São Paulo

Representante de empresas de ônibus reclama de lucro, e acaba confrontado em CPI

Diretores tentaram desacreditar margem de 6%, informada pela SPTrans, e irritaram vereadores, que questionaram visão de que setor opera com dificuldades financeiras

CâmaraSP

Os empresários entendem que a adoção de um novo sistema permitirá uma redução nos custos

São Paulo – Diretores do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss) afirmaram hoje (29) que consideram injusta a remuneração paga pela São Paulo Transportes (SPTrans) às empresas de ônibus da capital paulista. No entanto, o diretor Wagner Palma Moreira, que atua na área de estudos econômicos do sindicato, se contradisse ao contestar os valores de lucro liquido das empresas do setor. “A margem de lucro líquido está em 1,4% no período atual”, afirmou, inicialmente, em audiência na CPI dos Transportes, na Câmara Municipal paulistana.

Moreira contestava a informação de que a margem de lucro é de 6%. “Não se pode olhar somente o exercício, mas todo o período de vigência do contrato”, afirmou.

O presidente da comissão, vereador Paulo Fiorilo (PT), questionou a afirmação, lembrando o que foi informado pelos veículos de comunicação e pelo gerente financeiro da SPTrans, Adauto Farias, em oitiva no dia 27 de julho. “Nós temos o número de 6% de lucro e 14% de Taxa Interna de Remuneração. Esse número é incorreto, então?”, questionou. Taxa Interna de Remuneração é um valor que as empresas recebem de volta sobre investimentos realizados em frota, equipamentos, garagens, entre outros.

“Os jornais repercutiram dados da SPTrans que nós não tivemos acesso. O valor de 6% seria razoável, embora isso precise ser avaliado por cada empresa, já que cada uma delas tem seus próprios riscos de atuação, a estrutura em que opera. Não há uma definição igual para todos”, respondeu Moreira.

Pressionado por Fiorilo, de posse dos dados de balanço das empresas, o diretor voltou atrás e disse que a taxa de lucro média é de 4%. O vereador apontou que em 2012 somente três empresas tiveram prejuízo. “Foi um ano bom”, tentou argumentar Moreira, imediatamente contestado pelo vereador, que apresentou dados de 2011, demonstrando que as mesmas empresas com problema em um ano o tinham no outro. “Não há alternância, o que nos indica que pode ser um problema destas empresas, e não da remuneração. As demais têm taxa de lucro de 4%, 8%, enfim, média de 6%”, completou Fiorilo.

O diretor Carlos Alberto Fernandes ponderou que houve uma queda no número de passageiros pagantes de tarifa integral ao longo dos últimos sete anos. “Hoje recebemos o valor integral correspondente a 51,55% dos passageiros embarcados. O restante a prefeitura complementa com os subsídios”, explicou. Fernandes argumentou que o subsídio não é concedido às empresas, mas aos usuários, para garantir as meias passagens, integrações e as gratuidades. Neste ano, a prefeitura deve repassar R$ 1,4 bilhões em subsídios para as empresas.

Segundo os dados apresentados pelos diretores, o número de passageiros integrais por ano, entre 2005 e 2012, caiu de 1,387 bilhões para 1,142. No mesmo período, os estudantes aumentaram de 123,3 milhões para 173,6 ao ano. E as gratuidades, de 161,1 para 200 milhões.

“Não estamos simplesmente querendo mais dinheiro, mas é preciso reduzir o custo de operação, melhorar a eficiência do sistema, para atrair mais passageiros e com isso melhorar a remuneração”, defendeu Moreira.

O vereador Milton Leite (DEM) cobrou dos diretores que haja maior oferta de veículos à população. “É preciso ter mais ônibus para atrair a demanda que está dentro dos veículos congestionados. Não podemos afetar uma parcela da população e não oferecer mais serviço para que ela possa escolher. Isso também dará o melhor uso possível aos corredores, evitando deixá-los ociosos”, argumentou.

Para os diretores, este não é um processo imediato. “Quando o monitoramento demonstrar que está havendo a migração do carro para o ônibus, tanto SPtrans quanto empresas vão desenvolver um melhor sistema, que não necessariamente compreende ampliar a frota”, explicou Fernandes. Para ele, é possível que se conclua que o melhor seja o desenvolvimento de um sistema BRT que permita ultrapassagem, desempenho, alimentação do sistema de forma inteligente. “E não a ampliação pura e simples do número de veículos”, aponta Fernandes.

