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Países fecham acordo sobre recursos genéticos, patentes e biopirataria

Como o tratado só entra em vigor após os 15 integrantes o ratificarem em lei nacional, os bancos genéticos, como a Amazônia, seguem na mira de interesses internacionais. China e EUA têm mais da metade dos 44 mil pedidos de patente registrados no INPI

©Diego Baravelli / Greenpeace
©Diego Baravelli / Greenpeace
10% dos pedidos ou depósitos de patentes de bioinsumos referem-se ao açaí

São Paulo – A comunidade internacional finalmente chegou a um acordo para regular o uso de recursos genéticos, o registro de patentes e combater a biopirataria. O tratado firmado após 25 anos de negociações estabelece regras para utilização de plantas medicinais, produtos das florestas e conhecimentos tradicionais ao serem patenteados por grandes empresas.

Segundo comunicado da Organização Mundial de Propriedade Intectual, o acordo é o primeiro a tratar de recursos genéticos. Com ele, empresas interessadas em apresentar um pedido de patente terá de revelar a origem dos recursos genéticos usados. O inventor ou a empresa terá de fornecer também dados sobre os povos indígenas que forneceram o conhecimento tradicional para tal patente.

“Estávamos esperando por esse momento por 25 anos”, disse o embaixador brasileiro Guilherme Patriota, que conduziu o processo no âmbito da organização. Segundo ele, o texto final, que resultou de um calhamaço de 5 mil páginas, foi “cuidadosamente equilibrado”. “Trata-se do melhor compromisso possível e uma solução cuidadosamente calibrada, que busca unir e equilibrar uma variedade de interesses. Alguns muito apaixonados e assiduamente expressos e defendidos ao longo de décadas”, disse.

Ao longo desses 25 anos de discussões, os países emergentes e os ricos evidentemente ficaram em lados opostos. De um lado, países como o Brasil, a Colômbia, nações africanas e asiáticas. Todos têm seus recursos genéticos e conhecimentos ancestrais utilizados na fabricação de cosméticos, medicamentos, biotecnologia e suplementos alimentares para lucro de outros.

China e EUA dominam pedidos de patente

Nesses anos todos de discussões, os países emergentes insistiam na revogação de uma patente caso o inventor não informasse a origem dos recursos. Mas os países ricos, onde estão as indústrias farmacêuticas, argumentam impacto na capacidade de inovação.

Com o acordo, que tem entre as metas principais o combate à biopirataria, as comunidades locais terão de concordar com o uso de seu conhecimento tradicional.E também de seus recursos genéticos. E o inovador que não apresentar as informações sobre a origem dos recursos utilizados terão chance para isso antes de sofrer penalidades. O tratado entrará em vigor, porém, somente quando os 15 países ratificarem o texto em suas legislações nacionais.

Enquanto isso, bancos de recursos biológicos seguem na mira de interesses internacionais, que se aproveitam da falta de regulamentação. No caso da Amazônia brasileira, empresas dos Estados Unidos e da China estão por trás de mais da metade dos 44 mil pedidos de patente registrados no Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI). Desse total, as empresas chinesas respondem por 44%. e as dos Estados Unidos, por 9%.

Direito de propriedade intelectual

Segundo o professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), Marcos Pedlowski, dos pedidos ou depósitos de patentes de maior número com bionsumos estão relacionados ao Açaí (10,1%), Cupuaçu (5,6%) e Babaçu (4,9%). “Como se sabe que empresas chinesas estão produzindo até peixes amazônicos em cativeiro, não será surpresa nenhuma descobrirmos que há mais recursos amazônicos que chineses e estadunidenses já patentearam”, ponderou em publicação recente em seu blog.

À RBA, Pedlowski considerou que as patentes envolvem direito de propriedade intelectual, com implicações diretas no comércio, especialmente internacional. Com isso, o Brasil e os estados amazônicos perdem as melhores condições de usufruir dos benefícios dos produtos gerados a partir da biodiversidade amazônica.

“Além disso, tenho que lembrar que a China está hoje com uma forte penetração econômica na Amazônia para projetos de infraestrutura e de controle das monoculturas da soja. Ao deter mais patentes que o Brasil no tocante a produtos naturais amazônicos, o que estamos vendo é a repetição de um modelo desigual de obtenção de divisas, na qual o Brasil será mantido em uma condição de economia dependente”, disse.

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Com informações do Uol