Levantamento

Nos anos Bolsonaro, 169 defensores de direitos humanos foram assassinados

Gestão anterior atacou direitos constitucionais e elegeu indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais e sem-terra como inimigos

Valter Campanato/Agência Brasil
Valter Campanato/Agência Brasil
Defensores dos direitos humanos ligados à causa indígena foram alvo em 346 casos, sendo 50 assassinatos

São Paulo – Entre 2019 e 2022, 169 defensores de direitos humanos foram assassinados no Brasil. Em média, foram três assassinatos por mês durante o governo Bolsonaro. É o que revela o estudo Na Linha de Frente: violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil, divulgado nesta quarta-feira (14). Ao todo, o levantamento das organizações Terra de Direitos e Justiça Global identificou 1.171 casos de violência nesse período.

Com 49,4%, as ameaças representam quase metade dos casos registrados. Assim, a violência contra os defensores incluem desde atentados (16,8%) e agressões (4,4%) até casos de importunação sexual (0,2%) e suicídio (0,2%).

Desse modo, 78,5% de todas as ocorrências tiveram como alvo pessoas que atuavam na luta pela terra, pelo território e pelo meio ambiente. Em 4,8%, as vítimas eram ativistas dos direitos LGBTQI+. Em 3,7%, a violência foi endereçada contra defensores da moradia e do direito à cidade.

Assim, dos 169 assassinatos 140 foram de defensores que atuavam em prol dessas causas. A maior parte dos assassinatos (63%) foi vitima de um ou mais disparos por arma de fogo. As violações de direitos humanos se concentraram no Norte e no Nordeste e atingiram principalmente indígenas e negros.

Sucateamento e perseguição

“A eleição de Jair Bolsonaro (PL) resultou em um período de extrema deterioração e sucateamento das estruturas governamentais de garantias de direitos e acentuou um ambiente hostil, de violência e ódio voltados especialmente contra grupos historicamente marginalizados”, aponta o relatório. Além disso, os pesquisadores afirmam que a gestão anterior contribuiu para o fortalecimento de “grupos de extrema direita alinhados ao fascismo”.

Na avaliação do coordenador executivo da Terra de Direitos, Darci Frigo, os dados são reflexo de um período em que atacar defensoras e defensores de direitos humanos era política de governo. “O governo de Jair Bolsonaro elegeu, indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais e sem-terra como inimigos centrais da sua estratégia de governo. Tudo isso com ataques diretos aos seus direitos constitucionalmente assegurados”, destaca.

“Ao mesmo tempo, (o governo Bolsonaro) realizou um desmonte das políticas públicas de demarcação de terras indígenas, foi conivente com o desmatamento e invasão das terras indígenas por grileiros e fazendeiros, apoiou o armamento e a mineração. E toda essa situação se manteve impune ao longo desses quatro anos de governo”.

Tortura e política anti-indígena: caso Bruno e Dom

Em 11 dos assassinatos, há referência a sinais de tortura encontrados no corpo da ou do defensor morto. No caso do assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, no Vale do Javari (AM), em junho de 2022, ambos foram emboscados e mortos quando viajavam de barco pela região. Segundo as investigações, eles foram assassinados a tiros, queimados e enterrados. Eles apontam a atuação do indigenista no combate à pesca ilegal no território indígena como a motivação para o crime.

Os dados do levantamento destacam que defensores indígenas foram alvos de grande parte dos ataques contra defensores de direitos humanos. Eles foram alvo em 346 casos, sendo 50 assassinatos e 172 ameaças. Assim, o levantamento relaciona o aumento da violência à política anti-indígena do governo federal, que estimulou a invasão e exploração dos territórios tradicionais pelo garimpo, desmatamento e agronegócio.

Proteção

O levantamento foi feito com base em notícias, na consulta a outros relatórios e pesquisas internas de casos acompanhados pelas organizações e por redes que que as integram. Os casos foram organizados e categorizados por dados de informações demográficas do defensor, gênero, raça, o local onde foi registrada a violência, o tipo de violência, contexto da ação, agente violador e denúncias realizadas, entre outras.

Assim, para a socióloga e coordenadora de projetos da Justiça Global, Sandra Carvalho, os dados reforçam a necessidade de priorizar o Plano Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH). “É urgente que o governo do presidente Lula assuma os compromissos acordados durante o governo de transição priorizando o PPDDH. E se comprometa a não medir esforços para fortalecer o programa com orçamento adequado, paridade entre estado e sociedade civil em seu Conselho Deliberativo. Além de uma nova propositura legislativa que institua o marco legal da política pública de proteção”, afirmou.


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