"Sanha destrutiva"

Em votação do ‘pacote verde’, Cármen Lúcia aponta a gravidade da devastação ambiental sob Bolsonaro

Entre 2004 e 2012, devastação na Amazônia caiu 83%. Com Bolsonaro, em apenas três anos, aumento na destruição da floresta foi de 75%

op Verde Brasil/ebc
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Cármen Lúcia fez uma extensa fundamentação teórica com argumentos que apontam para a sanha destrutiva do bolsonarismo diante do tema

São Paulo – O Supremo Tribunal Federal prosseguiu hoje (31) com a apreciação de um total de sete ações relacionadas ao combate às mudanças climáticas e à proteção ao meio ambiente. A votação do chamado “pacote verde” no STF foi motivada pelo Ato Pela Terra, manifestação convocada por Caetano Veloso em 9 de março que reuniu artistas, ativistas, lideranças indígenas e milhares de pessoas em Brasília contra o “pacote da destruição”. Por sua vez, este é um conjunto de projetos de lei com graves ameaças ao meio ambiente que tramita no Congresso Nacional.

Durante a sessão de hoje, a ministra Cármen Lúcia fez uma extensa fundamentação teórica com argumentos que apontam para a sanha destrutiva do bolsonarismo diante dos biomas, dos povos originários e da ameaça representada pelo aquecimento global. A ministra não chegou a proferir seu voto, mas já deixou claro imputar ao presidente Jair Bolsonaro responsabilidade pelo atual cenário de devastação ambiental.

“Tivemos um aumento muito grande de desmatamento até 2002, 2003. A partir de 2004 temos a diminuição do desmatamento na Amazônia Legal. Depois de 2016, há um aumento, acentuando-se nos últimos três anos (…) Referente ao desmatamento da Amazônia, avaliou-se que a taxa de desmatamento em 2019 foi de 10.129 km² (quilômetros quadrados), correspondente a 34 vezes a mais do que em 2018. Em 2020 passou a 10.851 km². Em 2021, atingiu 13.235 km², indicando aumento de quase 22% em relação a 2020 e mais de 75% em comparação a 2018″, argumentou a ministra.

Teatro ambiental

Cármen Lúcia chamou a proteção ao meio ambiente sob o governo Bolsonaro, dever constitucional do poder Executivo, de “teatro ambiental”. Contudo, a ministra lembrou de avanços conquistados durante governos petistas (2003-2016). “A partir de 2004 estabeleceram-se ações interministeriais para diminuir o desmate, áreas indígenas foram reconhecidas (…) Em 2007 os municípios com alto índice de desmatamento tiveram restrição de crédito, o setor privado passou a controlar e certificar suas cadeias produtivas, estabeleceu-se a moratória da soja, em 2008, para garantir que a soja estivesse livre de qualquer desmatamento ilegal. Houve uma redução em 83% no desmatamento de 2004 a até 2012”.

Sem resultados definitivos, as votações da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 760 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 54 serão continuadas na quarta-feira (6), quando devem votar a própria Cármen Lúcia e os demais ministros.

A principal ação pautada pelo STF, a ADPF 706 pede a retomada do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia (PPCDAm), que teve início em 2004, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. A ação foi protocolada por PSB, REDE, PDT, PT, Psol, PCdoB e Partido Verde, em articulação com outras dez entidades.

Já a ADO 54 foi proposta pela Rede Sustentabilidade, a ação imputa ao presidente Bolsonaro a omissão, em suas declarações públicas sobre a conservação do meio ambiente e o desmatamento da Amazônia. Carmen Lúcia, que classificou a condução da política ambiental atual como “desgoverno”, lembrou que a Constituição Federal de 1988 apresenta como direito fundamental o meio ambiente ecologicamente preservado. Mas frisou que não é o que se vê atualmente no país. “Como se faz hoje na floresta, mantém-se visto de cima como se floresta houvesse. Mas carcomida e com grandes clarões, chegando à savanização amazônica, que é projetada, como também se tem nas instituições democráticas”.

Desgoverno ambiental

Ela explicou que o desgoverno impede a fiscalização precisa da devastação e, assim, impede a preservação ambiental. “Foram táticas utilizadas para impedir que se vizualizassem com segurança a quebra do tratamento constitucional, do cuidado democrático com as instituições e com a garantia de cumprimento da constituição; por isso falei na savanização democrática. São os cupins do autoritarismo, do populismo, de interesses pessoais, da ineficiência administrativa. Tudo isso constói um quadro de que não se tem um cumprimento de fato dos direitos assegurados”.

“Faço meu voto de que salvaguardar o direito ambiental não é voltar ao passado, mas uma garantia de futuro”, disse. Ela chamou os atuais modelos de preservação do governo como “treatro ambiental”. “A inércia, a ineficiência ou contrária aos direitos constitucionais macula de inconstitucionalidade a ação do Estado, impondo-se a intervenção do Judiciário para reestabelecer os direitos constitucionais”, completou.