Fazenda e Planejamento

‘Não se pode admitir fome no Brasil’, diz Haddad ao anunciar marco fiscal

Plano vincula crescimento de despesas federais à receita. Meta é “compatibilizar social e fiscal, com credibilidade, previsibilidade e transparência”

Diogo Zacarias /MF
Diogo Zacarias /MF
Ministros Fernando Haddad e Simone Tebet anunciam plano fiscal e social “engenhoso e transparente”

São Paulo – Os ministros Fernando Haddad e Simone Tebet (Fazenda e Planejamento, respectivamente) apresentaram nesta quinta-feira (30), em Brasília, o projeto de um novo marco fiscal para o país. O ministro resumiu conceitualmente o plano, que busca compatibilizar “o social e o fiscal”, dizendo que não se pode mais admitir “que um dos maiores produtores de alimentos do mundo conviva com a fome”. De outro lado, acenando ao mercado em relação à âncora fiscal, acrescentou que não vê “nenhuma razão, a partir desse anúncio, para ter dúvidas para alguém investir no Brasil”.

O plano está ancorado na vinculação do crescimento das despesas federais à receita. Pelo exposto, as despesas poderão crescer a 70% do aumento da arrecadação federal, mas em relação à receita realizada no ano anterior. Ou seja, os gastos da União ficarão limitados a 70% da receita: a expansão das despesas depende então do crescimento da arrecadação. Por sua vez, para o crescimento da arrecadação é necessária também a retomada da economia.

Porém, o plano estabelece também limite de 2,5% ao ano para o aumento das despesas em relação ao crescimento da arrecadação. Por exemplo, se a receita subir 5%, a observância estrita da regra levaria a um aumento de 3,5% das despesas (70% de 5%). Porém, nesse caso vale o teto de 2,5%. A limitação será a âncora, ou “um colchão”, para fase ruim da economia, explicou Haddad.

A ministra Simone Tebet disse que o plano é ao mesmo tempo “engenhoso” e “transparente”. “O limite é dado em relação ao aumento da receita. Aumenta a receita, aumentam as despesas. Na mesma proporção? Não. Porque temos um déficit fiscal de R$ 230 bilhões, fruto de uma herança passada de pandemia e de políticas públicas que não foram contempladas nos últimos quatro anos”, explicou Tebet, referindo-se ao governo de Jair Bolsonaro (PL).

De acordo com a ministra, o plano, também chamado de arcabouço fiscal, tem como prioridade cumprir a demanda por justiça social determinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Passamos seis anos sem reajustar a merenda das nossas crianças. Num país campeão na produção de laranja, as crianças tomam suco em pó”, afirmou Simone Tebet.

O melhor de dois mundos”

Segundo Haddad, o plano associa “o melhor dos dois mundos” das políticas fiscais anteriores: a Lei de Responsabilidade Fiscal (de 2000) ao que se pode chamar de “regra de gastos”.

A ideia, disse o ministro, foi “traçar uma trajetória consistente de resultado primário em que necessariamente a despesa vai correr atrás da receita”. Porém, a despesa vai crescer a uma taxa menor e vai se ampliar o espaço de economia para “dar sustentabilidade sem rigidez absoluta, porque tem de atender as demandas sociais”, resumiu o ministro.

Desse modo, as novas regras procuram sanar deficiências das regras anteriores, continuou. Antes, não havia uma dimensão anticíclica (para serem operadas em momentos de crise ou recessão): se o país prosperava, para se cumprir a lei a receita era mantida “em compasso com a despesa, o que é difícil de manter em fase ruim”. O que o novo arcabouço propõe, portanto, é uma “poupança prévia” para funcionar como (o chamado) colchão.

O plano, ainda nas palavras de Haddad, procura compatibilizar o social e o fiscal, ter credibilidade, previsibilidade e dar horizonte para a sociedade se organizar com regras claras. Tebet acrescentou que a meta é zerar o déficit público, ter possibilidade de superávit a partir de 2025, com estabilização da dívida pública. O plano “é fácil de ser entendido e transparente, o que gera estabilidade e previsibilidade, que são as palavras-chave”.

Questão política

O ministro encerrou a apresentação falando sobre dúvidas que ouviu em suas reuniões com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e líderes de partidos de oposição ou situação. Segundo ele, houve questionamentos, “legítimos”, sobre a possibilidade de cumprimento do plano.

Uma das principais dúvidas é sobre se a execução do novo arcabouço está condicionada a um aumento da carga tributária. Ele afirmou que não no sentido literal, mas a ideia da reforma tributária será “colocar o pobre no orçamento e o rico no Imposto de Renda”, um dos lemas da campanha eleitoral de Lula.

Assim, quem atualmente não paga imposto, ou paga proporcionalmente pouco em relação à renda, terá de pagar. Há “setores muito favorecidos, setores muito beneficiados ou que sequer foram regulamentados”, disse o ministro. Esses setores gozam de “benefícios indevidos e fraudes”, continuou. O governo quer “fechar ralos do patrimonialismo brasileiro”. “É um caso mundial, de acabar com os abusos que as grandes empresas cometem aos Estados nacionais que deram origem a elas.”

Leia um resumo do plano econômico anunciado por Haddad:

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