Luta e resistência 

ATL 2023: maior mobilização indígena do Brasil reivindica futuro a partir da demarcação de terras 

Com o tema “O futuro indígena é hoje. Sem demarcação não há democracia!”, a 19ª edição do Acampamento Terra Livre teve início nesta segunda, em Brasília. Mais de 6 mil indígenas são esperados para a mobilização 

Agência Brasil
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Programação do ATL 2023 conta com mais de 30 atividades divididas em cinco eixos temáticos: Diga o povo que avance, Aldear a Política, Demarcação Já, Emergência Indígena e Avançaremos

São Paulo – A maior mobilização indígena do Brasil, o Acampamento Terra Livre (ATL), deu início nesta segunda-feira (24) à 19ª edição. Desde ontem, delegações de povos tradicionais de todo o país desembarcam em Brasília para participar o evento que terá como tema “O futuro indígena é hoje. Sem demarcação, não há democracia!”. A expectativa é reunir mais de 6 mil pessoas, falantes de 274 línguas, no acampamento, que será montado na Praça da Cidadania, na capital federal. 

A mensagem deste ano reforça a importância da demarcação de terras indígenas no país, que ficou paralisada durante os quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL). O ATL 2023 também pede o fim das violências e apresenta o tema da “Emergência Climática” para enfrentar o racismo ambiental e as violações de direitos que vêm sendo causadas pelas mudanças no clima. 

“Neste ano, trazemos como principal pauta a retomada do processo de demarcação das terras indígenas. Sem esquecer de todo o cenário de violência que nós vivenciamos nos últimos anos. Então vamos trazer o debate acerca do desmonte que houve na política indigenista, das violências, mas também com um olhar para o futuro. Queremos não só falar do passado, mas também propor o futuro, e o futuro está justamente nas demarcações das terras indígenas”, destacou o coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas (Apib), Dinamam Tuxá, em entrevista ao Brasil de Fato

Marcha e outras atividades

A Apib é responsável pelo ATL, construído em conjunto com outras sete organizações regionais de base. A programação conta com mais de 30 atividades divididas em cinco eixos temáticos. São eles: Diga o povo que avance, Aldear a Política, Demarcação Já, Emergência Indígena e Avançaremos. Os eixos contam com plenárias sobre mulheres indígenas, parentes LGBT+, gestão territorial e ambiental de terras indígenas, acesso a políticas públicas e povos indígenas em isolamento voluntário. 

De acordo com a organização, o movimento indígena também irá promover três marchas pelas ruas de Brasília. A primeira delas, já nesta segunda, a partir das 14h, em frente ao Congresso Nacional, onde os manifestantes reivindicarão a derrubada dos projetos de leis anti-indígenas. Entre eles, o PL 191/2020, de autoria do ex-presidente Bolsonaro, que permite a mineração em terras ancestrais dos povos indígenas. Assim como o chamado “PL da Grilagem”, que regulariza a ocupação ilegal de terras públicas no país. 

Para as entidades, essas iniciativas “tornam os indígenas os alvos mais frequentes da violência no campo. Ao longo do ano passado, segundo relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), recém divulgado, os povos originários representaram 38% das pessoas assassinadas. O ATL 2023 segue até sexta (28), com outras duas marchas, na quarta e quinta, sob os motes “Povos Indígenas decretam emergência climática” e em defesa da democracia. 

Programação

A programação do ATL 2023 também contará com o lançamento de livros e relatórios, plenárias e noites culturais. As consequência do Marco Temporal – tese jurídica que discute se a data de promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988, deve ser adotada para a definição da ocupação tradicional da terra por indígenas – também será central no ATL deste ano. Defendida por ruralistas, a medida é contestada pelos indígenas que apontam sua inconstitucionalidade. 

Segundo eles, muitos grupos foram retirados de seus territórios sem o reocupar até a data da Constituição. E, com o marco temporal, eles podem perder o direito à sua terra tradicional. O tema será debatida em plenária na quinta. Um dia antes, lideranças também se reunirão em uma vigília em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde a tese é analisada desde 2021, para reivindicar a declaração da sua inconstitucionalidade. 

Demarcação e marco temporal

O Marco Temporal volta a ser julgado no dia 7 de junho, como anunciado na última semana pela presidenta do STF, ministra Rosa Weber. Os indígenas também estão ansiosos para que a política de demarcação das TIs “volte a funcionar”, conforme ressaltou Dinanam. Ao todo, 13 territórios estão com o processo em andamento, com a homologação a ser feita e aguardam aval do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

“De fato, houve a expectativa de que, nos primeiros 100 dias, a demarcação ocorresse, porque foi uma promessa de campanha. Houve certa comoção entre os povos indígenas e as consequências disso, evidentemente, é que estamos ansiosos para que a política volte a funcionar. Para que de fato as demarcações aconteçam”, explicou o líder indígena. O governo federal, por meio do Ministério dos Povos Indígenas, vem dialogando com os movimentos originários.

Em paralelo, eles também afirmam que consideram a gestão de Lula aliada e que vão cumprir seu papel de “controle social”. “Cobrando quando for necessário, de forma responsável e justa. Não estamos pedindo nada extra ou fora da lei. Queremos que o governo cumpra o que está dentro da lei, e nós vamos manter essa parceria e diálogo”, acrescentou o coordenador da Apib. 

Sobre o ATL 

O primeiro Acampamento Terra Livre surgiu no primeiro mandato do presidente Lula, em 2003, a partir de uma ocupação realizada por povos indígenas do sul do país, na frente do Ministério da Justiça, na Esplanada dos Ministérios. A mobilização ganhou adesão de lideranças e organizações indígenas de outras regiões do país. E , dessa forma, também se consolidou a estrutura para criação e formalização da Apib, lançada em 2005. 

No ano passado, o ATL chegou a reunir em Brasília mais de 8 mil indígenas, de 100 povos e de todas as regiões do Brasil. Durante 10 dias, o evento debateu o enfrentamento da agenda anti-indígena imposta pelo ex-presidente e o fortalecimento de candidaturas indígenas para o Congresso Nacional.

O evento é construído em conjunto com a Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), pela Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul), a Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste (Arpinsudeste), a Comissão Guarani Yvyrupa, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), o Conselho do Povo Terena e a Assembléia Geral do Povo Kaiowá e Guarani (Aty Guasu).

A programação completa do ATL 2023 pode ser conferida aqui.


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