A denúncia da Folha e a falta de contexto

A Folha de S. Paulo desta segunda-feira traz em sua manchete uma denúncia pesada contra Hussain Aref Saab, ex-diretor do Departamento de Aprovação das Edificações (Aprov), órgão responsável pela aprovação […]

A Folha de S. Paulo desta segunda-feira traz em sua manchete uma denúncia pesada contra Hussain Aref Saab, ex-diretor do Departamento de Aprovação das Edificações (Aprov), órgão responsável pela aprovação de empreendimentos imobiliários de médio e grande porte em São Paulo. Segundo a matéria, durante os sete anos em que ocupou o cargo, o número de imóveis possuídos por Aref saltou de 12 para 118, segundo levantamento feito em cartórios de São Paulo. Seu patrimônio é hoje superior a R$ 50 milhões, ainda que sua renda mensal declarada seja de R$ 20 mil.

A denúncia por si só é gravíssima, mas adquire outra conotação quando considerada a explosão imobiliária pela qual passa a cidade nos últimos anos e as ligações do atual prefeito com o mercado imobiliário – denunciadas diversas vezes pela Rede Brasil Atual.

Uma informação crucial nesse sentido fica escondida no meio da matéria: funcionário aposentado da Prefeitura, Aref foi nomeado em 2005 pelo então prefeito José Serra (PSDB) por indicação de Gilberto Kassab, então vice-prefeito e filiado ao DEM, hoje no PSD.

A principal marca não assumida da gestão Kassab talvez sejam as facilidades oferecidas aos grandes empreendimentos imobiliários – levando em muitos casos à expulsão de moradores de comunidades pobres tradicionais em locais valorizados. O exemplo mais acabado dessas políticas são as famigeradas operações urbanas, ferramentas de valorização da terra que beneficiam o mercado imobiliário, segundo a pesquisadora Mariana Fix. O resultado é a alta do preço dos imóveis, dificultando a vida de quem quer adquirir uma moradia e beneficiando os grandes especuladores.

A Folha, no entanto, prefere deixar de lado o contexto e focar a denúncia apenas na pessoa de Aref – comedimento pouco utilizado quando denúncias semelhantes atingiram figuras do governo federal. É no mínimo um caminho interessante para investigação, que parece ter sido ignorado pelo jornal. Esperemos que outros agentes, como o Ministério Público, estejam mais atentos.