No Velho Mundo

Roberto Amaral: mídia brasileira manifesta complexo de vira-lata ao criticar Lula na Europa

“Quando Brasil passa a ter opinião própria, estranham. Mas Lula mostra que o país tem todas as condições de ser um ator global”, diz ex-presidente do PSB e ministro de Ciência e Tecnologia em 2003

Reprodução/Twitter
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Lula diz em Paris que os países ricos têm que pagar a "dívida histórica" e é criticado por mídia europeia e brasileira

São Paulo – Em sua passagem pela Europa, esta semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve uma agenda ampla e pragmática. Entre inúmeros compromissos no Velho Mundo, encontrou-se com o papa Francisco, o presidente italiano Sergio Mattarella e a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, em Roma. Na França, participou da Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global e foi recepcionado pelo presidente Francês Emmanuel Macron.

Apesar de recolocar o Brasil novamente como ator entre os grandes países do mundo e recuperar a diplomacia brasileira, envergonhada por quatro anos de bolsonarismo, o presidente é criticado pela imprensa do país e de setores da mídia de “centro-esquerda” europeia, que destacam aspectos que consideram negativos da viagem do presidente.

Nesta sexta, Lula chamou as exigências feitas pela União Europeia (UE) para a finalização de um acordo com o Mercosul de “ameaça”. Ele também não agradou os europeus ao discursar em plena Paris, enquadrado pela Torrre Eiffel, e dizer que os países ricos têm que pagar a “dívida histórica” com o planeta pelas questões ambientais.

Analistas “independentes” destacaram hoje nas redes sociais um artigo do jornal francês Liberátion, de centro-esquerda, que classificou Lula como decepção e “falso amigo do Ocidente”, principalmente pela sua posição sobre a guerra na Ucrânia.

Mais do que questões ambientais ou relacionadas à guerra, o que os europeus não toleram é que um líder sul-americano lhes diga o que devem fazer. E o querem, mas não dizem, é proteger sua economia com tarifas de produtos agrícolas e industriais que lhes sejam extremamente favoráveis. Produtos do Brasil e da Argentina são os mais visados.

Isso não interessa ao Brasil e é isso que Lula diz. Ao discursar na Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global, em Paris, o brasileiro apenas cobrou que os acordos comerciais sejam mais justos. 

Sentimento de ‘vira lata’ e pretextos

“Eu avalio a viagem de Lula muitíssimo bem. A mídia brasileira, que inclui a elite, seus observadores, dizem o que Nelson Rodrigues chamava de sentimento de ‘vira lata’. Quando o Brasil passa a ter opinião própria, estranham. Mas Lula mostra que o Brasil tem todas as condições de ser um ator global”, diz Roberto Amaral, que foi ministro da Ciência e Tecnologia do primeiro governo Lula e é ex-presidente do antigo PSB.

Um dos pretextos para a crítica midiática a Lula nos últimos dias, além da questão da guerra da Ucrânia, foi o encontro que estava agendado com o “esquartejador”, príncipe saudita Mohammed bin Salman, na residência oficial da Arábia Saudita em Paris, nesta noite. Mas o presidente brasileiro cancelou o encontro, o que a assessoria justificou devido à agenda intensa esta semana.

Um dos dirigentes do reino saudita, bin Salman é apontado por um relatório da inteligência dos Estados Unidos de ser responsável pela morte do jornalista turco Jamal Khashoggi, em 2018. Crítico do regime saudita, Khashoggi foi assassinado no consulado da Arábia Saudita em Istambul (Turquia).

“Relações de Estado são relações de Estado”

Para Roberto Amaral, mesmo se tivesse ocorrido, o encontro com o saudita não mancharia a passagem de Lula pela Europa. “As relações de Estado são relações de Estado. Lula não podia ir a Roma, por exemplo, sem estar com a primeira-ministra”, diz.

Ontem o presidente brasileiro se encontrou com a premiê da Itália, que é de direita, ou de extrema-direita, dependendo da opinião, e se disse “bem impressionado”. “Quando um chefe de Estado se encontra com outro, não está em jogo a questão ideológica. Vim aqui para discutir o que é importante fazer para que os dois países possam ganhar”, disse ele após a reunião com Giorgia Meloni.

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