Combate à desigualdade

Qual reforma tributária é preciso fazer no Brasil? Economista explica

Eduardo Fagnani (PUC-SP) critica a alta carga tributária que incide sobre o consumo, prejudicando os mais pobres. Ao mesmo tempo, ricos pagam pouco imposto de renda e têm lucros e dividendos isentos

Agência Brasil
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Além de corrigir desigualdades, reforma tributária justa e solidária contribuiria para a criação de empregos formais

São Paulo – Um dos grandes desafios do futuro governo Lula será realizar uma reforma tributária justa, que alivie para os mais pobres e cobre mais dos mais ricos. Atualmente, cerca de metade dos impostos arrecadados no Brasil vem do consumo. Nesse modelo, a conta pesa mais no bolso dos trabalhadores. De acordo com o professor Eduardo Fagnani, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o atual sistema tributário no Brasil contribui para o aumento das desigualdades e vai na contramão do que ocorre em países liberais mais avançados.

Na comparação com os Estados Unidos, por exemplo, o sistema tributário brasileiro funciona de maneira praticamente invertida. “Só para ter uma ideia, nos Estados Unidos, de tudo que é arrecadado, cerca de 50% vem da tributação sobre a renda e a riqueza (patrimônio) No Brasil é 20%. Lá, de tudo que é tributado, só 17% vem do consumo. Aqui é 50%.”

Fagnani explica o impacto da concentração dos impostos sobre o consumo no bolso do trabalhador mais pobre. “Vamos pensar uma geladeira que tenha R$ 300 reais de imposto. Para uma pessoa que ganha R$ 1 mil, esse valor representa 30% da renda. Por outro lado, para uma pessoa que ganha 10 mil reais, esses mesmos R$ 300 vão representar 3% da renda dela”, explica Fagnani ao repórter Jô Miyagui, para o Seu Jornal, da TVT.

O economista também destaca o peso da carga tributária na folha de pagamento das empresas. Estas, por sua vez, acabam repassando aos consumidores os custos com os impostos. Mais uma vez, é o trabalhador que ganha menos o principal prejudicado, tendo que contribuir com uma fatia desproporcional na arrecadação. Uma melhor distribuição desses impostos deve, inclusive, estimular a criação de mais empregos formais no país, afirma o economista.

Ricos no Imposto de Renda

Outra grave distorção na estrutura tributária brasileira, segundo Fagnani, é que os super-ricos praticamente pagam muito pouco ou nenhum imposto. Ela destaca, por exemplo, a necessidade de ampliar as alíquotas do Imposto de Renda que incidem sobre quem ganha mais. “Hoje quem ganha R$ 5 mil e quem ganha R$ 5 milhões paga a mesma alíquota de 27,5%. Isso não tem justiça tributária”. Como comparação, ele cita que, entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), as alíquotas que incidem sobre as rendas mais altas são, em média, de 42%. “Tem vários países que cobram entre 40% e 50%. E alguns, mais que 50%.”

Nesse sentido, o professor classifica como “justa” a promessa de Lula de ampliar a isenção do IR para todos aqueles que recebem até R$ 5 mil por mês. “Como os governos passados não corrigiram a tabela do IR de acordo com a inflação, cada vez mais foram sendo incluídas as pessoas com rendas mais baixas. É uma injustiça fiscal enorme.” Neste ano, foram obrigados a declarar aqueles que receberam rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70, o equivalente a pouco mais de um salário mínimo e meio por mês.

Além disso, Fagnani denuncia que o Brasil é um dos poucos países que não cobram imposto sobre a distribuição de lucros e dividendos. Os super-ricos são os principais beneficiados. “Então, não faz sentido um médico ou uma enfermeira que ganham R$ 5 mil terem que pagar 27,5% na fonte, enquanto um grande acionista da Petrobras que ganha R$ 500 milhões em lucros e dividendos, por exemplo, não paga um tostão”.

Justa e solidária

Em função de todas essas distorções, Fagnani apoia a aprovação da proposta apresentada em 2019 por partidos como PT, PCdoB, PDT, Psol e Rede. Conhecida como reforma tributária “justa e solidária”, o projeto em tramitação no Congresso Nacional propõe a redução dos tributos sobre o consumo, e amplia a arrecadação sobre o “topo da pirâmide”. De acordo com o economista, seriam afetados com essa proposta cerca de 600 mil pessoas que ganham mais de R$ 300 mil por mês, um percentual ínfimo da população.

“A última edição da revista Forbes mostra que o Brasil tem 290 bilionários que têm uma fortuna equivalente a uma parte considerável do PIB brasileiro. Qual o problema disso? É que esse pessoal não paga imposto”, afirmou Fagnani.

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