O epicentro é aqui

Má gestão da pandemia tornou o Brasil ‘celeiro’ de mutações do coronavírus

Por falta de comando no combate ao contágio, país virou um “problema para o mundo”, já que, ao circular livremente, o coronavírus pode desenvolver mutações agressivas

Alan Santos/PR - CC.0 Wikimedia Commons
Alan Santos/PR - CC.0 Wikimedia Commons
Bolsonaro chegou a dizer que a Gripe Espanhola matou menos do que o uso de máscaras e chocou o país ao tentar ligar as vacinas à transmissão de HIV

São Paulo – A condução desastrada do combate à pandemia pelo governo de Jair Bolsonaro e o total descontrole do contágio fez com que o Brasil se tornasse um problema para o mundo, já que circulando com total liberdade pelo país, o coronavírus pode desenvolver-se em mutações agressivas, como a gamma. É o que aponta artigo científico publicado no periódico Viruses. O estudo é intitulado “Alta Taxa de Eventos de Mutações no Genoma do Sars-Cov-2 em Regiões Geográficas do Brasil entre Fevereiro de 2020 e Junho de 2021“.

O artigo coloca o Brasil e a África do Sul como principais polos de mutações genéticas do coronavírus no mundo. Desde o início da pandemia, Bolsonaro minimizou o vírus e não articulou medidas sanitárias. Ao contrário, tentou impedir que os estados e municípios as adotassem. Também estimulou e promoveu aglomerações, disseminou mentiras sobre a segurança e eficácia de vacinas e máscaras.

“Mutações virais são eventos probabilísticos devido à transmissão aleatória de um vírus entre pessoas infectadas. A carga viral é variável e depende de fatores como o curso de infecção e imunidade do hospedeiro. Alguns indivíduos são ‘super espalhadores’, o que significa que as variáveis comportamentais e ambientais são relevantes para a infecciosidade, aumentando o sucesso da transmissão. Com o vírus tendo todo o espaço disponível para se multiplicar e infectar pessoas, a gente tem visto que isso acaba se refletindo em um registro de uma diversidade maior. Foi o caso que o estudo encontrou particularmente do Brasil”, afirmam os cientistas responsáveis.

No epicentro

De acordo com o levantamento, foram identificadas 61 cepas virais autóctones do Brasil. A maioria delas foi transitória e não ganhou força para levar a um aumento da transmissão ou mortalidade. Entretanto, uma das principais variantes de preocupação do mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), surgiu no país, a gamma, ou P.1, identificada pela primeira vez em Manaus. “É impressionante como esses países, Brasil e África do Sul conseguiram, ao longo do tempo, permitir um acúmulo de mutações maior que a média, em um processo que leva à formação de variantes”, completam os pesquisadores.

Os dados apontam que, no Brasil, uma nova mutação foi verificada a cada 278 amostras analisadas, diante de uma a cada 1.046 na Europa. O estudo tem importância central para deixar claro que, quanto mais o vírus circula, mais ele tende a se modificar. Além de Brasil e África do Sul, a Índia também aparece como centro do problema das mutações do coronavírus. Foi lá que surgiu a variante delta, até 70% mais contagiosa. Assim como o Brasil, a Índia não adotou medidas de isolamento social consistentes.

Desigualdade

Outro estudo aponta que, além de mal executadas, as medidas de proteção aos cidadãos brasileiros durante a pandemia foram desiguais. Levantamento da Rede Nossa São Paulo escancarou mais uma vez as diferenças de tratamento na capital paulista. Os dados revelam que a mortalidade por covid-19 tem relação com a cor da pele ou a renda média das pessoas contaminadas. Além disso, mesmo a expansão do número de leitos de Unidades de Terapia Intensiva, em cerca de 600%, ficou concentrada em regiões que já tinham uma rede maior de atendimento médico.

No Itaim Bibi, de maior poder aquisitivo, 47% dos mortos pela covid-19 eram pretos ou pardos. Entre brancos, foram 28%. Já na Vila Guilherme, zona norte da cidade, 50% dos mortos pelo novo coronavírus eram pretos ou pardos e 30%, brancos. Os dados foram analisados em reportagem do repórter Rodrigo Gomes, da Rádio Brasil Atual.

Do mesmo modo, mostra a pesquisa, as famílias de maior renda foram menos vitimadas pela covid-19 do que as mais pobres, mesmo nas faixas etárias com menor risco de desenvolver complicações. A região de Alto de Pinheiros, na zona oeste da cidade, concentra quase quatro vezes mais renda que Lajeado, no extremo leste. Entretanto, a mortalidade por covid-19 em Lajeado é cinco vezes maior que no Alto de Pinheiros.

Vírus ainda livre

Boletim de hoje (14) do Conselho Nacional de Secretarias de Saúde (Conass) indica 731 mortes por covid-19 em um período 24 horas. O país chega a 587.797 vítimas oficialmente registradas do vírus. No mesmo período, também foram notificados 13.409 novos casos, totalizando 21.019.830 infectados desde o início da pandemia, em março de 2020. O Brasil é o país com mais mortes por covid-19 neste ano e o segundo desde o início do surto, atrás apenas dos Estados Unidos.

Números da covid-19 desta terça-feira (14) no Brasil. Fonte: Conass

Colaborou Rodrigo Gomes


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