Bolsonarismo em SP

Educadores reagem e MP vai apurar troca de livros didáticos por material digital no governo Tarcísio

Segundo o MP, além dos prejuízos ao processo de aprendizagem dos alunos, decisão de Tarcísio ainda infringe princípios constitucionais de gestão democrática da educação pública

Marcelo Casal Jr/ABR
Marcelo Casal Jr/ABR
Em vez de livros didáticos impressos, Tarcísio quer apenas computadores

São Paulo – Após reação de educadores à troca de livros didáticos por material digital, anunciada pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), o Ministério Público estadual instaurou inquérito para apurar o caso. Para o Grupo de Atuação Especial de Educação do MP, há uma “mudança abrupta do material didático com potencial prejuízo à continuidade do processo educacional. E também um risco para a garantia de acesso ao material didático”.

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Para a promotora Fernanda Peixoto Cassiano, a medida foi adotada sem consulta prévia à comunidade escolar, o que infringe os princípios constitucionais de gestão democrática do ensino público. O grupo do MP está preocupado também com um “eventual desperdício dos recursos públicos” e destacou que a adesão ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) não traz impactos no orçamento paulista.

Nesta quarta-feira (2), o deputado estadual Carlos Giannazi (Psol), que é professor, enviou ofício ao procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Sarrubbo. No documento, argumenta que a decisão do governo Tarcísio de Freitas é “absurda”, “vai na contramão de vários estudos” e “amplia o uso de tela na infância e adolescência (causador de muitos transtornos de ansiedade) e outros tantos pelo uso excessivo da tecnologia”.

Precariedade dos equipamentos

Na representação, o parlamentar destaca ainda a falta de estrutura da rede de educação pública. “Há precariedade dos equipamentos e incapacidade de acesso à rede de dados – os chips fornecidos pelo estado são objeto de frequentes reclamações dos professores sobre sua baixa qualidade”.

O anúncio da Secretaria Estadual de Educação causou indignação. A pasta tem à frente o secretário Renato Feder, empresário do setor de informática que fornece produtos educacionais para diversos governos, o que supõe um conflito de interesses. E a própria questão pedagógica.

O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, chamou de “ideias bolsonaristas e negacionistas” o abandono “absurdo” do livro didático. “Em um país desigual como o nosso é um absurdo tomarmos conhecimento de propostas como esta”.

O dirigente lembrou um levantamento do Tribunal de Contas de São Paulo (TCE-SP), divulgado em novembro passado, que constatou problemas socioemocionais e a falta de acesso a tablets, de professores e outras dificuldades em escolas do município de São Paulo.

Exclusão de livros didáticos impressos limita aprendizagem

“Foi constatado que 98% dessas escolas têm problemas socioemocionais, em 20% dessas escolas faltam professores, tanto titulares quanto substitutos, 35% não têm nenhum equipamento digital e 65% possuem equipamentos que não funcionam ou funcionam parcialmente. Pelo menos 83% dos alunos não tinham tablet na sala de aula”, disse.

Ainda segundo o dirigente da CNTE, a rede na capital mais rica do país reflete a desigualdade educacional. “É uma desigualdade bruta e o governo de São Paulo está fora da própria realidade. É um absurdo essa decisão e é preciso que toda a sociedade brasileira combata esse tipo de proposta”.

A senadora e coordenadora Nacional de Educação do PT, Teresa Leitão, contesta a exclusão dos livros físicos e afirma que a atitude do governador de São Paulo significa uma posição ideologizada em relação à Política Nacional do Livro Didático, além de uma subtração ao direito dos estudantes.

“A educação deve se utilizar de recursos digitais sempre que esta ferramenta se constituir em ampliação dos horizontes dos estudantes. Excluir os livros em seu formato físico é muito limitante para a educação e retira uma experiência insubstituível para crianças e jovens”.

“Posição ideologizada contra PNLD”

A senadora e coordenadora Nacional de Educação do PT, Teresa Leitão, contesta a exclusão dos livros físicos e afirma que a atitude do governador paulista “significa uma posição ideologizada em relação à Política Nacional do Livro Didático”. E também a subtração ao direito dos estudantes.

“A educação deve se utilizar de recursos digitais sempre que esta ferramenta se constituir em ampliação dos horizontes dos estudantes. Excluir os livros em seu formato físico é muito limitante para a educação e retira uma experiência insubstituível para crianças e jovens”.

A deputada estadual Professora Bebel (PT) também criticou a proposta do governo Tarcísio. “A alegação de ‘coerência pedagógica’ é, a nosso ver, a imposição do pensamento único a professores e estudantes da rede estadual de ensino, contrariando, mais uma vez, a liberdade de cátedra e o princípio da liberdade de ensinar e aprender garantido pela Constituição Federal”, disse, por meio de uma rede social.

Governo bolsonarista e a aversão pelos livros

Bebel concorda com a senadora Teresa Leitão. “O governo bolsonarista de São Paulo coloca razões ideológicas acima do interesse público e dos direitos educacionais de crianças e jovens” e “mostra-se impregnado da mesma aversão pelos livros do governo bolsonarista derrotado nas eleições de 2022”.

“Obviamente, como parlamentar e também segunda presidenta da Apeoesp, não ficarei inerte diante desse absurdo e farei os devidos questionamentos, por todas as vias possíveis, pois a Educação pública no estado de São Paulo não pode ser prejudicada por uma decisão irresponsável.”

Redação: Cida de Oliveira – Edição: Helder Lima