Visibilidade

Reitoria da UFABC pode ter primeira mulher trans a ocupar cargo de vice no país

A professora Ana Lígia Scott e a sua trajetória na vida acadêmica e científica são vistas como símbolo de representatividade e inclusão para a parcela da população trans que enfrenta preconceitos e dificuldades para garantir direitos

Arquivo pessoal
Arquivo pessoal
"A presença de uma mulher trans concorrendo à vice-reitoria de uma universidade vitrine como a UFABC tem um significado muito grande na luta da comunidade LGBTQIA+", destaca a candidata Ana Lígia Scott

São Paulo – A próxima gestão na Reitoria da Universidade Federal do ABC (UFABC) pode ter a primeira mulher trans do país a ocupar o cargo de vice-reitora em uma instituição de ensino superior no país. A professora Ana Lígia Scott e a sua trajetória na vida acadêmica e científica são vistas como símbolo de representatividade e inclusão para a parcela da população transgênera que enfrenta preconceitos e dificuldades para garantir direitos à saúde, ao trabalho e à educação.

Nessa última área, por exemplo, de acordo com estudo de 2019 da Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), cerca de 82% das pessoas trans sofrem com a evasão escolar. Esses números refletem a segregação social que prejudica, principalmente, travestis e transexuais. Contudo, a eleição de Ana Lígia Scott, pode ser uma oportunidade de dar visibilidade. E desse modo legitimar a luta por diretos dessa população, como ela própria destaca. Doutora em Biofísica Molecular, cientista e com dois Pós-Doutorados no exterior, Ana Lígia concorre pela chapa 2 UFABC de Todes para Todes. O pleito patra a reitoria da UFABC está previsto para ocorrer em março.

“A presença de uma mulher trans concorrendo à vice-reitoria de uma universidade vitrine como a UFABC tem um significado muito grande na luta da comunidade LGBTQIA+. A invisibilidade das pessoas transgêneras no meio acadêmico e científico ainda é gritante e precisa ser combatida. Além disso, traz junto um combate ao conservadorismo intrínseco à nossa sociedade. Pois mostra que as pessoas trans têm as mesmas competências e habilidades que uma pessoa cis”, garante a cientista. 

Quebra de paradigmas

Presidenta da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), Symmy Larrat, explica que ter pessoas trans em lugares que antes não eram acessíveis é uma maneira também da população transgênera entender que pode estar onde quiser. Symmy afirma que as relações estão se transformando, paradigmas estão sendo quebrados e pessoas cisgêneros – que se identificam com o gênero atribuído ao sexo biológico – se sentem representadas por pessoas transgêneros

“A visibilidade é importante, colocar pessoas trans naturaliza relações e acaba com paradigmas. Tem a questão da representatividade da população trans se ver em um lugar de importante responsabilidade e sentir que ela pode fazer parte desse processo. Mas temos também uma mudança de relação na sociedade em que pessoas cisgêneras se sentem também representadas por pessoas transgêneras. Porque quando chegamos nesse lugar, não é para ocupar e vivenciar somente a transgeneridade e as nossas pautas. A gente quer mostrar que somos capazes e que conseguimos representar qualquer outra pessoa sobre qualquer outro assunto”, observa Symmy Larrat.

Reação progressista 

Para a professora Ana Ligia, a única forma de mudar o atual quadro de segregação da população trans e garantir cidadania é via políticas públicas. Portanto, a mudança começa pelos votos nas urnas.

“Ainda somos uma sociedade extremamente conservadora, machista e preconceituosa. Infelizmente, nos últimos três anos, movimentos extremistas conservadores ganharam mais força no cenário brasileiro. Por outro lado, a lei da física nos diz que para toda ação há uma reação da mesma intensidade no sentido contrário. Eu acredito que essa reação já iniciou e as eleições gerais podem ajudar a combater esse conservadorismo. O ambiente político é vitrine desse conservadorismo, dominado por pessoas brancas, cis e héteros. Porém, tenho esperança de que, nas próximas eleições, a presença de corpos trans, mulheres, negros, ocupando posições no cenário político brasileiro, continue aumentando. E assim possamos no futuro ter um ambiente político mais plural e diverso”. 

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