TÓQUIO-2020

Chegou a vez dos atletas paralímpicos brigarem por um lugar no Olimpo

Jogos de Tóquio começam na manhã de terça-feira e o Brasil chega com grandes nomes para brigar por medalhas. Confira alguns dos principais, mas não se deixe enganar: tem gente boa em todas as modalidades

(facebook/paralympics)
(facebook/paralympics)
O Agito, símbolo dos Jogos Paralímpicos, na Baía de Tóquio

São Paulo – Vai começar tudo de novo! Uma nova leva de competições acirradas no fim de tarde e começo da noite, disputas de tirar o fôlego madrugadas adentro e brigas eletrizantes ainda no café da manhã. Os Jogos Paralímpicos de Tóquio serão iniciados às 8h de terça-feira (24), pelo horário de Brasília, com a Cerimônia de Abertura. Algumas horas mais tarde, a partir das 21h, começam as competições propriamente ditas, com ciclismo de pista, hipismo, goalball, natação, tênis de mesa, além de três modalidades exclusivamente praticadas em cadeira de rodas: esgrima, basquete e rúgbi. Dali em diante, até o dia 5, milhares de atletas entram em cena para mostrar o que realmente são: atletas de alta performance.

O Brasil chega mais uma vez bem forte. Não dá, ainda, para colocar o país como uma potência paralímpica. Mas certamente dá para esperar mais medalhas do que se costuma ganhar nos Jogos Olímpicos. A delegação tem 260 atletas, incluindo guias e timoneiro, sendo 164 homens e 96 mulheres, que vão competir em 21 das 23 modalidades. Só não estará no basquete e no rúgbi, ambos em cadeira de rodas. Na história, os paralímpicos brasileiros já conquistaram 302 medalhas, sendo 87 de ouro – há a expectativa da centésima sair em Tóquio – mais 112 de prata e 103 de bronze. O atletismo é o carro chefe garantindo 142 pódios, com 40 no ponto mais alto, 61 segundos lugares e 41 terceiros.

(Ale Cabral/CPB)
Petrúcio Ferreira talvez seja o maior nome brasileiro nos Jogos Paralímpicos atualmente (Ale Cabral/CPB)

Os Jogos Paralímpicos começaram em Roma-1960 e o Brasil registrou a primeira participação em Heidelberg-1972. A primeira medalha veio quatro anos depois, em Toronto-1976. Uma prata da dupla Robson Sampaio de Almeida e Luiz Carlos da Costa no Lawn Bowls, modalidade semelhante à bocha, mas praticada na grama, que não está mais no programa. De lá para cá, a delegação brasileira subiu ao pódio em quase todas as edições – a exceção foi Arnhem-1980. Em quantidade de medalhas, a principal participação foi na Rio-2016, com 72, sendo 14 ouros, 29 pratas e 29 bronzes. A melhor posição no quadro de medalhas foi a sétima em Londres-2012, uma acima da atingida no Rio de Janeiro, com 21-14-8. O maior salto de conquistas foi entre Barcelona-1992 e Atlanta-1996, de sete para 21, aumento de 200%.

O mais rápido do mundo

As modalidades paralímpicas são divididas em classes, a chamada classificação funcional. Ela busca reunir em uma prova atletas com potenciais semelhantes, já que eles variam de acordo com o tipo e a extensão da deficiência. Isso faz com que em determinadas modalidades haja diversos campeões de uma mesma prova. Na Rio-2016, por exemplo, foram 30 pódios diferentes dos 100 m no atletismo, sendo 16 no masculino e 14 no feminino. Em outros casos, apenas uma deficiência é elegível, como o judô. Nele só competem atletas da classe B, usada para deficientes visuais, nas subdivisões de 1 a 3, sendo o número menor para a maior extensão da deficiência. Na B1 estão cegos totais ou com percepção de luz sem reconhecer formatos. Na B2 estão atletas com percepção de vultos e na B3 os que conseguem definir imagens. Muitas vezes todos competem juntos ou algumas classes são agregadas, às vezes com algumas adaptações. Via de regra, essa lógica vale para todas as modalidades, com a sigla sempre tendo uma ou mais letras e um ou mais números.

(Daniel Zappe/Exemplus/CPB)
Beth Gomes vem pra brigar pelo ouro (Daniel Zappe/Exemplus/CPB)

Dito isso, podemos apresentar alguns dos grandes nomes brasileiros que estarão nos Jogos Paralímpicos de Tóquio. Um deles, talvez o maior, é o velocista Petrúcio Ferreira, da classe T47 (‘T’ é a sigla para atleta de pista no atletismo, vem da palavra inglesa ‘track’, e o 47 é uma das numerações para amputados. Vai de 41 até 47). Petrúcio é o atleta paralímpico mais rápido do planeta com 10s42 nos 100 m, prova em que ele é campeão olímpico e bicampeão mundial. É, ainda, campeão mundial e vice campeão olímpico nos 400 m. Essas são as duas provas de velocidade do atletismo, já que não há os 200 m no programa dos Jogos Paralímpicos. No campo, Elizabeth Gomes, ou só Beth Gomes, é o grande destaque. Ela é atual campeã mundial no lançamento de disco classe F52 com direito a recorde mundial, 16m89. Ambos são os mais proeminentes, mas a delegação tem ainda os campeões mundiais Claudiney Batista, Rayane Soares, Júlio César Agripino, Thiago Paulino, Daniel Tavares, Thalita Simplício, Jerusa dos Santos, Lucas Prado, Alessandro Rodrigo, João Victor Teixeira e Cícero Valdiran. Sem contar as promessas. Não daria para listar tudo aqui, então fique de olho no atletismo!

Natação, judô e coletivos

A natação e o judô devem ajudar a preencher o quadro de medalhas brasileiro. Nas piscinas, a lenda Daniel Dias, dono de 24 medalhas paralímpicas, sendo 14 de ouro, é um dos maiores nomes, bem como Maria Carolina Santiago. A principal prova dele é a dos 50 m na S5, na qual é o atual campeão mundial. Ela tem duas em que se destaca e que também é atualmente a campeã mundial, os 50 m e os 100 m na classe S12. Além dos dois, destaque para Wendell Belarmino, Phelipe Rodrigues, Joana Silva, Edênia Garcia e Cecília Araújo. Já nos tatames, outra lenda promete brigar por mais uma medalha. Aos 50 anos e após sobreviver a um quadro gravíssimo de covid-19, o tetracampeão olímpico (Atlanta-1996, Sydney-2000, Atenas-2004 e Pequim-2008) Antônio Tenório (100kg), da B1, chega em Tóquio para tentar a sétima medalha. Tem uma prata na Rio-2016 e um bronze em Londres-2012. No feminino, destaque para a campeã mundial, medalhista de prata na Rio-2016 e atual líder do ranking, Alana Maldonado (70kg), além de Karla Cardoso (52kg) e Lúcia Araújo (57kg), que têm duas pratas paralímpicas cada, e Meg Emmerich (+70kg), bronze no Mundial.

Nos coletivos, temos a imbatível seleção de Futebol de 5, modalidade para atletas com deficiência visual. E é imbatível mesmo, porque o Brasil nunca perdeu um único jogo desde que a modalidade estreou nos Jogos Paralímpicos em Atenas-2004. Sendo assim, é a atual tetracampeã, além de pentacampeã mundial e tem no elenco Ricardo Alves, o Ricardinho, ninguém menos do que o maior jogador em todos os tempos. Na final da Rio-2016, contra o Irã, ele fez uma jogada mágica pelo lado esquerdo do campo e meteu no meio das canetas do goleiro Meysam Shojaeiyan, que ainda não tinha sido vazado na competição, para fazer o gol do título. No goalball, modalidade que se assemelha ao futebol, também temos equipes fortes no masculino, especialmente, e no feminino. O vôlei sentado é outra onde o Brasil pode conquistar medalha nos dois naipes.

Tem mais gente

Como dito acima, o Brasil é bastante competitivo em Jogos Paralímpicos e como há uma entendimento geral de que os países precisam de quatro chances de medalha para ganhar uma, há uma série de outros atletas brasileiro brigando pelo pódio. Jane Karla, no tiro com arco, por exemplo, é uma delas. No badminton, modalidade que estreia nos Jogos Paralímpicos de Tóquio, Vitor Tavares chega como um dos mais bem cotados. Lauro Chaman, no ciclismo, é outro, bem como Débora Menezes e Nathan Torquato, do taekwondo, outra modalidade que estreia na capital japonesa.

No halterofilismo Evânio da Silva, Mariana D’Andrea e Bruno Carra chegam com boas credenciais. Na canoagem tem destaques também: Luis Carlos Cardoso, Caio Ribeiro e Fernando Rufino. No remo, temos Renê Campos e, no triatlo, apesar de um grave acidente há poucas semanas, Jéssica Messali tem tudo para brilhar. Para se ter uma ideia, em 2019 ela se tornou a primeira mulher cadeirante da América Latina a concluir o Iron Man 70.3. Fechou o percurso de 1,9 quilômetro de natação, 90 quilômetros de ciclismo, e 21 quilômetros de corrida em menos de seis horas, ou 5h57min. Jovane Guissone, campeão paralímpico na esgrima em cadeira de rodas em Londres-2012, é outra boa aposta.

Esses são alguns dos grandes nomes, possíveis de serem destacados entre os 260 brasileiros, porque trazem conquistas importantes em outras edições de Jogos Paralímpicos ou dentro do último ciclo, extraordinariamente de cinco anos. Porém, para não cometer injustiças, é necessário dizer que há muitos outros nomes preparados para se apresentarem ao mundo dentro do palco paralímpico. Certamente veremos surpresas agradáveis aparecerem, como certamente veremos surpresas desagradáveis também acontecerem. Essa é a graça do esporte, não ser previsível. É disputado por humanos e suas falhas e virtudes. Neste caso, por seres humanos espetaculares que não aceitaram o execrável rórulo de “incapaz” para mostrar que são, antes de qualquer coisa, competidores natos com feitos fantásticos dignos de espaços no Olimpo do esporte mundial. Ou, em resumo, simplesmente atletas de alta performance. Nada mais, nada menos.

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