Democracia

Comício da Central: o Brasil tentou se modernizar fazendo reformas, mas foi empurrado para trás

João Goulart anunciou uma série de políticas para tirar o país do atraso socioeconômico. Teve como resposta o golpe que o derrubou menos de 20 dias depois

Reprodução/Montagem RBA
Reprodução/Montagem RBA
Jango (com Maria Thereza) anuncia reformas de base: oposição tramava golpe contra imaginária 'ameaça comunista'

São Paulo – Nesta quarta-feira (13), a partir das 16h, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) vai relembrar os 60 anos do comício da Central do Brasil. Momento decisivo da política brasileira, quando o presidente João Goulart anunciou as chamadas reformas de base (agrária, educacional, eleitoral, tributária, entre outras), para tirar o país do atraso socioeconômico. E teve como resposta o golpe empresarial-militar que o derrubou, menos de 20 dias depois.

Segundo os organizadores, estarão presentes à sede da ABI, na região central do Rio de Janeiro, a viúva de Jango, Maria Thereza Goulart, a filha (Denize) e netas, além de Clodsmidt Riani Filho, cujo pai foi organizador do comício e líder do Comando Geral do Trabalho (CGT). Também são esperados representantes de movimentos sociais e organizações de direitos humanos, além de ativistas por justiça, memória e reparação. O cantor Gabriel do Vale, neto de João do Vale, fará uma apresentação.

Ecos de 1964

O ato de hoje se insere em uma série de eventos programados para refletir sobre o golpe de 1964 e seu reflexos sobre a democracia. Antes da manifestação, o Rio Memórias inaugura a exposição de fotos Rio 64 – a capital do golpe, que ficará em cartaz até 13 de abril. Simultaneamente, será lançada a versão virtual (www.riomemorias.com.br).

Leia aqui o discurso de João Goulart no comício, na região central do Rio. Foi um evento tenso, com suspeita de atentado, em um país que tentava sair de um atraso histórico, mas era pressionado por forças conservadoras que – como até hoje – bradavam com uma suposta “ameaça comunista”. As estimativas de público variam de 150 mil a 300 mil pessoas.

No fio da navalha

“No comício da Central do Brasil, Jango deu o passo que faltava para um governo progressista: abraçou as reformas de base, entre as quais a reforma agrária. Ali ele se comprometeu com os mais pobres e foi condenado pelos mais ricos”, sintetiza o professor e escritor Juremir Machado da Silva, em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos (IHU). “Jango equilibrou-se no fio da navalha durante meses, até que escolheu dar o grande salto.” Segundo ele, o Brasil “era puro atraso” em 1964.

“Pouco mais de 32 mil famílias dominavam mais de 50% da terra agricultável. Havia um déficit de moradias, o analfabetismo tocava as nuvens, precisava reforma de todo tipo: administrativa, educacional, bancária, agrária. O regime, porém, estava bom para os que se alimentavam dele”, afirma o pesquisador. “Reformar era enfrentar o parasitismo dos muitos ricos, desmontar o patriarcalismo e o clientelismo disseminados pelo país. O golpe foi dado para manter as oligarquias satisfeitas. Se as reformas tivessem acontecido naquela época, o Brasil teria evitado décadas de atraso.”