Projeto de interesse dos ruralistas pode isentar fazendas do imposto territorial
Autor argumenta que isenção seria para compensar prejuízos com “roubos e invasões”. O ITR foi criado para desestimular a manutenção de áreas improdutivas. O governo arrecada tão pouco que é menos que o IPTU pago em quatro bairros paulistanos
Publicado 29/01/2024 - 17h14
São Paulo – Projeto de lei em análise na Câmara dos Deputados pode deixar fazendas livres da cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR). De autoria do deputado bolsonarista Marcos Pollon (PL-MS), o PL 2.587/2023 defende zerar a tributação para a propriedade rural que for alvo de crime de roubo ou de esbulho possessório (invasão).
“O benefício fiscal (aos fazendeiros) pode ser entendido como um incentivo para o Estado agir de forma mais eficaz na proteção do campo e na prevenção de crimes contra a propriedade, aumentando os investimentos em segurança pública, infraestrutura e políticas de desenvolvimento rural, os quais contribuem para a criação de empregos e oportunidades no campo”, argumenta o deputado federal na justificativa de sua proposta.
No entanto, a julgar pelo argumento, o deputado bolsonarista demonstra desconhecer os objetivos do ITR, um tributo federal instituído em 1891, a exemplo da politica de land and value tax (imposto sobre terra e valor) do Reino Unido, para desestimular a manutenção de propriedades improdutivas apenas para especulação financeira. Cobrado anualmente das propriedades rurais conforme a Lei Federal 9.393, de 19 de dezembro de 1996, visa estimular a produtividade das áreas rurais. Suas alíquotas são maiores para propriedades com maior extensão e baixo grau de utilização. Ou seja, quanto mais produtiva, menor o imposto a ser pago.
E nesse mesmo sentido, a Lei 8.629, de 1993, e a Constituição determinam que a pouca ou nenhuma exploração econômica são indicadores de que o imóvel rural não está cumprindo com sua função social. Nesses casos, está passível de desapropriação. E também de ocupações como as do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que tem nas ocupações dessas propriedades improdutivas um instrumento politico para pressionar o Estado a cumprir os mandamentos legislativos. E com isso promover a reforma agrária.
Benefício fiscal
Para justificar o projeto, o deputado Marcos Pollon apela para os “prejuízos” que as invasões trazem aos proprietários, que enfrentam “danos financeiros e emocionais”. “A medida ora proposta pode contribuir para aliviar o peso financeiro que esses proprietários suportam, visto que eles não terão que arcar com o custo de pagar o imposto sobre suas propriedades rurais ao mesmo tempo em que arcam com os custos de reparo e reconstrução dos danos causados pela invasão ou pelo roubo”, diz o bolsonarista, que é também fundador do movimento ProArmas Brasil.
Dados da Receita Federal mostram, contudo, que o benefício já existe, na medida em que apenas uma minoria de imóveis rurais recolhem o ITR devido. Um levantamento divulgado no ano passado pelo Brasil de Fato revelou que o Brasil arrecada em imposto de terrenos rurais menos do que a subprefeitura de Pinheiros arrecada com o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).
Arrecadação de ITR já é baixa
Ao longo de 2022, somente a subprefeitura, que abarca quatro bairros da região oeste da capital paulista (Alto de Pinheiros, Pinheiros, Jardim Paulista e Itaim Bibi), arrecadou R$ 2,8 bilhões em IPTU. Enquanto todas as propriedades rurais, de todo o país, pagaram apenas R$ 2,7 bilhões em Imposto Territorial Rural no mesmo período. A distorção fica maior considerando que o Brasil é o quinto país do mundo e com um setor agrícola entre os mais produtivos.
Desde 1995, o ITR nunca representou mais do que 0,3% do total da arrecadação no país, de acordo com a reportagem. Atualmente, a arrecadação no ITR está no patamar de 0,13% de tudo que é arrecadado pela Receita. A título de comparação, a Contribuição Social Sobre Lucro Líquido (CSLL) cobrada de empresas representa 7,9% da arrecadação da Receita Federal.
Leia também: