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Súmula 73 do TSE: combate às fraudes de gênero nas eleições de 2024 e impactos para os partidos

Regra aprovada no dia 16 de maio orienta partidos e a própria justiça eleitoral pelo país na prevenção e punição de fraudes relacionadas às cotas de gênero

Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Mulheres com presença na política são importantes para que toda a sociedade tenha representatividade no Legislativo

Por Michel Lenz – Em uma medida para combater as fraudes na igualdade de gênero nas eleições brasileiras, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou a Súmula 73 na sessão administrativa da quinta-feira (16). A decisão visa orientar partidos políticos, federações, candidatos e a própria Justiça Eleitoral na prevenção e punição de fraudes relacionadas à cota de gênero nas Eleições Municipais de 2024.

Contexto Político

A política eleitoral brasileira tem historicamente enfrentado problemas, principalmente referentes à representatividade feminina no pleito eleitoral. A exigência de uma cota mínima de 30% de candidaturas femininas, instituída pela Lei 9.504/1997, foi um marco importante.

No entanto, a prática tem mostrado que a simples existência da cota não garante a efetiva participação das mulheres. Fraudes, como candidaturas fictícias e a falta de apoio financeiro e estrutural para candidatas, infelizmente são comuns, especialmente em eleições municipais.

Neste ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) comprovou que partidos em 14 municípios de seis estados brasileiros cometeram fraudes à cota de gênero nas eleições de 2020. Segundo o TSE, onze partidos políticos lançaram candidaturas femininas fraudulentas na disputa para o cargo de vereador, caracterizando crimes eleitorais. O Colegiado confirmou as fraudes e determinou a anulação dos votos recebidos pelos partidos. Além disso, a Justiça Eleitoral também cassou os registros e diplomas de todos os candidatos a vereador eleitos a partir da fraude nas cotas femininas.

Definição da Súmula 73

A Súmula 73 estabelece critérios claros para a caracterização da fraude à cota de gênero, que exige um mínimo de 30% de candidaturas de sexos distintos, conforme a Lei 9.504/1997. A fraude se configura quando há evidências de:

  1. Votação zerada ou inexpressiva: Quando candidatos(as) não recebem votos ou recebem um número insignificante de votos.
  2. Prestação de contas zerada ou padronizada: Ausência de movimentação financeira relevante ou prestação de contas idêntica entre diferentes candidatas.
  3. Falta de atos efetivos de campanha: Ausência de atividades de campanha, divulgação ou promoção efetiva da candidatura.

Esses critérios visam eliminar as candidaturas fictícias, conhecidas como “laranjas”, e assegurar que as candidatas tenham uma participação real e efetiva no processo eleitoral.

Consequências da fraude

A aprovação da Súmula 73 pelo TSE implica consequências severas para os partidos e candidatos envolvidos em fraudes à cota de gênero. As penalidades incluem:

  1. Cassação do DRAP: Cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) da legenda, resultando na invalidação das candidaturas a ele vinculadas.
  2. Inelegibilidade: Declaração de inelegibilidade dos indivíduos que participaram ou anuíram com a fraude, conforme as hipóteses de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE).
  3. Nulidade dos votos: Anulação dos votos obtidos pelo partido fraudador, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário, conforme o artigo 222 do Código Eleitoral e possível aplicação do artigo 224 que estabelece critérios para a realização de novas eleições.

Desafios e impactos para os partidos

A aprovação da Súmula 73, juntamente com a recente resolução do TSE sobre ilícitos eleitorais, envia um sinal claro aos partidos políticos: as fraudes à cota de gênero não serão mais toleradas.

Este novo cenário tem implicações significativas para os partidos políticos, especialmente no nível municipal. Os critérios estabelecidos visam assegurar que as candidaturas femininas sejam reais e não meramente formais. Isso significa que os partidos precisam rever suas práticas e garantir que todas as candidatas tenham condições efetivas de participação. Os partidos precisam estar atentos a:

  • Autenticidade das Candidaturas: Os partidos devem garantir que as candidaturas femininas sejam genuínas. A votação zerada ou inexpressiva, a prestação de contas zerada ou padronizada e a ausência de atos efetivos de campanha serão considerados sinais de fraude. Isso exige um comprometimento real com a inclusão e apoio das mulheres nas campanhas.
  • Transparência Financeira: A prestação de contas das candidatas deve ser detalhada e transparente. Movimentações financeiras relevantes são essenciais para demonstrar a seriedade das campanhas. Os partidos precisam evitar práticas de prestação de contas padronizadas entre diferentes candidatas, que agora serão vistas como indicativos de fraude.
  • Campanhas Ativas e Visíveis: As candidatas devem realizar campanhas ativas e visíveis. A ausência de promoção efetiva da candidatura será um critério para identificar fraudes. Os partidos devem assegurar que suas candidatas tenham os recursos e o suporte necessários para uma campanha competitiva.
  • Capacitação e Envolvimento: Os partidos precisam investir na capacitação das candidatas e promover seu envolvimento contínuo na vida partidária. Oferecer programas de formação política contínuos que cubram desde habilidades de campanha até estratégias de comunicação e liderança. Incentivar a participação ativa das mulheres em todas as esferas do partido, incluindo a participação em reuniões estratégicas, comissões e cargos de liderança.

Conclusão

A Súmula 73 do TSE é um lembrete de que a Justiça Eleitoral não tolerará mais fraudes na cota de gênero. Para os partidos políticos, especialmente os diretórios municipais, é essencial adotar medidas rigorosas para assegurar a transparência e a integridade das candidaturas femininas.

Cumprir as normas eleitorais não só evita sanções e complicações legais, mas também promove um ambiente político mais justo e inclusivo. Com um compromisso renovado com a igualdade e a inclusão, os partidos podem transformar essa obrigação legal em uma oportunidade para fortalecer a democracia brasileira.

Olhar para o futuro requer uma abordagem proativa e estratégica por parte dos partidos políticos, para promover campanhas que cumpram as diretrizes legais e ofereçam candidatas qualificadas e participativas. Por fim, os partidos podem transformar este desafio em uma oportunidade, destacando-se na construção do processo eleitoral em suas comunidades.


​​Michel Lenz: Apaixonado por estratégia, inovação, ideias e projetos, pelos tatames e a filosofia do jiu-jitsu, sua vida é a família (Papai de Alice). Estrategista de Marketing e Comunicação, Sócio Proprietário/CEO da IntMark – Inteligência de Marketing, Cofundador da Alcateia Política, Sócio/CMO da Ninjas Contabilidade, Professor de Jiu-Jitsu na Union Team. Possui MBA em Marketing Político e Comunicação Governamental, MBA em Gestão de Marketing e Comunicação, Bacharel em Sistemas de Informação. Atua com marketing político desde 2016 com campanhas eleitorais e mandato, como estrategista de campanha, estrategista de marketing e comunicação e coordenador de equipe, além de realizar diagnósticos de presença digital. LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/michel-lenz/