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Missões e experiências

No sertão potiguar, estação semelhante à espacial atrai jovens e futuros astronautas

Desde 2017, estação análoga do Rio Grande do Norte já realizou 112 missões, com 600 participantes de diversas partes do mundo. Única do hemisfério sul, realiza pesquisas que beneficiam também a sustentabilidade na Terra

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Pesquisadores de 39 nacionalidades já participaram de missões no Habitat Marte

São Paulo – No sertão do Rio Grande do Norte, um espaço inusitado tem despertado a atenção de estudantes, curiosos sobre temas aeroespaciais e até de astronautas de verdade. É o Habitat Marte, um espaço que se encaixa na denominação de estação espacial análoga, construída na pequena Caiçara do Rio do Vento, a 95 quilômetros de Natal. Ali são desenvolvidas missões semelhantes às realizadas pela Nasa e agências espaciais da Rússia, China e países europeus. Em cada missão, experiências variadas a partir da simulação das condições em Marte e na Lua.

A ideia surgiu de um projeto de pesquisa e extensão do Núcleo de Pesquisas em Engenharia, Ciência e Sustentabilidade da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O professor Julio Rezende, do curso de Engenharia Industrial, se inspirou na Mars Society, organização dos Estados Unidos que há décadas incentiva a pesquisa de elementos para a exploração de Marte. E para isso criou a Estação de Pesquisa Desértica de Marte (MDRS) no deserto do estado americano de Utah.

“O Habitat Marte é o único habitat analógico de Marte no Hemisfério Sul e um dos projetos mais inovadores no estímulo ao desenvolvimento de competências sobre o espaço e a sustentabilidade. Aqui fazemos um trabalho de impacto socioambiental, com uso de energia solar, produção de alimentos em estufa, reciclagem e água. Espaço e Terra são alvos de tecnologias sociais, para os futuros habitantes. Afinal, isso tem tudo a ver com a busca de soluções para melhorar a vida na Caatinga“, disse Julio Rezende à RBA.

De olho no espaço, pesquisadores buscam soluções para a Terra

Ou seja, os experimentos voltados a uma possível vida fora da Terra têm também aplicações no nosso planeta. Afinal, essas tecnologias em pesquisa para condições tão diferentes, voltadas para produção de alimentos, por exemplo, abrem caminho para a melhoria da vida por aqui. Isso porque a produção sustentável na base dessas pesquisas é também o caminho para reverter a grave situação ambiental. Em outras palavras, a estação no sertão potiguar tem os olhos voltados para o espaço e para a Terra.

“O Habitat Marte conta com painéis solares, estação de tratamento de esgoto e produção de alimentos. Um ambiente autossustentável com aprendizados para comunidades aqui na Terra e interessadas em tecnologias sociais e combate à fome e pobreza”, afirmou o professor.

Professor Rezende, no Habitat Marte: impacto socioambiental (Foto: Divulgação)

Rezende é pesquisador da área de sustentabilidade e espaço. Em especial o desenvolvimento de habitats que permitam o convívio humano em regiões sob ameaça de escassez hídrica e mudança climática. Exatamente a condição do semiárido brasileiro. Parte dos estudos são financiados por agências do governo federal de apoio à pesquisa.

Recentemente. o centro teve um dos projetos aprovado em edital de um programa federal destinado a beneficiar o empreendedorismo inovador. Os recursos são da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Mas há recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e convênios com o Serviço Brasileiro de Apoio Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) no Rio Grande no Norte.

Missões com participação de astronautas

Segundo Rezende, as missões simuladas têm duração de 24 horas. Os participantes, em geral, são estudantes e pesquisadores que querem melhorar o currículo. Desde a sua criação, em 2017, já foram realizadas 112 missões simuladas, com 600 participantes de 39 nacionalidades. “Durante a pandemia criamos missões virtuais, temáticas, que permaneceram mesmo com o retorno das atividades presenciais.”

Entre todos esses participantes, há astronautas em formação na Agência Europeia, pesquisadores do Canadá, Estados Unidos, México, China, Alemanha, Polônia, Itália, Israel e Índia. Entre elas, a engenheira aeroespacial indiana Ilankuzhali Elavarasan, que tornou-se pesquisadora no desenvolvimento espacial em projetos de pesquisa do Habitat Marte. No centro de seu trabalho está a radiação atmosférica e de superfície marciana. Além disso, ela estuda esse efeito sobre o crescimento e sustentabilidade das plantas para um futuro habitat espacial. Com sua visão futurística, conecta a exploração espacial com a ciência na vida cotidiana.

Em novembro de 2021, o Habitat Marte homenageou a astronauta Sian Proctor, uma das astronautas da missão espacial Inspiration 4, da SpaceX. Ela esteve no espaço de 15 a 18 de setembro daquele ano, e por isso deu nome a uma missão. Sian participou da missão 42 do Habitat Marte, que teve uma parte presencial, na base em Caiçara do Rio do Vento, e também de forma remota. No momento, Julio Rezende está organizando uma missão em homenagem ao brasileiro Santos Dumont, pelos 150 anos de seu nascimento. Sua principal invenção foi fundamental para o desenvolvimento aeroespacial.

Uma das instalações do Habitat Marte, sob o céu do sertão (Foto: Divulgação)