“Está havendo uma mudança. Quem estava no ponto às 4h, agora vai às 5h30. É um período de maturação, as pessoas estão testando. Elas podem decidir ainda voltar aos horários antigos de saída de casa. Leva tempo para se tomar uma decisão neste sentido”, afirmou Moreira, que defendeu as ações de prioridade ao transporte público realizadas pela prefeitura.

Leite voltou a questionar a entrada de linhas intermunicipais na cidade, alegando que elas roubam passageiros. “Se limitar a entrada das linhas intermunicipais a um quilômetro dentro da cidade, isso poderia contribuir para redução da tarifa?”, questionou. “Se houver aumento da demanda de passageiros, sim”, respondeu Moreira.

“Estas empresas são parte do câncer do sistema de transporte. Hoje, quatro empresas que nos enviaram seus balanços oscilam no vermelho na relação entre lucro líquido e investimentos. Já as empresas que atuam com 335 linhas intermunicipais, com 3.500 veículos dentro da cidade, estão muito bem. Isso vai mudar a partir dos trabalhos desta CPI”, afirmou Leite.

O vereador Tuma pressionou os diretores, retomando várias vezes que não entendia “como empresas que operam no vermelho por tanto tempo continuam atuando no setor somente por amor ao trabalho”. Carlos rechaçou o que chamou de “ilações” sobre possíveis fraudes no setor, afirmando que “a assessoria do vereador precisa verificar melhor as informações”, pois a visão de que há prejuízos constantes estaria incorreta. E completou afirmando que algumas empresas têm dívidas da ordem de 60% dos ativos, mas não operam no vermelho.

Tuma também questionou se a licitação elaborada em 2003, na gestão da prefeita Marta Suplicy (PT), teria brechas que permitam fraudes, apontando o fato de que as empresas VIP transportes Urbanos, Viação Itaim Paulista e Expandir pertencem ao mesmo grupo, de propriedade do empresário Carlos Abreu. Moreira destacou que a licitação teve âmbito internacional e que a falta de interessados no restante e fora do país levou à situação de haver grupos empresariais participando de mais de uma área de concessão.

Embates na comissão

Tuma reclamou que está sendo impedido de apresentar requerimentos. “Isto aqui parece uma ditadura. Não se pode nem ler os meus requerimentos”, afirmou. O vereador apresentou solicitações para convocar todos os ex-secretários municipais de transporte desde 2003, inclusive o atual, Jilmar Tatto. Também quer que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), vinculado ao Ministério da Fazenda, envie dados sobre movimentação financeira no exterior das empresas de ônibus paulistanas, se houver, além de solicitar ao Ministério Público do Estado de São Paulo e à Procuradoria Geral da República que enviem representantes para acompanhar os trabalhos da comissão. Ao perceber a quantidade de propostas, o presidente da comissão suspendeu as votações.

O motivo da reclamação é que antes os vereadores aprovaram requerimentos de Milton Leite e Adilson Amadeu (PTB). O primeiro solicitou que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) envie os dados da investigação sobre o suposto esquema de corrupção entre as gestões tucanas dos últimos 20 anos e as empresas que atuam no Metrô e na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), denunciado pela Siemens.

“Quero que venham as informações, ainda que sob sigilo, para sabermos se isso pode ter afetado o sistema de transportes e os custos dele na capital paulista, afinal ambas atuam integradas com o nosso sistema de ônibus”, defendeu Leite.

Amadeu quer que a empresa Digicom, que opera e mantém o sistema de informática do Bilhete Único, envie todas suas atas de reunião com a SPTrans e repasse suas planilhas de custo para a comissão. “O sistema do Bilhete Único está furadíssimo. Estas empresas estão desde 2001 e têm toda a possibilidade de fazer o que querem”, afirmou.

Após um embate com trocas de acusações, sobre a tentativa de impedir o funcionamento dos trabalhos, Leite propôs que não houvesse mais apreciação de requerimentos, ficando todos os demais para ser analisados na próxima sessão. “Temos pessoas para serem ouvidas aqui. Não podemos ficar a sessão toda apreciando requerimentos”, disse.

Na primeira reunião, os vereadores fizeram um acordo de que requerimentos só seriam apreciados em reuniões específicas, tendo de ser apresentados 48 horas antes da sessão, “para permitir que todos conheçam o conteúdo das proposições antes da sessão”, esclareceu Fiorilo.

Os vereadores Nelo Rodolfo (PMDB), Edir Sales (PSD) e Abou Anni (PV) também tinham requerimentos para apresentar, mas concordaram com a medida, isolando Tuma, que acusou a CPI de ser governista e impedir a atuação do “único vereador de oposição”.