos do tipo adotaram o protocolo No callen, que serviu de modelo para Maria do Rosário elaborar o Projeto de Lei (PL) 03/2023.

A proposta da parlamentar do PT gaúcho ganha relevância especial também porque o país está às vésperas do carnaval, época crítica para a ocorrência de vários tipos de agressões. A expressão “Não é Não” é utilizada por mulheres em diferentes países para alertar que homens não têm direito de qualquer contato não consentido com seus corpos.

Vítimas antes

Entre os pontos centrais do protocolo proposto à Câmara está a atenção prioritária à vítima. Em regra, o direito penal volta sua atenção para a punição do agressor ou criminoso, mas não reserva cuidados com as vítimas, que muitas vezes ficam desassistidas ou são submetidas a constrangimentos.

Pelas medidas previstas no “Não é Não”, por exemplo, a mulher agredida não deve ficar sozinha, a não ser que queira e esteja em local que lhe garanta o isolamento seguro. Ela terá de receber informações rigorosamente corretas e suas decisões serão respeitadas.

Já para os estabelecimentos, a ideia é proporcionar conscientização e treinamentos adequados ao profissionais, para que lidem corretamente com as denúncias, ocorrências e, sobretudo, as vítimas. Além disso, deverão manter serviço de filmagem interna e externa e divulgar informações sobre o protocolo em local visível ao público frequentador.

“Proprietários e equipes que trabalham nesses ambientes não podem desconhecer que há mulheres e jovens sofrendo assédio, quando muitas vezes ocorre de forma explícita, e se omitam quando pedem ajuda. Precisam ser proativos e combater o problema”, defende Maria do Rosário.

Bons exemplos

A experiência feminista catalã vem servindo de exemplo e inspiração em diferentes lugares do mundo e cada vez mais cidades do mundo já adotam protocolos similares. Dentro da própria Espanha, Madri e Pamplona já têm leis e medidas similares.

mulheres

Diferentes estados brasileiros também discutem formas de adotar as medidas de proteção às mulheres. No Rio Grande do Sul, a deputada estadual Stela Farias (PT) ingressou com projeto intitulado “Protocolo Não se Cale RS“. A proposta tem princípios semelhantes: “a celeridade, o atendimento humanizado, o respeito à dignidade e à honra, o resguardo da intimidade e da integridade física e psicológica da vítima, bem como a preservação de todos os meios de prova em direito admitidos”.

“Ao criarmos o Protocolo “Não se Cale RS”, queremos dizer que é preciso ampliar a rede de acolhimento e respeito em todos os espaços para que a vítima se sinta segura para denunciar e possamos avançar para mudar a cultura machista que desrespeita o direito das mulheres ao lazer sem sofrer importunação de nenhum tipo, pois isso é crime”, explica a parlamentar.

Da mesma forma, o projeto de Stela Farias também prevê treinamento dos funcionários dos estabelecimentos comerciais para garantir o pronto atendimento e a perspectiva de acolhimento e respeito ao relato da vítima. “São diversas formas de violência. Desde a abordagem indevida, o constrangimento, o assédio, até situações mais graves de importunação sexual e estupro”, lista a parlamentar.

Defesa das mulheres

O Piauí, governado pelo petista Rafael Fonteles, também decidiu que adotará medidas sobre o assunto. Na última terça-feira (31), a secretária estadual da Mulher, Zenaide Lustosa, reuniu delegadas da Polícia Civil e representantes da Secretaria de Segurança Pública para uma reunião cuja pauta foi como viabilizar o protocolo no estado.

“Queremos uma rede de proteção sensível ao acolhimento e para adotar as providências necessárias e trabalhar a prevenção. Vamos discutir com a Secretaria de Segurança, pois temos que implantar o protocolo “No Callem”, o do Feminicídio e ações para atender as mulheres vítimas de violência sexual”, diz Zenaide.

A discussão no estado ocorre poucos dias após o estupro seguido de assassinato da estudante Janaína Bezerra na Universidade Federal do Piauí (UFPI). O crime foi cometido em 28 de janeiro, durante a festa de recepção aos novos alunos da instituição. O também estudante Thiago Mayson é o principal suspeito e está preso. Seguranças da universidade encontraram-no abraçado à jovem em uma sala de aula.

O secretário de Segurança Pública do Piauí, Chico Lucas, afirmou que o crime contra Janaína antecipou o debate. “Não podemos naturalizar nenhum tipo de violência contra a mulher. Segurança pública, no que diz respeito à violência de gênero, é um problema geral. Às vezes, a gente fica ‘terceirizando’ colocando a responsabilidade só nos atores públicos, quando na verdade é um problema doméstico, de saúde, educação.”

A ideia, segundo o secretário, é adotar medidas de proteção à mulher em todas as esferas administrativas. “Vamos buscar experiências boas, discutir com a sociedade e pactuar com o Ministério da Mulher”, finaliza Zenaide.


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