Para arquiteto, enchente deve fazer paulistanos ficarem atentos a Copenhague

Integrante do Instituto de Arquitetos do Brasil avalia que é preciso repensar ocupações e modo de vida urbanos e considera impossível buscar culpados para caos desta terça

A chuva acima dos padrões normais e a enchente que novamente ilhou a capital paulista não devem ser vistas como fenômenos provocados meramente pela falta de planejamento urbano. Na avaliação de Eduardo Pereira, coordenador do Grupo de Trabalho de Patrimônio Histórico do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), trata-se de mais um motivo para que os paulistanos fiquem atentos a Copenhague.

A capital dinamarquesa recebe até dia 18 deste mês a COP-15, Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, tida por alguns como a última grande oportunidade de se olhar para as mudanças provocadas pelo aquecimento global. A expectativa de assinatura de um compromisso internacional definitivo é cada vez menor, mas há esperança de que os países assumam fortes metas de reduções das emissões de gases que provocam o aumento na temperatura planetária.

Mas, tendo em vista que mesmo no mais otimista dos cenários haverá algum aquecimento e há diversos efeitos irreversíveis que já são sentidos, quais os desafios das metrópoles nas próximas décadas? Eduardo Pereira avalia que as mudanças mais importantes vão muito além da arquitetura. O arquiteto aponta que várias cidades e mesmo países têm estimulado mudanças na mobilidade de modo a evitar problemas no trânsito e na saúde e mais emissões de gases.

Uma das ideias nesse sentido é incentivar a aproximação entre casa e trabalho e permitir que a produção de comida seja feita a pequenas distâncias dos pontos de consumo. Nesse aspecto, países europeus, por exemplo, deveriam cortar ou ao menos reduzir a importação de alimentos, criando pequenos espaços em cada região para a agricultura. “Além disso, é preciso aumentar as densidades de áreas onde há todos os serviços para que as pessoas fiquem por ali. Em alguns países estuda-se tirar as vagas de estacionamento das ruas para evitar deslocamentos usando automóveis”, afirma.

Dentro disso, uma necessidade premente é melhorar o sistema de transporte público. Na capital paulista, a construção de novas faixas de ônibus é vista como uma das saídas que podem ter impacto imediato. Pereira acredita que o pedagiamento para quem deseje entrar no centro da cidade é um próximo passo inevitável para evitar que o caos se prolongue.

Marginal Tietê

Recentemente, o Instituto de Arquitetos do Brasil emitiu uma moção de repúdio às obras de ampliação da Marginal do Rio Tietê. A manifestação, elaborada pelo Grupo de Trabalho Patrimônio Histórico, apontou que “o projeto pretendido zomba, também, do massivo investimento que foi feito, pelo Governo do Estado, na recuperação dos taludes do rio Tietê através da implantação de rico projeto paisagístico que incluiu o plantio de árvores, árvores que serão totalmente suprimidas”.

O foco das críticas era o impacto ambiental das obras sobre o rio Tietê e o impacto arquitetônico de aumentar o número de viadutos e mexer na Ponte das Bandeiras, tida pelo IAB como a “mais bonita e bem composta” da cidade. Eduardo Pereira, um dos responsáveis pelo documento, mantém as críticas, mas considera que há uma falha grave que foi a de não contemplar as questões climáticas. 

“Agora, esse argumento de que não pode usar as margens do rio é antigo, todo mundo sabe. O rio tem seus meandros e, quando enche, ocupa a várzea. Tudo que está em volta, não só as marginais, está sujeito a encher”, destaca. Para o arquiteto, no entanto, com uma chuva como a desta terça, é impossível buscar culpados e o mais importante é pensar nas conexões entre o aquecimento global e a necessidade de repensar as ocupações urbanas.