Histórias do jornalismo têm defesa da democracia e também vacilos
Atacada pelo governo Bolsonaro, que ajudou a eleger, imprensa segue aos trancos e barrancos como quarto poder. De um lado, abalada pelos novos modos de censurar; de outro, com uma autocrítica por fazer
Publicado 20/10/2019 - 19h01

São Paulo – “Há uma recusa em discutir uma cortina de fumaça da censura. Não se fala mais disso. Bolsonaro garantiu, enquanto não abre a discussão em hipótese alguma. Então, veio uma coisa pior: a asfixia da imprensa pelo poder econômico.” A fala do jornalista Juca Kfouri, colunista da Folha de S.Paulo, rádio CBN, UOL e apresentador do programa Entre Vistas, da TVT, traz à tona a situação da imprensa no atual contexto político brasileiro.
O tema norteou a mesa Jornalismo e Defesa da Democracia, na noite de sexta-feira (18), no seminário “Democracia em Colapso?”. O seminário, realizado entre os dias 15 e 19, pela editora Boitempo e Sesc São Paulo, com apoio da RBA, reuniu para esse debate além de Juca, as jornalistas Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo, e Marina Amaral, da Agência Pública, com mediação de Daniela Pinheiro, para refletir, além da conjuntura política aplicada ao jornalismo, o papel da imprensa nesses tempos.
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Veja aqui o que mais rolou no seminário “Democracia em Colapso?”
“Temos de investigar cada vez mais, temos de nos aliar cada vez mais com outros jornalistas e veículos. E temos de nos proteger. O governo está indo cada vez mais para uma direção autoritária. Temos um presidente que faz apologia à tortura” (Marina Amaral)
“É o momento de ser mais jornalista do que nunca, saber não estar cobrindo um governo normal. Não é descabido pensar na censura da imprensa. Por enquanto isso é feito por meio do assédio, mas não sabemos para qual caminho isso vai”, disse Marina Amaral.
Diante dessas questões apontadas, Juca alerta que não há nada como a informação. “Pode demorar para vingar, para florescer, ela pode abalar a cabeça das pessoas que queiram ver malícia, pode deixar algumas interrogações por algum tempo, mas sempre chega um dia em que alguém vem, de onde você menos espera, e disso tudo, aquilo foi verdade, depois de tantas ameaças, de tantos processos tanta mentira, vai se confirmar”.
“A cobertura da Lava Jato não foi uma cobertura da Lava Jato. Forma onze jornalistas dentro do gabinete do Janot recebendo coisas no colo e publicando no dia seguinte sem checar. Isso é uma bola entre as pernas da imprensa brasileira” (Juca Kfouri)
Patrícia, que foi processada por seu trabalho pelo presidente de extrema-direita, Jair Bolsonaro (PSL), falou sobre a estrutura formada com o objetivo de calar a imprensa, e que não se refere apenas do governo federal. “Empresários, como o Luciano Hang (dono da rede de lojas Havan), também estão agindo assim. Ele me processou em R$ 2 milhões. Não é fácil. Esse é só um caso, tem um monte de jornalista processado. O que é assustador é o aparelhamento, também, do Judiciário”, diz.
“Na Polônia, na Hungria, por exemplo, aposentaram um monte de juízes e colocaram amigáveis. Há duas semanas, existe uma investigação sobre uso de WhattsApp para disseminar fake news. Essa investigação tinha sete testemunhas (pró-Bolsonaro) de um lado; e eu e outro repórter de outro. O juiz fez com que só testemunhas do Bolsonaro fossem ouvidos” (Patricia Campos Mello)
Com reportagem de Cláudia Motta