conspiração

Mal tomou posse, Temer narra a ministros cometimento de crime de responsabilidade

Presidente disse que a manutenção dos direitos políticos de Dilma deveria ter sido 'combinada antes'. Ameaça velada pode ser interpretada como atentado ao livre exercício do Legislativo

Beto Barata/PR

Temer pode não virar ano na presidência, condição necessária para ‘o mercado’ eleger Meirelles presidente

Na primeira reunião ministerial após a consumação do golpe parlamentar que o levou a ser empossado presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP) narrou uma conduta que pode ser enquadrada como crime de responsabilidade punido com o afastamento da presidência. Além de confirmar a conspiração com parlamentares para derrubar Dilma mediante oferta de vantagens, através de cargos, aos jurados do impeachment.

Ao falar sobre o que não toleraria de seus ministros e dos parlamentares que os indicaram, citou o episódio da segunda votação final no processo de impeachment, decisão que absolveu a presidenta Dilma Rousseff da pena de ficar inelegível. Disse Temer a seus ministros:

“Hoje nós tivemos um pequeno embaraço na base governamental em face de uma divisão que lá se deu. É outra divisão também inadmissível. Se é governo tem que ser governo. Quando não concorda com uma posição do governo, vem pra cá e conversa conosco pra nós termos uma ação conjunta. O que não dá é para aliados nossos se manifestarem lá no plenário sem ter uma combinação conosco. Porque convenhamos, se tivesse uma combinação conosco talvez nós pudéssemos dizer: ‘Olha aqui, nós vamos fazer um gesto de boa vontade, vamos abrir mão disso, vamos permitir que Sua Excelência tenha condições de não ser inabilitada’. Mas seria um gesto nosso, não pode ser uma espécie de derrota do governo”.

O problema é que o atual ocupante da presidência sem voto popular não estava se referindo a nenhum projeto do Executivo encaminhado ao Legislativo. Referiu-se a um julgamento de exclusiva competência do Legislativo, onde cada senador deveria fazer o papel de jurado e deveria julgar com seu voto de acordo com sua livre consciência e convencimento, não cabendo nenhuma “combinação com o governo para ação conjunta”, principalmente quando o objeto do julgamento era justamente quem ficaria no governo.

A fala de Temer caracteriza crime de responsabilidade, conforme a Lei 1.079/1950, em pelo menos três itens (grifos meus):

(…)

Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:

(…)

II – O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados;

(…)

Art. 6º São crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos poderes legislativo e judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados:

(…)

2 – usar de violência ou ameaça contra algum representante da Nação para afastá-lo da Câmara a que pertença ou para coagi-lo no modo de exercer o seu mandato, bem como conseguir ou tentar conseguir o mesmo objetivo mediante suborno ou outras formas de corrupção;

(…)

6 – usar de violência ou ameaça, para constranger juiz, ou jurado, a proferir ou deixar de proferir despacho, sentença ou voto, ou a fazer ou deixar de fazer ato do seu ofício;

A continuar assim, poderá ficar difícil para Temer conseguir virar o ano na presidência. E caso não consiga, fica aberta a possibilidade de “o mercado” eleger Henrique Meirelles presidente da República pelo voto indireto do Congresso.

Assista à primeira reunião ministerial de Temer oficialmente presidente. Ele fala da “combinação” necessária entre parlamentares e governo federal a partir de 16m47s