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Moro e o ‘lawfare’. Por Cristiano Zanin e Valeska Martins

Advogados de Lula expõem contradições de Moro no seu alegado “lawfare” e afirmam que vitimização não encobre elementos contra o ex-juiz investigados pelo TCU

Lula Marques
Lula Marques
Em defesa de ex-juiz consta a reclamação de que ele estaria sendo vítima de algo que ele próprio disse ser apenas um "rematado exagero"

O ex-juiz, ex-ministro e ex-consultor Sergio Moro está neste momento se defendendo de graves acusações apresentadas pelo Ministério Público do Tribunal de Contas da União. Na sua defesa consta a reclamação de que Moro estaria sendo vítima de lawfare, algo que ele próprio disse ser apenas um “rematado exagero” retórico na famigerada sentença proferida no caso do “tríplex” do Guarujá. 

Para nós este momento tem um grande significado. Em outubro de 2016, apresentamos de forma inédita no país o conceito de lawfare a partir de uma releitura de estudos realizados no ambiente acadêmico-militar dos Estados Unidos. 

Naquela época havíamos iniciado a condução da defesa técnica do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E sabíamos que ele estava sendo vítima de um movimento de desconstrução de sua imagem e reputação por uma parcela específica do Sistema de Justiça. Outras pessoas e também empresas estavam sendo atacadas pelo método do lawfare. Quem liderava esse movimento de ataque, deturpando as leis e fazendo dos processos um ambiente de guerra, era o então juiz Sérgio Moro. 

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Esse cenário, inevitavelmente acompanhado de uma intensa propaganda realizada por uma parte da mídia com o objetivo de ajudar a destruir os alvos escolhidos, levou-nos a um momento de imersão nos Estados Unidos. 

Após um abundante estudo e debates realizados com alguns dos mais notáveis professores norte-americanos, como John Comaroff, antropólogo da Universidade de Harvard, tivemos segurança necessária para apresentar o diagnóstico: Lula estava sendo vítima de lawfare na concepção que depois viria a ser reiterada em livro conceitual publicado em 2019.

Na condição de coautores da obra, descrevemos lawfare como “o uso estratégico do Direito para fins de deslegitimar, prejudicar ou aniquilar um inimigo” (ZANIN MARTINS, Cristiano. ZANIN MARTINS, Valeska  Teixeira. VALIM, Rafael. Lawfare: uma introdução. São Paulo: Editora Contracorrente, p. 26, 2019).

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A obtenção desse diagnóstico, evidentemente, não era suficiente para produzir resultados jurídicos que pudessem paralisar os ataques de Moro e de seus acólitos na “lava jato”. 

Mas a compreensão das técnicas e táticas dos praticantes de lawfare nos permitiu formular uma série de providências voltadas à insurgência. Afinal, é possível e necessário defender empresas e pessoas que são vítimas de lawfare. Mas para isto é necessária a utilização de técnicas e táticas próprias para aquilo que denominamos de “lawfare insurgente”. 

Nesse contexto, ao simplesmente dizer que está sendo vítima de lawfare Moro cumpre um duplo papel. Mais uma vez mostra que na condição de juiz ele negou a existência da prática reprovável que agora – e sem razão – tenta jogar luzes. Pior: Moro ainda não compreendeu que lançar mão da palavra lawfare não é suficiente para encobrir fatos e elementos concretos que estão sendo investigados pelo TCU e por outros órgãos de persecução. 

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Cristiano Zanin Martins é advogado, especialista em litígios decisivos e litígios transnacionais e cofundador do Lawfare Institute

Valeska T. Zanin Martins é advogada, especialista em Direito Internacional e crises jurídicas e cofundadora do Lawfare Institute

Artigos desta seção não necessariamente expressam opinião da RBA. Texto publicado originalmente na coluna “Maquiavel”, da revista Veja


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