Capitalismo avassalador

Ozempic poderia custar menos de US$ 5, revela estudo de pesquisadores de Londres

Medicamento desenvolvido para diabetes e que tem sido usado para emagrecimento com risco de efeitos colaterais, com preço de R$ 1,1 mil no Brasil, poderia ter seu custo reduzido e deixar de alimentar os lucros fabulosos da fabricante dinamarquesa

CC 4.0 HualinXMN
CC 4.0 HualinXMN
Aposta dos famosos para perder peso, as canetas injetáveis só deveriam ser aplicadas com indicação médica e em tratamentos específicos

São Paulo – O medicamento Ozempic, recentemente viralizado como a aposta de famosos para perder peso, e que chega a ser comercializado por US$ 1 mil nos Estados Unidos, poderia ser fabricado por menos de US$ 5 por mês. É o que revela um estudo produzido por cientistas da Universidade de Yale, nos EUA, do Hospital King’s College de Londres, no Reino Unido, e da organização Médicos Sem Fronteiras.

De acordo com a pesquisa, o custo de produção fica em torno de US$ 0,89 a, no máximo, US$ 4,73 por mês, já levando em consideração uma margem de lucro “justa”. O processo mais caro da produção da droga, detalham os pesquisadores, está relacionado à caneta injetora, sob o preço de US$ 2,83. Mesmo o princípio ativo da droga, que tem alto valor por quilo e chega a US$ 70 mil, é atenuado na produção de Ozempic que exige uma quantidade mínima por dose.

No entanto, nas farmácias estadunidenses, uma dose mensal do remédio chega a custar US$ 1 mil, sem descontos. Já no Brasil, o Ozempic pode ser encontrado por cerca de R$ 1,1 mil. O que segundo a economista de Yale Melissa Barber, uma das co-autoras do estudo, indica que a fabricante tem obtido uma “margem de lucro imensa” com o produto. “Deveria haver uma conversa na política sobre qual é um preço justo”, defendeu a pesquisadora em entrevista à Bloomberg.

Ozempic e a pressão estética

Dentro desse movimento, a fabricante Novo Nordisk conseguiu duplicar o valor de suas ações nos últimos dois anos. E se tornou a empresa mais valorizada da Europa, ultrapassando a Nestlé e a controladora da marca de luxo Louis Vuitton. O estudo observa que o valor da companhia, de US$ 431 bilhões, é inclusive superior ao PIB de muitos países, como a Dinamarca, onde a marca foi fundada, que arrecada US$ 395 bilhões.

Apesar de não abrir seus custos, os investimentos em pesquisa da Novo Nordisk chegaram a US$ 5 bilhões em 2023 e o lucro líquido marcou US$ 3,18 bilhões no terceiro trimestre. O que representa uma alta de 56%.

O Ozempic foi desenvolvido para o tratamento diabetes tipo 2, mas posteriormente acabou sendo também indicado para a obesidade, o que acabou popularizando-o como um remédio que leva à perda de peso. A imagem emagrecida de celebridades tem tido um papel importante nesse tipo de uso off label – fora da indicação inicial. Essas canetas injetáveis, porém, só deveriam ser aplicadas com indicação médica e em tratamentos específicos. O uso do medicamento sem prescrição causa riscos à saúde.

‘Cabeça de Ozempic’

Entre os efeitos colaterais previstos estão náuseas, vômitos, constipação ou diarreia, cefaleia e sensação de fraqueza. Além disso, o medicamento também pode apresentar, em casos mais graves, inflamação do pâncreas, retinopatia diabética e reações alérgicas. Nesta semana, por exemplo, também viralizou nas redes sociais o termo “cabeça de Ozempic”, associado por internautas aos casos em que a cabeça de uma pessoa, que faz uso da substância para obter saciedade, ficaria desproporcional ao restante do corpo como consequência do emagrecimento.

A droga que também promete a perda de até 17% da massa corporal em um ano vem sendo ligada ainda à perda de massa nos glúteos. Além do rosto e das nádegas, há ainda o “dedo de Ozempic”. Usuários do medicamento apontam que suas mãos e pulsos têm ficado mais magros. A mudança levada pelo Ozempic tem causado preocupação contudo.

“A volta desse corpo anos 2000 à base de Ozempic e privação de comida eu não aceito. Fui anoréxica e viciada em remédio a vida inteira por causa desse padrão. Até me curar foi uma luta. Pressão estética não é sobre beleza, é sobre controle de corpos. Nunca vai estar bom. Se cuidem”, compartilhou a escritora Clara Averbuck na rede social X. “Se na minha época já era ruim para as meninas, hoje, com redes sociais e influencers irresponsáveis, está muito pior. O mundo já é ruim o suficiente para as mulheres e para as meninas terem que lidar com MAIS ISSO. CHEGA que desespero”, cobrou.

Estudos sobre o uso de Ozempic também sugerem que, ao interromper as injeções, o paciente recupera até dois terços do peso perdido em apenas um ano.

Leia também: