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Fim do governo Bolsonaro faz disparar registro de armas por CACs: 2 mil por dia

De setembro a novembro, os registros mais que dobraram em relação ao período de janeiro a agosto. Desvantagem de Bolsonaro nas pesquisas explica início do reforço dos arsenais particulares, que Lula terá de controlar

Tânia Rêgo/ABr
Tânia Rêgo/ABr
Bolsonaro fez a festa da indústria de armamentos e levou as armas até para dentro de igrejas

São Paulo – Com a proximidade do fim do governo de Jair Bolsonaro e das facilidades para o acesso às armas, dispara a busca pelo registro. De setembro a novembro, mais de 2 mil armas foram registradas diariamente, em média, pelos CACs, sigla para “caçadores, atiradores e colecionadores”. Um índice que mais que dobrou em relação ao período de janeiro a agosto, período em que a média era inferior a 870 registros diários.

Entre esses CACs, estão empresários financiadores de atos golpistas e seus participantes. É o caso de Milton Baldin, de Mato Grosso, preso pela Polícia Federal na última terça-feira (6). Ao pedir que empresários do agronegócio liberassem caminhoneiros por duas semanas para engrossar os protestos, conclamou “atiradores”. “São só 15 dias, não vai fazer diferença. E também queria pedir aos CACs que têm armas legais. Hoje nós somos, inclusive eu, 900 mil atiradores. Venham aqui mostrar presença”, disse.

Segundo reportagem do portal UOL, dados do Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma) fornecidos por meio da Lei de Acesso a Informação mostram que nesse último período foram pelo menos 184 mil registros. Isso significa uma média mensal de 61,4 mil novas armas. Mais que o dobro da média mensal até agosto, que era de 26 mil. Com escalada nos registros, o total de armas registradas chegou a 391,3 mil de janeiro até novembro.

Desvantagem de Bolsonaro acendeu alerta para CACs

Os números levam em conta a expedição de certificados de registro de arma de fogo (CRAFs) por CAC. Mas o sistema não permite diferenciar o registro de arma nova ou renovação de registro de alguma já existente. Um CAC pode transferir uma arma entre acervos e dar a ela novo número de registro. No total, o Exército informou que existiam 1.731.295 armas de fogo registradas no Sigma até agosto.

O período marcado pela corrida aos registros de armas coincide com a reta final da campanha eleitoral pela disputa à Presidência da República. Bandeira antiga de Bolsonaro, a facilitação do acesso às armas tornou-se realidade com os mais de 40 decretos baixados em seu governo. Mas Bolsonaro aparecia em desvantagem nas pesquisas.

E Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em vantagem, sempre foi contrário à política de armar a população desde a campanha. E o combate à violência no Brasil, com armas em todos os espaços, até em igrejas, com o gatilho inclusive no dedo de crianças, está no alvo no grupo temático da transição.

Lula vai revogar decretos de Bolsonaro pró-armas

O senador eleito Flávio Dino (PSB-MA), líder do grupo técnico de segurança na equipe de transição, já afirmou que o novo governo vai revogar os mais de 40 atos e decretos do presidente Bolsonaro que facilitam o acesso às armas pela população. Disse também que as medidas terão impacto sobre aqueles que já compraram armas de grosso calibre, que teriam sido adquiridas a partir da liberação prevista em decretos de Bolsonaro. Segundo Dino, que é cotado para ministro da Justiça, o objetivo de Lula é fazer valer o que já estava previsto no estatuto do desarmamento de 2003.

“Nós temos uma lei vigente, o estatuto do desarmamento, que foi objeto de um desmonte por atos infralegais, abaixo da lei. Isso sem dúvidas é um tema fundamental do grupo de trabalho. É um tema que o presidente Lula escolheu e que a sociedade brasileira aprovou”, disse, em meados de novembro.

Lula terá de controlar arsenais autorizados por Bolsonaro

Antes de Bolsonaro, a compra de armas por atiradores variava conforme sua atuação em competições. Havia também limites para compras anuais: 12 armas, 6 mil munições e 2 quilos de pólvora.

A partir de suas políticas, um atirador pode ter até 60 armas, das quais 30 delas de uso restrito das forças de segurança. Para cada uma, pode comprar até mil munições por ano. E se houver autorização do Exército, essas quantidades todas podem ser multiplicadas por cinco. Outra coisa: a validade do registro aumentou de cinco para dez anos. Bolsonaro permitiu tambem o porte de uma arma carregada nas ruas .

“Você tem essa regra que, em tese, era para quem está interessado em tiro esportivo e em caça, mas, na prática, virou um caminho mais fácil para todo mundo que quer andar armado. Isso explica o motivo de CAC passar de uma categoria desconhecida para uma categoria que hoje tem mais de um milhão de armas e 800 mil pessoas registradas no Exército, com controle muito frágil”, disse ao UOL o gerente do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani.

Pesquisa mostra adesão ao bolsonarismo em perfil de CACs

Pesquisa da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf) traçou um perfil do CAC no Brasil: “Masculino, branco, conservador, adesão ao bolsonarismo muito grande, que se intensificou depois, se tornando um mito, e um grupo com renda alta, que começa a baixar. Somente 2% do público é negro”, relatou ao UOL o policial federal Roberto Uchôa, autor do livro Armas para quem?

Para ele, o caminho para reverter a situação é mudar o controle e a fiscalização. “Precisamos acabar com essa confusão do controle híbrido. Não tem como ter uma instituição civil, como a Polícia Federal, fazendo o controle de um determinado setor e as Forças Armadas terem controle de outro setor e não se comunicarem”, disse.

Redação: Cida de Oliveira


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