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Nos cinco anos do crime da Vale em Brumadinho, atingidos gritam por justiça e em memória das 272 vítimas

Movimento dos Atingidos por Barragem promove ato e celebração ecumênica, nesta quinta, em Brumadinho. Em São Paulo, intervenção denuncia que “não houve acidente”. Apesar de ser uma das maiores tragédias socioambientais do país, ninguém foi condenado

Mídia Ninja
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"Enquanto a justiça não acontece, se perpetua a dor, o crime e os problemas de saúde mental", denuncia o MAB

São Paulo – O rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, que matou 272 pessoas, completa cinco anos nesta quinta-feira (25) com, ainda hoje, três corpos desaparecidos. Na ocasião, centenas de funcionários da mineradora trabalhavam na Mina Córrego do Feijão, no município mineiro, sem saber que a cerca de um quilômetro de distância, uma montanha de 86 metros com 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos, o equivalente a 400 mil caminhões-pipa, estava em situação de risco.

O problema, que poderia ter sido evitado pela Vale, se concretizou às 12h28 do dia 25 de janeiro de 2019, quando a barragem se rompeu num tsunami de lama. A lama espessa alcançou 300 quilômetros, levando tudo no caminho: refeitórios, casas e plantações. E contaminando mais de 300 quilômetros do rio Paraopeba e soterrando áreas de Mata Atlântica e vidas. Desde então, os habitantes da região sofrem com problemas relacionados à contaminação do solo, do ar e da água da Bacia do Rio Paraopeba. Ao mesmo tempo, um dos maiores crimes socioambientais do país segue impune.

As investigações sobre o caso em Brumadinho revelaram que o risco, desconhecido pelos trabalhadores, tinha ciência do alto escalão da Vale, a responsável pela mina, e da TÜV SÜD, subsidiária alemã que certificou a segurança da estrutura. O que levou as duas empresas e seus 16 diretores a serem denunciados pelo Ministério Público em janeiro do ano passado. No entanto, ainda hoje nenhum dos nomes foi condenado criminalmente.

Sem justiça, dor é perpetuada

Diante desse quadro de impunidade, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) realiza a “Jornada de Luta É tempo de avançar – Justiça e Reparação só com Participação Popular”. De acordo com a entidade, a Vale nega aos atingidos a participação nos debates sobre as ações de reparação. E há o temor de que as empresas e seus executivos não sejam responsabilizados pelo crime. Em dezembro, por exemplo, o Tribunal Regional Federal da 6° Região (TRF-6) começou a julgar o pedido de habeas corpus de Fábio Schvartsman, presidente da Vale à época do rompimento.

A ação, que pede a retirada do processo que o indicia, juntamente com outras dez pessoas, por homicídio de 272, já obteve um voto favorável. Apenas após pressão popular e manifestações diversas dos familiares, o julgamento foi suspenso. Mas a previsão é que ele seja retomado no próximo mês. “Enquanto a justiça não acontece, se perpetuam a dor, o crime e os problemas de saúde mental. O medo atravessa a vida de milhares de famílias mineiras porque, a qualquer momento, outra barragem pode se romper por causa da impunidade dos crimes que já aconteceram”, contesta a integrante da coordenação do MAB Fernanda Portes.

Como parte da jornada, o movimento se reuniu nesta quarta com representantes do governo federal e de instituições de justiça, como o MP, para debater o uso da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) e o processo de regulamentação da lei. A PNAB foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no final do ano, após anos de atuação do movimento.

Atos em Minas e São Paulo

O projeto reconhece formalmente quem são os atingidos por barragens no Brasil. E estabelece direitos para essas populações, como indenizações e compensações individuais e coletivas. Também garante a participação social nas negociações com o poder público e empreendedores privados, nos casos de desastres e também de construção, operação e desativação de barragens. A jornada segue até quinta, nos 5 anos do crime da Vale, com um ato “em memória das 272 joias”, às 10h, no Letreiro de Brumadinho. A manifestação será seguida por uma celebração ecumênica no Córrego do Feijão, às 11h.

Em paralelo no mesmo horário, movimentos sociais e coletivos culturais realizam uma intervenção na Avenida Paulista, região central da cidade de São Paulo. O ato dará um “grito por justiça” em símbolo também da resistência contra as injustiças ambientais e humanitárias. Com fitas vermelhas, os manifestantes representarão as 272 vidas perdidas na tragédia.

“Vamos tecer um cortejo de memória e resistência pela avenida, conectando-nos com cada vida perdida e clamando por justiça. Às 12h28, no exato momento do rompimento da barragem, faremos soar uma sirene, mas não de fuga, mas como um alerta de que estamos vivos e exigindo justiça. (Com) ‘A Vida Não Tem Preço’ e ‘Não foi acidente’, lembramos que nenhuma indenização pode trazer de volta uma vida, e clamamos por uma mudança real na maneira como lidamos com o meio ambiente e com a vida humana. Vamos nos unir em memória das vítimas e em solidariedade com todos os afetados. É hora de transformar a impotência em ação e a tristeza em força para lutar”, destacou a organização.