Em chamas

Guedes vai insistir em privatizar e ‘furar o piso’, diz economista

Com teto a ponto de desmoronar, Guedes deve tentar ao menos manter a “loja de conveniências” funcionando para vender patrimônio público a “preço de banana”

Divulgação/Marcello Casal Jr/ABr
Divulgação/Marcello Casal Jr/ABr
Com pouca gasolina, Guedes ainda vai tentar incendiar o estado brasileiro

São Paulo – Após a “debandada” no ministério da Economia, o presidente Jair Bolsonaro e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, correram nesta quarta-feira (13) para reafirmar o apoio à manutenção do teto de gastos. É um sinal de que a agenda liberal do ministro Paulo Guedes está fazendo água.

Mas apesar da perda substancial dos seus ditos superpoderes, o economista Guilherme Mello, professor da Universidade Estadual de Campinas, acredita que ainda não é possível enterrar o programa ultraliberal de Paulo Guedes.

Ao contrário, ele diz que Guedes deve aprofundar os ataques ao Estado brasileiro. É como se, após perder os principais operadores do “Posto Ipiranga”, o ministro tentasse, a todo custo, manter ao menos a “loja de conveniências” funcionando.

Em função das pressões para gastar mais, Guedes deve “chantagear” para conseguir viabilizar ao menos uma parte dos seus planos. Em troca de uma provável flexibilização do teto, apesar das declarações em contrário, deve vai barganhar com os outros setores do governo a venda de empresas públicas.

Ou, ainda, em vez de furar o teto, deve tentar “furar o piso” dos gastos públicos, insistindo também na aprovação de medidas fiscalistas como a chamada “reforma” administrativa e a PEC Emergencial, que criam gatilhos para reduzir os salários do funcionalismo público.

A debandada

Na última terça-feira (11), o secretário de Desestatização, Desinvestimentos e Mercado, Salim Mattar; o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Paulo Uebel, além do diretor do Programa de Desburocratização, José Ziebarth, pediram demissão. O próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, classificou a saída desses auxiliares como uma “debandada”.

Em julho, Mansueto Almeida, que ocupava a Secretaria do Tesouro; o então presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, e o diretor de Programas da Secretaria Especial de Fazenda, Caio Megale, também deixaram o governo.

Ainda em setembro de 2019, Marcos Cintra foi retirado do comando da Receita Federal. Antes, em junho do ano passado, foi a vez de Joaquim Levy, então presidente do BNDES, pedir demissão.

Segundo o jornal O Globo, o secretário de Fazenda, Waldery Rodrigues, está na mira de integrantes do governo e pode deixar o cargo. Assim como o secretário de Produtividade, Emprego e Competitividade, Carlos da Costa, que também estaria desgastado após declarações recentes antecipando a prorrogação do auxílio. Sua secretaria assumiu as funções do extinto Ministério da Indústria e Comércio Exterior.

Choque de interesses

Para Mello, a saída dos principais auxiliares de Paulo Guedes indica uma disputa entre diferentes grupos do governo Bolsonaro. A vertente liberal do ministro se choca com os interesses dos militares e partidos do centrão, que querem a ampliação dos gastos. Há ainda os interesses eleitorais do próprio presidente. “Bolsonaro sabe que sem a continuidade do auxílio emergencial está morto politicamente”, afirmou o economista.

Mas ele diz que todos esses interesses não são necessariamente irreconciliáveis. O que o ministro vai tentar fazer, segundo Mello, é “negociar o mais caro possível” a derrubada do teto de gastos. Em troca, vai buscar avançar na venda do patrimônio público, o que cumpriria dupla função: fazer caixa para o governo no curto prazo, e agraciar seus parceiros do mercado financeiro com a entrega de ativos “a preço de banana”.

Porta giratória

A “debandada” aponta ainda para outro risco, segundo o economista. O ex-secretários, que devem voltar a ocupar funções importantes em instituições como bancos de investimento, por exemplo, podem continuar auxiliando Guedes a dar continuidade no seu plano de privatizações. Só que, agora, operando “do outro lado do balcão”.

Mansueto, por exemplo, após cumprir quarentena de seis meses, vai assumir como economista-chefe e sócio do banco BTG Pactual. É o mesmo banco pelo qual também passou Guedes, antes de virar ministro. Mattar pode operar nos bastidores em prol das privatizações.

“Não sabia que o Mansueto, além de ser especialista em contas públicas, também entendia de negócios privados. É um fenômeno”, provoca Mello. Para evitar esse tipo de “tráfico de influência”, ele diz que os secretários do ministério da Economia deviam ser escolhidos entre os servidores de carreira da pasta. “O caso de Mattar é mais absurdo ainda. Ele tentou operar o programa de desestatização e, agora, deve levar todas as informações estratégicas.”

Edição: Glauco Faria