Tempos de paz

De volta a Brasília como presidente eleito, Lula fala em recuperar harmonia entre os poderes

Para Lula, o único jeito de governar o Brasil é fazê-lo voltar a crescer. Ele prometeu urgência no combate à fome e na criação de empregos. País voltará à normalidade, garantiu

Reprodução/YouTube
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Lula afirmou aos jornalistas que só vai pensar na formação do ministério quando voltar da COP27, no Egito

São Paulo – Pela primeira vez em Brasília após a vitória nas eleições, o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), teve agenda cheia nesta quarta-feira (9). De manhã, se encontrou com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e na sequência almoçou com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Durante a tarde, foi recebido por todos os ministros do Supremo Tribunal Federal – à exceção de Luís Roberto Barroso, que está em viagem ao Egito. Lula também foi ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para conversar com o presidente, Alexandre de Moraes. Ao final, em entrevista coletiva, Lula agradeceu pela maneira como foi recebido e detalhou as prioridades do transição.

O presidente eleito destacou que as agendas do dia serviram para mostrar que é possível recuperar a “harmonia” entre os poderes da República. Ele disse que agradeceu aos representantes do Judiciário pela lisura e pelo enfrentamento à violência e às ilegalidades durante o processo eleitoral – e enalteceu as urnas eletrônicas. Descartou “vingança” e acrescentou que o Brasil voltará à “normalidade”.

Sobre a relação com o Congresso, Lula sinalizou que pretende conversar inclusive com parlamentares dos partidos do chamado Centrão. Nesse sentido, ressaltou a disposição de Lira e Pacheco em encaminhar a votação da “PEC da Transição“, que vai abrir espaço no orçamento para o pagamento do Bolsa Família de R$ 600 e para o aumento real do salário mínimo. Repetindo o discurso de campanha, afirmou que suas prioridades são acabar novamente com a fome e voltar a criar empregos formais no país.

“Não há tempo para vingança, não há tempo para raiva e ódio. O tempo é de governar. Não vou trabalhar apenas três, quatro horas por dia, mas trabalhar o dia inteiro. Porque nós temos uma dívida a resgatar com o povo pobre desse país”, disse Lula.

Congresso e Centrão

“Eu vim aqui para dizer do nosso respeito pelas instituições, da relação que a gente pretende manter com uma gama dos deputados, com o Senado. Não enxergo, dentro da Câmara e do Senado, essa coisa de Centrão. Eu enxergo deputados que foram eleitos. E portanto, nós vamos ter que conversar com eles para garantir as coisas que são necessárias para melhorar a vida do povo brasileiro”, afirmou Lula.

O petista também repetiu que não vai interferir na escolha dos presidentes da Câmara e do Senado. Lira e Pacheco buscam a reeleição. “Nem eles interferem no nosso comportamento, nem nós no deles. E assim a sociedade vai viver tranquilamente, democraticamente, e as coisas vão acontecer.”

Lula afirmou ainda que acredita na aprovação da PEC da Transição, porque o projeto beneficia a maioria da população. Nesse sentido, comentou que o seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), deve se reunir novamente com Lira e Pacheco para definir o cronograma de votação da proposta.

“Acho que nós vamos conseguir aprovar, porque há disposição das pessoas em aprovar. Não é um projeto para beneficiar o presidente Lula ou o vice-presidente Alckmin. É um projeto para recuperar a capacidade de investimento nas coisas essenciais para o povo brasileiro. É assim. E nós vamos fazer com a certeza de que será aprovado”, declarou.

Investimentos

O presidente eleito também demonstrou ter urgência para reativar programas como o Farmácia Popular, o Minha Casa Minha Vida, políticas de estímulo à agricultura familiar e retomada de obras paradas. “Vou tomar posse no dia 1º de janeiro e, se depender de mim, no dia 2 a gente já está colocando as obras para funcionar. Porque nós precisamos gerar emprego, distribuir renda e fazer esse país voltar a crescer.”

Lula ainda provocou políticos e setores da imprensa que já reclamam do aumento de gastos. “Não podemos ficar chorando, ‘ah, vai gastar…’. Muitas coisas que as pessoas falam que é gasto eu acho que é investimento. Saúde é investimento. Investir na educação não é gasto. Inclusive nós precisamos mudar algumas nomenclaturas, porque tudo o que a gente quer fazer é gasto, é gasto, é gasto… Para quê? Guardar dinheiro para pagar juros a banqueiros? Não”, respondeu.

De acordo com o presidente eleito, o Brasil tem uma dívida de 500 anos com o povo pobre. E, como já vez uma vez, vai voltar a pagá-la mais uma vez. “A primeira coisa é acabar com a fome. Vou voltar a repetir: as pessoas vão ter que voltar a tomar café, almoçar e jantar todo santo dia.”

Golpismo e democracia

Lula ainda comentou que “não existe possibilidade” de o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), tentar insuflar manifestações golpistas, a partir do relatório das Forças Armadas sobre as urnas eletrônicas. “Ninguém vai acreditar num discurso golpista de alguém que perdeu as eleições”, reagiu. “Cabe ao presidente reconhecer a sua derrota. Cabe a ele fazer uma reflexão e se preparar para daqui a uns anos concorrer outra vez. É assim que é o jogo democrático.”

Segundo ele, é preciso “detectar” quem está financiando protestos golpistas que, conforme definiu, não têm pé nem cabeça. “Então, eu vi para dizer às instituições: O Brasil vai voltar à normalidade. A gente vai voltar a dormir tranquilo, voltar a sonhar e ter o prazer e o orgulho de ser brasileiro, em tempos de paz.”

Ao final, questionado se já teria nomes para o seu ministério, Lula afirmou que vai discutir essa questão depois que retornar da COP27, no Egito.

Assista à entrevista