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Deputada reacende caso de crime ambiental em terreno de Etec doado a grande indústria

Monica Seixas (Psol) pediu explicações sobre andamento de denúncias envolvendo manobras de agentes municipais e da Cetesb para dispensa de licenciamento ambiental em projeto de polo industrial em antigo colégio agrícola no interior de SP

Divulgação
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Instalações do colégio construído na década de 1930 para formar mão de obra qualificada para a cultura do café

São Paulo – A deputada estadual Monica Seixas (Psol) cobrou nesta quinta-feira (15) o acompanhamento de investigação de possível crime ambiental em um grande terreno de uma escola técnica estadual doado a uma grande indústria no interior de São Paulo. Trata-se de um antigo cafezal experimental da Etec Dr. Carolino da Motta e Silva, na zona rural de Espírito Santo do Pinhal, na região mogiana, divisa com Minas Gerais, ao lado de Poços de Caldas.  O colégio foi criado nos anos 1930 para formar mão de obra qualificada para o café. A cultura ainda é a principal da região nos dias de hoje.

Em ofício enviado ao delegado Guilherme Risso, titular da delegacia de Polícia no município, a parlamentar questiona quais medidas estariam sendo tomadas na unidade em relação a três boletins de ocorrência (BO) registrados por ex-alunos do antigo colégio técnico agrícola, atual Etec. Um deles em 2021 e outros dois em 2023, todos descrevendo eventual crime ambiental envolvendo autorização indevida para obras de instalação de um polo industrial sem o licenciamento ambiental necessário.

Em resumo, os ex-alunos denunciaram à polícia que um servidor da Agência Ambiental Paulista (Cetesb) emitiu um laudo em desacordo com a finalidade das obras que vinham sendo realizadas no terreno doado. Segundo os boletins, o Sr. Adalberto Vuollo Junior, que então respondia como diretor de Agricultura e Meio Ambiente da Prefeitura de Espírito Santo do Pinhal, havia mentido ao técnico da Cetesb. Teria alegado que a intervenção no terreno se tratava de um “aceiro”, com finalidade de controle de fogo do matagal. Assim, não necessitaria de licenciamento ambiental.

Entretanto, em outro boletim, questionado no ofício pela parlamentar, foi denunciado que o então diretor de Desenvolvimento Econômico da Prefeitura, Sr. Andre Renato de Souza Moreira, em ofício documentado para o então diretor da Etec, havia solicitado a retirada de qualquer patrimônio da escola do local, em razão de início de obra de infraestrutura para o distrito Industrial “Laércio Casalecchi”.

Crime ambiental versus laudo da Cetesb

Ainda segundo ofício da deputada Monica Seixas, o laudo encaminhado pela própria Cetesb expõe a contradição e possível manipulação de informações que fundamentam um possível crime ambiental. “Não foi constatada realização de nenhuma atividade, que demandasse obtenção de qualquer tipo de autorização junto à Cetesb; Não houve constatação de nenhuma irregularidade ou ocorrência de crime ambiental, na área em questão”, diz trecho do laudo transcrito pela parlamentar.

Por essa razão, ela questionou:

  • Existe algum inquérito policial na delegacia que esteja tratando dos Boletins de Ocorrência acima citados? Se sim, em que situação se encontra a investigação do caso?
  • A delegacia tem o conhecimento da abertura de solicitações na Ouvidoria da Polícia Civil do Estado de São Paulo com relação ao possível ato de prevaricação do delegado competente no retardo da abertura de investigação?
  • A delegacia de polícia se encontra com os devidos investimentos da Secretaria competente para seu normal funcionamento? Se encontra com pessoal e infraestrutura devida para os trabalhos regulares?


A expectativa da Associação dos Ex-Alunos do Colégio Agrícola Dr. Carolino da Motta e Silva é que seja aberto um inquérito policial a partir de então. Isso porque é a primeira vez que as denúncias de crime ambiental extrapolam a atuação do grupo.

Problemas na Etec vão bem além

Entretanto, as manipulações para dispensa de licenciamento ambiental são apenas a ponta do iceberg no caso da Etec de Pinhal, como a cidade é mais conhecida. Por trás estão mudanças na lei municipal para autorizar a doação do antigo cafezal experimental para uma grande indústria do setor cafeeiro, com presença global, a Pinhalense S/A, que fabrica equipamentos para produtores de café.

Em 2016, a prefeitura aprovou lei incorporando o cafezal com 22 mil pés de café — que na verdade é parte dos laboratórios da Etec — à área urbana do município. O argumento era criar o distrito industrial Laércio Casalecchi. Pior que isso, doou 90% dessas terras à Pinhalense. O polo ainda não saiu do papel, travado por pressões. Entre elas, representações dos ex-alunos no Ministério Público, inclusive uma que pede a devolução do terreno à escola com base na lei de doações.

“O cafezal experimental gerava receita R$ 250 mil, 350 mil por ano com a colheita do café produzido nessa área. Era uma fonte de renda inclusive para ajudar na manutenção da escola-fazenda, que hoje enfrenta dificuldades, com muitos prédios com problemas. A fazenda então nem se fala. A gente quer que o terreno volte para o colégio, que o cafezal seja restabelecido, restaurado, para que a escola volte a ter renda. É proteger o patrimônio público”, disse à RBA o perito ambiental Márcio Ackermann, vice-presidente da associação.

Essa manobra na cidade, que prejudica o patrimônio público em benefício de grandes empresas foi possível porque, naquele mesmo ano, o governo paulista havia aprovado a Lei Estadual 16.338. A legislação autoriza a alienação de áreas públicas, entre elas, algumas pertencentes a escolas agrícolas do Centro Paula Souza e de vários institutos de pesquisa estaduais.

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