Nome escolhido para relatar denúncia contra Temer provoca atrito no PSDB
Líder tucano na Câmara disse aos colegas de sigla que se sentiu traído, com articulação feita entre alguns caciques e o Planalto, que o deixou de fora. Para oposicionistas, manobra para blindar o presidente é clara e “espúria”
Publicado 29/09/2017 - 11h32
Brasília – Além do desgaste interno do PSDB com a questão que envolve o senador Aécio Neves (MG), a bancada tucana da Câmara apresentou novo racha, na quinta (28) , depois do anúncio de que o relator escolhido para a denúncia contra o presidente Michel Temer é o deputado Bonifácio de Andrada (MG), pertencente à legenda.
O líder do PSDB na Casa, Ricardo Trípoli (SP), tinha afirmado que o partido não queria pegar a relatoria e iria analisar o caso com seu departamento jurídico para, a partir daí se posicionar oficialmente – podendo se manifestar no sentido de liberar os integrantes para votar da forma como quisessem.
O gesto iria repetir a orientação dada pela sigla na votação da primeira denúncia e estava sendo visto como um aceno para o partido reduzir os desgastes entre os parlamentares que são contrários e favoráveis a Temer. Mas com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação a Aécio e a interferência do Planalto para livrar o senador, pedindo como moeda de troca aos tucanos maior apoio na votação da denúncia contra Temer, o jogo mudou.
Em reservado, Trípoli disse aos principais caciques da legenda que se sentiu traído, devido ao pedido feito anteriormente aos colegas. E afirmou que houve uma articulação em separado, por alguns parlamentares do PSDB com o restante da base do governo que não passou por ele. “Traíram um acordo”, reclamou, diante do acerto prévio feito entre a bancada de que ninguém, mesmo que fosse convidado, aceitaria a relatoria.
A primeira iniciativa do líder do partido na Câmara foi de tentar retirar o deputado Bonifácio de Andrada da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Com a retirada, que é prerrogativa do líder partidário, Andrada ficaria de imediato fora do caso. Trípoli, porém, foi convencido de que o gesto poderia provocar um confronto ainda maior, por isso recuou.
Mudanças na negociação
Depois, preocupados com a situação e o clima tenso, deputados e senadores tucanos tentaram convencer o próprio Bonifácio de Andrada a desistir da relatoria, mas não obtiveram êxito. O entendimento de todos é de que a escolha alterou o encaminhamento da negociação que vinha sendo feita entre PSDB e o Planalto. O ideal, segundo contou um deputado deste grupo, teria sido convencer a bancada a apoiar o presidente, lembrando as ajudas em relação a Aécio, sem o desgaste de ter um tucano diretamente na relatoria.
Considerado amigo pessoal de Temer e de Aécio Neves, constitucionalista, e um parlamentar mais engajado com a direita do que com o centro, Andrada votou pela rejeição da primeira denúncia contra o presidente e já deixou claro seu posicionamento. Não há dúvidas entre os colegas de que o seu parecer será favorável à blindagem de Temer.
Ele já deu declarações, antes de ser indicado relator, no sentido de que não considera um problema o fato de o presidente ter se encontrado, sem registro oficial, com o empresário Joesley Batista no porão do Palácio do Jaburu. E sustenta desde o início que “Temer foi gravado de forma imoral”.
Andrada também é favorável a que a delação premiada negociada pelo Ministério Público com Joesley tenha todas as denúncias que provocou anuladas. Argumenta que as provas, a seu ver, “foram falhas desde o início”.
Silêncio e bastidores
Entre os tucanos, apenas a reclamação de Trípoli, que evitou falar mais do que o oficial, foi externada. O ambiente é de silêncio e conversas de bastidores até a reunião da bancada, na próxima terça-feira (2). Para aliados do governo, a escolha foi técnica e acertada, enquanto os oposicionistas destacaram o que consideraram manobra.
“Está claro o jogo de cartas marcadas. Bonifácio de Andrada vai livrar Temer e o Planalto vai ajudar o Senado a livrar Aécio”, disse o deputado Chico Alencar (PSol-RJ). “Estamos vendo de novo o esquema de manipulações e manobras espúrias nesta Casa, mas vamos trabalhar firme para que a denúncia seja acolhida”, destacou Alessandro Molon (Rede-RJ).
A princípio, o parecer do relator, após a fase de apresentação da defesa do presidente e dos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) tem previsão de ser votado em 25 de outubro, na CCJ.
O governo tem pressa, mas os oposicionistas pretendem esquentar o debate sobre a matéria a partir da próxima semana e obstruir várias votações – o que pode atrasar este rito. Para que a denúncia seja aceita e retorne ao STF, são necessários os votos de 342 deputados (um terço da Câmara, composta por um total de 513 deputados).