Herança

‘Vacina nunca mais’: negacionismo persiste e atrasa campanha contra a dengue

Baixa adesão à vacina (“Mosquitos do Bill Gates”) tem raízes bolsonaristas. Mas governo intensifica campanha pelo país e defende esforço conjunto

Eduardo Matysiak
Eduardo Matysiak
"Minha filha não vai tomar", disse uma mãe que se define como "conservadora, cristã e apoiadora de Bolsonaro"

São Paulo – O Brasil superou, no início de março, a marca de 1 milhão de casos de dengue, número atingido em apenas oito semanas. Enquanto isso, o governo federal amplia as campanhas de conscientização sobre o mosquito e também vacina com o máximo de doses disponíveis no mercado. Contudo, a adesão da população ao imunizante é baixa. Apenas 11% das doses disponíveis já chegaram em braços de brasileiros. Entre as justificativas, negacionismo e teorias da conspiração contra imunizantes.

O público-alvo inicial do Ministério da Saúde é o da faixa de 10 a 14 anos. De acordo com a pasta, até o início do mês 1.235.236 vacinas já estavam disponíveis em 521 municípios onde a situação da epidemia é mais crítica. Destas, os profissionais de saúde aplicaram apenas 135.599. O esquema vacinal do imunizante Qdenga é composto por duas doses, separadas por três meses.

A primeira cidade a receber vacinas em massa, Dourados (MS), conseguiu vacinar apenas 20% do público esperado em dois meses do programa. A prefeitura tenta abordagens mais diretas. Chegou a montar postos de vacinação em shoppings e ampliar horários em unidades de saúde. Contudo, o público não parece aderir aos imunizantes da forma adequada. Já no Distrito Federal, região em estado de emergência mais afetada do país, apenas 32% das crianças tomaram a vacina.

Vacina e herança bolsonarista

Entre as razões para a baixa adesão ainda está o persistente negacionismo científico. Com herança do radicalismo apoiado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), circulam mentiras sobre vacinas por grupos de apoiadores em aplicativos de mensagens e outras redes sociais.

“Estão fazendo um experimento com controle de cobaias”, afirma um internauta conspiracionista. “É outro veneno”, afirma outro usuário da rede social X, que se intitula “cristão”. “Vacina nunca mais”, apela outra usuária ligada a esses grupos.

“Não autorizo minha filha a tomar nenhuma vacina”, disse uma internauta cuja descrição do perfil afirma “apoiadora do presidente Bolsonaro”. “Minha filha não vai tomar”, diz outra mãe que se define como “conservadora, cristã e apoiadora de Bolsonaro”. “Eles não falam que esses mosquitos foram modificados geneticamente e vem direto da fabrica de mosquitos do velho Bill Gates”, afirma outro internauta.

Nísia reforça participação do governo e da sociedade

No último sábado (2), “Dia D” do combate à doença, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, esteve em Serra (ES) e em Salvador. E enfatizou a importância da união entre governos federal, estadual e municipais, além de profissionais da saúde e da população. “Nesse momento, é importante pensarmos no controle e na eliminação dos focos do mosquito, na proteção de cada um e também no cuidado com os sintomas de alerta. É importante não tomar medicamentos por conta própria e sempre consultar um profissional da saúde para diagnóstico.”

“Cada um tem que fazer a sua parte, governo e sociedade. Já sabemos que 75% dos focos estão dentro das nossas casas e no entorno”, lembrou Nísia. “Os agentes de combate às endemias que cumprem o papel de nos orientar, de olhar os focos, de colocar o remédio para as larvas do mosquito, eles precisam ser acolhidos, assim como os agentes de saúde que ajudam no trabalho de orientar as pessoas a procurar a unidade de saúde nos casos mais graves”, acrescentou.