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Fiocruz e Butantan fornecem maior parte das vacinas, mas importam matéria prima

A Fiocruz, vinculada ao Ministério da Saúde, e o Butantan, ao governo paulista, são as maiores produtoras de vacinas do Programa Nacional de Imunizações, que neste mês completa 50 anos. Mas faltam investimentos para esses laboratóricos desenvolverem e produzirem as matérias primas

Divulgação/Butantan
Divulgação/Butantan
Linha de produção do Butantan. onde as vacinas são envasadas. Matérias primas são importadas

São Paulo – Graças à distribuição de vacinas pelo SUS, o exitoso Programa Nacional de Imunizações (PNI), que neste mês completa 50 anos,“é um valor agregado não só para o país, mas para todo o mundo”, segundo a chefe de saúde do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Brasil, Luciana Phebo. “O PNI não é só importante para o Brasil, é importante para todo o mundo. E ainda mais lidando com doenças virais. Vírus não têm passaportes e não reconhecem o dever de um país e de outro”.

E nesse meio século prevenindo, combatendo e erradicando doenças graves, como a pólio, por exemplo, conta com a Fiocruz, vinculada ao Ministério da Saúde, e o Butantan, ligado ao governo do estado de São Paulo. Juntos, fornecem a maior parte das vacinas, soros e outros imunobiológicos da política do PNI.

O Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos da Fiocruz (Bio-Manguinhos) tem em seu portfólio as vacinas contra a DTP, Febre Amarela, Haemophilus influenzae B, Meningite A e C, Pneumocócica 10-valente, Vacina Covid-19 (recombinante), Poliomielite Inativada, Poliomielite Oral, Rotavírus Humano Tetravalente Viral, Tríplice Viral e Sarampo e rubéola (atenuada).

O instituto está em processo de assumir a produção da vacina BCG, em uma parceria com o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), após uma crise que levou ao fechamento da fábrica da Fundação Ataulfo de Paiva (FAP), a única instituição que produz a vacina BCG no Brasil desde que a amostra do bacilo atenuado chegou da França, há quase um século.

Segundo o diretor de Bio-Manguinhos, Maurício Zuma, além do Brasil, outros 70 países recebem vacinas produzidas na Fiocruz. A distribuição é feita por organismos internacionais, como a Organização Pan-Americana de Saúde, o Fundo das Nações Unidas para a Infância e a Aliança Internacional para Vacinas e Imunização (Gavi). As mais exportadas são a vacina contra a febre amarela e os imunizantes contra a doença meningocócica.

Vacinas, soros e outros imunobiológicos

“Bio-Manguinhos hoje produz dez vacinas diferentes, todas elas compondo o calendário nacional de vacinação. Em 2022, entregamos mais de 120 milhões de doses para o PNI, esse é o número médio que costumamos entregar todo ano. Somente em 2021, foram mais de 200 milhões por conta da pandemia de covid-19”, destacou Zuma.

O Instituto Butantan produziu na pandemia de covid-19 mais de 115 milhões de doses de CoronaVac. E todo ano fornece 80 milhões de doses da vacina contra a gripe, além de imunizantes contra hepatite A, hepatite B, HPV, dTpa e raiva. Além das vacinas, o instituto centenário fornece também 100% dos soros antivenenos distribuídos pelo Ministério da Saúde para todas as regiões do Brasil, para tratar casos de envenenamento devido a ataques de serpentes, aranhas e escorpiões.

O Butantan também pesquisa novas tecnologias de vacinas. No momento, o laboratório paulista realiza testes clínicos de fase 3, a última fase antes do registro, de novas vacinas candidatas contra dengue, chikungunya e influenza. “Estamos otimistas em poder conseguir registrar e disponibilizar estas vacinas em breve”, disse a diretora médica do Butantan, Fernanda Boulos.

A diretora, no entanto, ressalta que apesar de laboratórios públicos fortalecerem a autonomia nacional, é preciso avançar. Isso significa garantir também o desenvolvimento e produção de insumos necessários para todas as etapas de produção.

“É necessário pontuar que muitos insumos utilizados durante o processo de produção das vacinas ainda são importados. É importante fortalecer, cada vez mais, estas instituições para que possamos internalizar diversas etapas do processo produtivo, incluindo produção de insumo farmacêutico ativo (IFA), garantindo esta capacidade local de produção de vacinas”, reforçou.

Falta capacidade para nacionalizar produção de suprimentos

A coordenadora de Epidemiologia da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Maria Rita Donalisio, defende investimentos para reforçar a capacidade produtiva e a nacionalização da produção de suprimentos. Afinal, há o consenso de que os recursos investidos em vacinas representam menos gastos com tratamentos.

“A gente tem dois grandes laboratórios que garantiram a produção nacional das vacinas mais importantes do programa, e precisa de reforço para garantir esses suprimentos, para renovar e adequar esses laboratórios. A gente sempre precisa de investimentos”, defende. “Esse fortalecimento é estratégico para o país, para a gente ter autonomia e mais fôlego para suprir as necessidades nacionais.”

Foi nesse sentido que uma das primeiras ações do Ministério da Saúde foi recriar o Grupo Executivo do Complexo Econômico e Industrial de Saúde. “Nosso plano de trabalho é fazer com quem, em dez anos, mais de 70% dos bens de saúde sejam produzidos no país, entre vacinas, medicamentos e insumos”, disse a ministra Nísia Trindade.

Lições da pandemia de covid-19

“Vimos como isso é essencial durante a pandemia da covid-19, quando tivemos de importar ingrediente farmacêutico ativo para as vacinas e tantos outros insumos essenciais, como máscaras e luvas, por exemplo. A maior autonomia do Brasil no setor com o desenvolvimento da indústria local reduz a vulnerabilidade do SUS e assegura o acesso universal à saúde, além da geração de emprego e renda”, destacou.  

Além disso, o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) prevê mais de R$ 8,9 bilhões para essa área, sendo R$ 6 bilhões para o fortalecimento da cadeia de produção de vacinas, medicamentos e equipamentos. Mais R$ 2 bilhões custearão a construção e pré-operação das fábricas do campus Santa Cruz da Fiocruz, que será o maior centro de produção de produtos biológicos da América Latina. Os outros R$ 895 milhões serão investidos no parque fabril da Hemobrás e na qualificação da hemorrede no país, o que vai impactar diretamente os pacientes com hemofilia, facilitando o acesso ao tratamento com hemoderivados.

O objetivo do governo é que o Brasil nunca mais tenha de reviver aquelas semanas dramáticas de espera pela liberação de carregamentos de ingrediente farmacêutico ativo (IFA) na alfândega chinesa para as vacinas contra a covid-19. E que tenha a partir do desenvolvimento da indústria nacional de saúde outras políticas tão exitosas como o Programa Nacional de Imunizações.

Redação: Cida de Oliveira, com Agência Brasil