Sonoridade

Samuel Carvalho e o violão muito além da música

Considerado um dos melhores ‘luthiers’ do país, Samuel Carvalho tem se mostrado incansável no desafio de tirar a melhor sonoridade na construção do instrumento

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Samuel Carvalho: como todo bom pesquisador e profissional, foi beber em muitas fontes que se tornaram suas referências

“Alguém aí tem um violão?” “Vou levar meu violão.” “Pega seu violão lá e bora fazer um som!” “Só falta um violão.” São algumas das frases presentes no cotidiano de muitos brasileiros dentro dos grupos e rodas de amigos. Sim, o violão, no decorrer da história, passou de um instrumento mal visto para o amigo inseparável dos seres humanos em sua vida social e, mais do que isso, ele se tornou a principal ferramenta de trabalho do profissional de música chamado de violonista.

Com base em pesquisas, instrumentos semelhantes ao que chamamos de violão já existem há mais ou menos cinco mil anos, mas foi no século IX na Espanha que surgiram os primeiros instrumentos mais semelhantes a uma guitarra espanhola (como muitos gostam de chamar).  Não se sabe ao certo a origem desse instrumento, mas podemos seguir duas hipóteses.

A primeira, vem com o domínio do Império Romano, quando trouxeram a cítara romana. Os romanos teriam levado esse instrumento à Península Ibérica por volta do século I, onde com o passar do tempo, esse instrumento foi sofrendo alterações até chegar na forma do violão como conhecemos. Já a segunda, é mais defendida pelos historiadores, onde o instrumento seria derivado do antigo alaúde árabe. Esse instrumento teria sido levado para a península ibérica através das invasões muçulmanas, onde se adaptou perfeitamente às atividades culturais, mas foi na própria Espanha no final do século XVIII, onde os luthiers começaram a construir o instrumento bem próximo ao que chamamos de violão.

O que sabemos hoje é que não resistimos ao belo som de um violão bem tocado, mas o que muitas vezes não percebemos é que tirar um bom som do violão não depende apenas da qualificação técnica de quem está tocando. Pois é, o aprimoramento é muito importante, mas tão importante quanto é o instrumento em que o músico está tocando. Por isso, antes do violão se transformar em ferramenta por onde o artista mostrará toda sua arte, talento e criação, ele já é uma obra de arte, pensada e construída por um artista que não está no palco, mas em seu atelier. Tudo começa com um bom luthier e, quando esse mesmo artista também é músico, tudo fica mais belo. E aqui, não posso deixar de falar daquele que é considerado um dos melhores luthiers do Brasil: Samuel Carvalho.

Samuel é um pesquisador, estudante e descobridor de sonoridades, formas e jeitos para que possamos extrair do violão, o mais belo som que ele pode nos dar, de acordo com a canção que tocamos.  Além de ter estudado no Conservatório Municipal de Guarulhos, no ano de 1989 iniciou o Bacharelado de Violão na Faculdade Mozarteum. Foi nesse período, quando ainda cursando o bacharelado que ao sentir a necessidade de um instrumento de alto nível, viu-se motivado a iniciar sua jornada inquieta na construção artesanal de violões, o que o levaria a se tornar referência para muitos do Brasil e do mundo.

Como todo bom pesquisador e profissional, foi beber em muitas fontes que se tornaram suas referências, como os violões de Sérgio Abreu, Hermann Hauser, Ignácio Fleta e, a partir desse material de estudo, pesquisa e reflexão, passou a experimentar e descobrir mais e mais possibilidades, transcendendo os próprios conceitos estudados.

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Aos poucos, foi reduzindo suas atividades como professor, músico e concentrando sua atenção nas descobertas das possibilidades de sons do instrumento, através de materiais como madeiras, cordas e claro, muita sensibilidade, paciência, disposição e amor. Samuel Carvalho não é apenas o construtor, mas o artista que consegue extrair incríveis sonoridades por meio de sua matéria-prima, compreendendo com sua indiscutível sensibilidade como fazer com que sua obra seja instrumento inseparável de todo o violonista, quase como uma extensão do corpo de cada músico.

Em tempos onde muitos (as) da população buscam armas de fogo, em tempos onde a violência e o ódio se tornam rotineiros, em tempos onde a educação está defasada, Samuel Carvalho nos mostra que uma das maiores armas para as transformações socioculturais de uma nação, está em outro meio de arte, comunicação, educação e valor: o violão.

E como diz o mestre Chico Buarque: 

“Não chore ainda não

Que eu tenho um violão

E nós vamos cantar

Felicidade aqui pode passar e ouvir

E se ela for de samba há de querer ficar”

E esse que vos escreve, termina este artigo com fé e esperança em Samuel Carvalho e todos os descendentes dessa arte da luthieria, deixando a seguinte reflexão:

“Não quero arma não

Eu quero um violão

E nós vamos vamos mudar

Nossa sociedade, contra desigualdade

Menos ódio e mais música pra transformar”

Para saber mais, acompanhe a entrevista que vai ao ar nos próximos sábado e domingo com o luthier, músico e professor Samuel Carvalho.

:: Acesse o site de Samuel Carvalho ::

Danilo Nunes é músico, ator, historiador e pesquisador de cultura popular brasileira e latino-americana. Apresentador do programa Sacada Cultural, aos sábados, às 22h, na Rádio Brasil Atual.

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