Episódio Telerj

Reintegração e violência: perdem a Oi, o prefeito e a população do Rio

Como a Oi, o PMDB fluminense e a própria cidade do Rio permitiram a voz da ganância falar mais alto que a superação da pobreza

Vladimir Platonow/Agência Brasil

Processo de desocupação teve outro dia violento hoje (14)

A reintegração de posse de um terreno da empresa de telefonia Oi, ocupado por sem-teto, contou com emprego de violência policial e com apoio do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB). A ação, um desastre anunciado para todos os envolvidos, tinha tudo para ter um final feliz, e bem diferente.

Essa história começa no dia 6 de julho de 2012, quando o prefeito Paes era candidato à reeleição e inaugurava um conjunto habitacional chamado Bairro Carioca, construído com recursos do programa federal Minha Casa, Minha Vida. O conjunto aproveitou um terreno industrial e prédios desativados de uma antiga oficina de bondes e transformadores, bem localizado, ao lado de uma estação do metrô.

Na solenidade, o prefeito assinou um protocolo de intenções com o então presidente da Oi, Francisco Valim, para adquirir outro terreno com prédios, também desativados, perto dali, para fazer outro conjunto habitacional. É justamente o terreno que acabou ocupado neste mês e resultou em violência social na desocupação.

O prefeito foi reeleito em outubro de 2012, e o protocolo ficou só nas intenções até hoje. Diz o prefeito que não houve acordo no preço que, segundo notícias, seria de R$ 20 milhões à época. Mas o prefeito poderia tomar medidas a bem do interesse público, como decretar a área de interesse social, desapropriar judicialmente e tomar outras medidas cabíveis.

Detalhe curioso: só a conta de telefonia e internet da prefeitura paga à Oi (Telemar) pela prefeitura do Rio em 2013 foi de R$ 24,5 milhões. Em 2012 foram pagos outros R$ 25 milhões.

Outro detalhe é que o terreno é vizinho da favela do Rato Molhado, e próxima à do Jacarezinho, comunidades que receberam Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em janeiro de 2013, o que valorizou imóveis na região. Paradoxalmente, o estado gastou para indiretamente valorizar o terreno desativado da Oi, o que possivelmente fez crescer o interesse da empresa em negociá-lo com o poder público por valores mais altos.

Além disso, as UPPs têm provocado aumentos no custo do aluguel nas próprias comunidades, um efeito colateral que deveria receber maior atenção da prefeitura e do governo do estado. No passado, moradores de favelas moravam lá em condições precárias justamente porque não tinham dinheiro para pagar aluguel. Hoje há um mercado de locação nas comunidades já estabelecidas, sobretudo nas de melhor localização. Desde o cidadão que constrói outro domicílio sobre sua laje, para alugar e aumentar sua renda, até pessoas que são proprietárias de vários imóveis, o que é uma deturpação na própria regularização de lotes.

Com isso, aluguéis que antes giravam em torno de R$ 230 saltaram para R$ 450, R$ 500. Resultado: as famílias de baixa renda acabam despejadas e recorrem a ocupações como estratégia de sobrevivência.

Ocupações não deveriam ser o caminho, mas para isso ser realidade, a prefeitura deveria atender ao déficit habitacional de forma mais rápida e ter políticas reguladoras do uso do solo urbano que equilibrassem o conflito existente entre as necessidades populares de superação da pobreza com o mercado imobiliário.

Se o prefeito tivesse, desde 2012, a mesma disposição para brigar na Justiça pela desapropriação do terreno da Oi, como teve para apoiar a expulsão de famílias pobres, a realidade seria outra, com benefícios para todos.

A cidade ganharia em revitalização da área, dando vida a um conjunto habitacional onde hoje há apenas prédios fechados e um terreno subutilizado. Milhares de famílias ganhariam a casa própria, reduzindo o déficit habitacional e a própria ocorrência de ocupações. E nestes quase dois anos um canteiro de obras estaria gerando mais renda com emprego de mão de obra das próprias comunidades ali.

Se a Oi tivesse um pouco mais de noção de responsabilidade social e cidadania, até por esperteza ela própria se engajaria no projeto, fazendo do limão, limonada. Mesmo que cedesse um pouco no valor do terreno, poderia ter contrapartidas na forma de propaganda institucional positiva, até mesmo associando sua marca ao nome do conjunto habitacional da mesma forma que patrocina casas de espetáculos. É esse tipo de atitude que faz a diferença entre empresas serem amadas ou odiadas.

Perdeu a Oi, ao conquistar uma enorme propaganda negativa para sua marca. É o que dá ficar a cargo da frieza burocrática do departamento jurídico um assunto que – se não uma área de responsabilidade social – seria melhor resolvido pela área de marketing. Provavelmente chegariam à conclusão de que era melhor um “mau” acordo na venda do terreno para a prefeitura, do que uma “boa” demanda na justiça, associando a marca à ganância e exclusão social.

Perdeu o prefeito e seu partido, o PMDB, ao colecionar mais um episódio de tratar problema social como caso de polícia, quando tinha tudo para dar-lhe um desfecho positivo.

E perdeu a cidade do Rio de Janeiro, que luta para revitalizar-se desde que a capital foi transferida para Brasília, e em vez de produzir fatos positivos com as oportunidades, inclusivas geradas pela Copa e Olimpíadas, consegue publicidade negativa por tratar mal sua população mais vulnerável.

É isso que ocorre quando prefeitos e governadores fazem políticas para grandes corporações em alta velocidade, enquanto políticas para erradicar a pobreza andam a passos de tartaruga.

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