Entre sonegação e propina

‘Tudo Joia?’: Secom ironiza escândalo do casal Bolsonaro. Deputados querem CPI

Deputado Rogério Correia (PT-MG) quer instalar CPI para investigar se joias foram oferecidas em troca da privatização de refinaria da Petrobras. TCU proíbe Bolsonaro de usar ou vender joias

Divulgação/Secom
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Governo Bolsonaro tentou entrar com joias sauditas sem declarar À Receita Federal

São Paulo – A Secretaria de Comunicação Social (Secom) do Planalto aproveitou a liberação do programa para a declaração do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) 2023 nesta quinta-feira (9) para ironizar o escândalo das joias ilegais que atinge o ex-presidente Jair Bolsonaro e a ex-primeira-dama, Michele. “E aí, tudo joia? Já começou a preparar a sua declaração do IR”, diz a postagem da Secom nas redes sociais. Internautas reagiram com humor à publicação.

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Em outubro de 2021, um ex-assessor do então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, tentou entrar no Brasil com as joias avaliadas em R$ 16,5 milhões, sem declará-las à Receita Federal no Aeroporto de Guarulhos (SP). Os itens seriem um “presente” do governo da Arábia Saudita para Michelle Bolsonaro. Sem pedido para incorporá-las ao patrimônio público, as joias foram retidas pela receita. De lá para cá, nomes ligados ao governo anterior fizeram inúmeras investidas pera tentar reaver as joias.

Além disso, Bolsonaro confessou que recebeu pessoalmente e mantém em seu “acervo privado” um segundo estojo de joias. O pacote contendo um relógio com pulseira em couro, um par de abotoaduras, uma caneta, um anel e um masbaha (uma espécie de rosário islâmico) é avaliado em cerca de R$ 400 mil. Esse presente ficou guardado em um cofre do Ministério de Minas e Energia por mais de um ano, até ser entregue ao ex-presidente.

A legislação brasileira obriga a declaração de bens mais valiosos que US$ 1.000 que entram no país. Ademais, também determina que presentes que o chefe de Estado vier a receber acima desse valor devem ser incorporados ao acervo da União. Bolsonaro não fez nem uma coisa, nem outra.

Na segunda (6), a Polícia Federal (PF), por ordem do ministro da Justiça, Flávio Dino, abriu inquérito para investigar o caso. Deputados da federação Psol/Rede na Câmara apresentaram notícia-crime ao Ministério Público Federal (MPF) sobre o caso. Além disso, a Federação Única Petroleiros (FUP) também acionou o MPF para investigar eventual relação entre as joias que Bolsonaro teria tentado se apropriar de forma ilegal e a privatização da Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia.

Hoje foi a vez do presidente da Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC) do Senado, Omar Aziz (PSD-AM), anunciar que vai abrir investigação sobre a denúncia dos petroleiros, que suspeitam que as joias sejam fruto de propina na transação da Rlam com um fundo dos Emirados Árabes Unidos.

TCU proíbe Bolsonaro de usar ou vender joias

Também nesta quinta-feira (9), o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes proibiu que o ex-presidente Jair Bolsonaro use ou venda os artigos de luxo enviados a ele como presente do governo da Arábia Saudita por intermédio do ex-ministro Bento Albuquerque.

Em decisão publicada na noite desta quinta, Nardes determinou que Bolsonaro deve preservar “intacto, na qualidade de fiel depositário, até ulterior deliberação desta Corte de Contas, abstendo-se de usar, dispor ou alienar qualquer peça oriunda do acervo de joias objeto do processo em exame”.

CPI: em busca de assinaturas

Apesar da investigação na PF, parlamentares da base do governo protocolaram pedido de abertura de uma CPI para investigar se Bolsonaro tentou se apropriar indevidamente dos bens de luxo. Assinam o pedido os deputados Rogério Correia (PT-MG) e Túlio Gadelha (Rede-PE), que estão coletando assinaturas. Na Câmara, para abrir uma CPI, são necessárias as assinaturas de 171 deputados.

Para Correia, se instalada, a comissão deve ficar conhecida como “CPI das propinas” do governo Bolsonaro. “É impressionante, R$ 16,5 milhões em joias que foram ‘oferecidas’ pelo governo saudita. Temos que investigar se isso não tem relação com a venda da refinaria na Bahia, que foi feita pela metade do preço”, afirmou na tribuna da Câmara.

Almirante adia depoimento à PF

Bento Albuquerque deveria prestar esclarecimentos à PF nesta quinta (9). No entanto, o ex-ministro, que é almirante da Marinha, pediu para adiar seu depoimento, remarcado para a próxima terça-feira (14). Ele terá que explicar porque seu ex-assessor tentou entrar com as joias sauditas sem declarar à Receita. Também terá que se justificar por ter mantido o estojo destinado à Bolsonaro – que também entrou no país de maneira irregular – no cofre do ministério.

No final de semana, Bolsonaro afirmou que as joias “foram acertadas” nos Emirados Árabes, e citou o militar da Marinha. Eu estava no Brasil quando esse presente foi acertado lá nos Emirados Árabes para o ministro das Minas e Energia. O assessor dele trouxe, em um avião de carreira, e ficou na Alfândega”, disse o ex-presidente, após evento político em Washington.

Além do ex-ministro e do seu assessor, outros militares também atuaram para tentar reaver as joias apreendidas. Outro sargento da Marinha seguiu para Guarulhos em 29 de dezembro do ano passado, num avião da FAB (Força Aérea Brasileira) para pressionar os agentes da Receita a liberarem o suposto “presente”. Ele agiu a mando do o tenente-coronel do Exército Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, que pediu “urgência” na liberação do avião da FAB e providenciou as diárias do sargento da Marinha.

Caso a “CPI das Propinas” seja instalada, os militares envolvidos na “operação” das joias devem ser chamados a depor. Outro que também deve explicações é o ex-chefe da Receita Federal Julio Cesar Vieira Gomes. Ele utilizou meios extraoficiais, como ligações e áudios, para pressionar os servidores de Guarulhos a liberarem as joias.

Porém, os principais alvos de uma eventual CPI seriam Bolsonaro e Michelle. O escândalo das joias fez Michelle cancelar uma série de eventos programados para esta semana, quando tomaria posse como presidenta do PL Mulher. As repercussões do episódio também retardaram o retorno de Bolsonaro ao Brasil. Ele está nos Estados Unidos desde 30 de dezembro do ano passado.